Opinião

Empresas que fornecem alimentos devem ser tributadas quando não fazem bufê

Autor

  • Peter Emanuel Pinto

    é advogado tributarista da sociedade Pinto & Bowens Advogados Associados pós-graduado em MBA com ênfase em Finanças Controladoria e Auditoria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) (2018) pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio pós-graduado em Direito Tributário pelo Ibet professor de Direito Tributário pelo Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (Cescage) professor de Direito Aplicado ao Agronegócio na pós-graduação pelo Cescage presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB de Ponta Grossa-PR ex-conselheiro da OAB Subseção de Ponta Grossa – PR e ex-membro do Conselho Municipal de Contribuintes de Ponta Grossa – PR.

22 de abril de 2022, 13h05

Empresas fornecedoras de alimentos e bebidas são comumente confundidas com as prestadoras de serviços de bufê e são enquadradas na incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) ao invés do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS). Tal situação provoca autuações por parte dos municípios e o aumento da carga tributária.

A Constituição de 1988 distribuiu a competência aos municípios e Distrito Federal para a instituição do ISSQN, conforme redação contida em seus artigos 147 e 156, incidente sobre os serviços e qualquer natureza, não compreendidos em seu artigo 155, II, definidos em lei complementar.

Por sua vez, a Lei Complementar 116/2003 trouxe a lista de situações que compreenderiam fatos geradores para o nascimento da obrigação tributária principal do ISSQN. Dentre as várias situações, estabeleceu em seu item 17.11, que é fato gerador do ISSQN a "organização de festas e recepções; bufê (exceto o fornecimento de alimentação e bebidas, que fica sujeito ao ICMS)".

No que se refere ao ICMS, a CRFB/1988 distribuiu sua competência aos Estados e Distrito Federal, nos termos do artigo 155, inciso II, incidente sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. Também, há a incidência do ICMS sobre o valor total da operação, quando mercadorias forem fornecidas com serviços não compreendidos na competência tributária dos municípios.

A prestação de serviço de Buffet é hipótese de incidência do ISSQN. Por outro lado, o fornecimento de alimentação e bebidas será hipótese de incidência para o ICMS. Cabe aqui então, entender a definição do serviço de Bufê e fornecimento de alimentação e bebidas, trazida pela jurisprudência pátria.

O desembargador Eduardo Sarrão, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), quando do julgamento da Apelação Cível nº 0003248-19.2015.8.16.0004, com voto de sua relatoria, julgado em 05.02.2019, explicou tecnicamente o conceito de Buffet, previsto no item 17.11 da LC 116/2003, a título de incidência do ISSQN:

