Governabilidade comprada

Weber vota pela inconstitucionalidade do orçamento secreto

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14 de dezembro de 2022, 20h01

As emendas de relator ao Orçamento-Geral da União, identificadas pela sigla RP9 e conhecidas como "orçamento secreto", desrespeitam os princípios da isonomia e da impessoalidade ao ocultar os parlamentares que requereram as despesas. Além disso, desrespeita a exigência de publicidade dos atos públicos.

SCO/STF
Rosa Weber disse que orçamento secreto viola princípios constitucionais
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Com esse entendimento, a presidente do Supremo Tribunal Federal e relatora do caso, Rosa Weber, votou nesta quarta-feira (14/12) para declarar a inconstitucionalidade do orçamento secreto. O julgamento será retomado na sessão desta quinta (15/12).

Rosa também votou para ordenar que, no prazo de 90 dias, órgãos públicos executaram, nos exercícios financeiros de 2020 a 2022, despesas classificadas sob o indicador orçamentário RP9, divulguem dados referentes aos serviços, obras e compras feitas com tais recursos.

A ministra propôs a seguinte tese:

As emendas do relator geral do orçamento destinam-se exclusivamente à correção de erros e omissões nos termos do artigo 166, parágrafo 3º, inciso III, alínea ‘a’, da Constituição Federal, vedada sua utilização indevida para o fim de criação de novas despesas ou de ampliação das programações previstas no projeto de lei orçamentária anual."

"Captura do Orçamento"
Em seu voto, Rosa Weber afirmou que o "orçamento secreto" instituído em 2020 restaurou o modelo de emendas do relator que possibilitou os esquemas de corrupção de PC Farias, dos "anões do orçamento" e da "máfia dos sanguessugas".

"Não havendo como o Executivo contingenciar despesas oriundas das emendas individuais ou de bancadas estaduais, as emendas de relator tornaram-se o novo locus destinado às negociações reservadas à construção de base de apoio do governo no Congresso. A garantia constitucional da execução das emendas individuais e de bancada, portanto, não significou o fim da barganha e da discriminação partidária no Brasil, como prometido em 2013 pelo presidente da Câmara. Retrata apenas o fato de que a crise na relação entre o Executivo e o Legislativo tornou ainda mais caros e dispendiosos a manutenção de uma base presidencial de apoio parlamentar no Congresso e o custo da governabilidade no presidencialismo de coalização", apontou a ministra.

A presidente do Supremo destacou que informações prestadas pelo Congresso Nacional demonstram que as emendas RP9 não eram ordenadas somente pelo relator-geral do Orçamento, e sim por diversos parlamentares, que enviavam os pedidos à secretaria de governo da gestão Jair Bolsonaro (PL)

"Por isso, trata-se de 'orçamento secreto', não se sabe quem são os parlamentares integrantes do grupo privilegiado, não se conhecem as quantias administradas individualmente, não existem critérios objetivos e claros para a realização das despesas. Tampouco observam-se regras de transparência na sua execução".

Segundo a relatora, o esquema revela a "progressiva tomada do Orçamento federal por congressistas que compões a base do governo". Devido à arbitrariedade e interesses pessoais envolvidos na destinação dos recursos, o método representa "prejuízo grave à efetividade das políticas públicas nacionais", disse Rosa.

O fato de o relator-geral do Orçamento ocultar a identidade dos requerentes das emendas desrespeita os princípios republicano, da isonomia e da impessoalidade, ressaltou a ministra. Além disso, destacou, viola a exigência de publicidade dos atos da administração pública.

Prática de governabilidade
As arguições de descumprimento de preceito fundamental foram movidas pelos partidos Cidadania, PSB, PSOL e PV.

No fim de 2021, a relatora do caso, ministra Rosa Weber, suspendeu os pagamentos das emendas de relator. Posteriormente, ela alterou sua decisão para liberar a execução das verbas, desde que observadas regras de transparência definidas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. A liminar foi referendada pelo Plenário.

O "orçamento secreto" é associado ao presidente Jair Bolsonaro (PL) por adversários como um indício de corrupção no atual governo, já que as emendas podem ser negociadas entre os deputados e senadores para viabilizar a aprovação de projetos de interesse do Executivo.

Ofício de Pacheco
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), enviou um ofício ao STF nesta quarta, poucas horas antes do julgamento, informando que há uma proposta em tramitação para aprimorar o pagamento das emendas de relator.

No entanto, Rosa Weber entendeu que a iniciativa não prejudica o julgamento, tendo em vista os pedidos dos autores e o fato de a proposta estar em tramitação, mas ainda não ter sido aprovada.

ADPFs 850, 851, 854 e 1.014

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