"17.11 — Organização de festas e recepções; bufê (exceto o fornecimento de alimentação e bebidas, que fica sujeito ao ICMS).
O serviço que é indicado no item transcrito refere-se à organização de festas e recepções, bufê, ou seja, está relacionada à atividade desempenhada por pessoa física ou jurídica consistente na preparação de uma festa ou recepção, a qual engloba a locação do espaço físico compatível com o número de convidados, a elaboração do cardápio, a organização da recepção e acomodação dos convidados, o preparo e o fornecimento de alimentação e bebidas (bufê), entre outras — é possível, por exemplo, a contratação de show artístico ou de banda musical para entreter os convidados. Trata-se de serviço prestado para a realização de um específico evento, tal como uma festa de casamento ou de formatura ou de aniversário de 15 anos, entre outras. A respeito do serviço indicado no item 17.11 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, faz-se oportuna a transcrição de passagem da obra 'Manual do ISS', de lavra do desembargador Sergio Pinto Martins:
O Decreto-lei nº 406/68 não previa a tributação dos serviços em comentário. O item 29 da lista determinada pelo Decreto-lei n. 839/69 tratava de 'organização de festas buffet ( ) exceto o fornecimento de alimentos e bebidas, que ficam sujeitos ao ICMS'.
O item 42 da lista de serviços determinada pela Lei Complementar nº 56/87 previa a buffet tributação sobre 'organização de festas e recepções: (exceto o fornecimento de alimentação e bebidas, que fica sujeito ao ICMS)'.
Organizar quer dizer pôs ordem, disciplinar, ordenar.
Festas são acontecimentos em que há diversão, comemoração, solenidade.
Em francês, buffet é o móvel guarda-louças, mas pode ser entendido
extensivamente como a mesa arrumada com bebidas e comida a serem oferecidas às pessoas.
O buffet é o lugar em que são servidas bebidas e refeições e recepções para as pessoas, como para casamentos, festas etc.
O que se tributa neste item é apenas a organização das festas e recepções, e não a alimentação ou bebidas fornecidas, ou seja, é tributado o serviço. As mercadorias utilizadas ficam sujeitas exclusivamente ao ICMS.
As empresas que organizam as festas ou o buffet fornecem local e, quando necessário, os utensílios, como copos, talhares, pratos, mesas etc. Pode ser feita, no local, decoração ou ornamentação do salão. Nos buffets, existe, ainda, o fornecimento de garçons, sendo que tudo isso está incluído no preço do serviço a ser prestado.
Em alguns buffets há, ainda, o fornecimento de música, por meio mecânico ou por conjuntos. Não se trata, porém, de diversão pública, pois não é aberta ao público, apenas aos convidados, nem há cobrança individual de ingresso, mas de quem contratou os serviços do buffet.
Se a organizador do buffet loca certos apetrechos, não estará sendo tributada a atividade de locação de bens móveis, pois referidos apetrechos (talheres, copos, pratos) fazem parte da organização da festa ou serviços de buffet. (Editora Saraiva, 10ª Edição, 2017, pág. 353).
Característica do serviço indicado no item 17.11 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 é a de que ele é prestado a uma específica pessoa, que contrata a prestadora do serviço e a ela atribui a organização de uma festa ou recepção, bem como a montagem de um bufê, que dará a convidados específicos, ou seja, atividade que não se resume ao preparo e fornecimento de alimentos e bebidas".

Tal é o conceito de bufê. O seu significado está atrelado à realização de festas e recepções, o que compõe o campo material do ISSQN. Por outro lado, o fornecimento de bebidas e alimentação já estaria no campo material do ICMS.

Nesse mesmo caminho, a Súmula 163 do STJ fixou que "o fornecimento de mercadorias com a simultânea prestação de serviços em bares, restaurantes e estabelecimentos similares constitui fato gerador do ICMS a incidir sobre o valor total da operação".

Por certo que o fornecimento de alimentação e bebidas compreende uma atividade mista, que envolve operações de circulação de mercadorias e serviços. Quando se tratar de atividade mista, mercadoria e serviços, deve-se observar o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser campo de incidência do ICMS quando tal serviço não consta na lista do ISSQN, conforme voto de lavra o ex-ministro Luiz Fux:

"(…) 4. A Primeira Seção desta e. Corte firmou entendimento no sentido de que: (a) sobre operações 'puras' de circulação de mercadoria e sobre os serviços previstos no inciso II, do artigo 155 da CF (transporte interestadual e internacional e de comunicações) incide ICMS; (b) sobre as operações 'puras' de prestação de serviços previstos na lista de que trata a LC 116/03 incide ISS; (c) e sobre operações mistas, incidirá o ISS sempre que o serviço agregado estiver compreendido na lista de que trata a LC 116/03 e incidirá ICMS sempre que o serviço agregado não estiver previsto na referida lista. (…) (STJ, REsp 1102838/RS, relator ministro LUIZ FUX, j. 14.12.2010)".

Portanto, servir alimentos e bebidas em estabelecimento de empresas contratantes, restaurantes, bares e estabelecimentos similares, sem se caracterizar serviços de Bufê, faz com que a atividade seja hipótese de incidência do ICMS, em detrimento do ISSQN.

Autores

  • é advogado tributarista da sociedade Pinto & Bowens Advogados Associados, pós-graduado em MBA com ênfase em Finanças, Controladoria e Auditoria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) (2018), pós-graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio, pós-graduado em Direito Tributário pelo Ibet, professor de Direito Tributário pelo Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (Cescage), professor de Direito Aplicado ao Agronegócio na pós-graduação pelo Cescage, presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB de Ponta Grossa-PR, ex-conselheiro da OAB Subseção de Ponta Grossa – PR e ex-membro do Conselho Municipal de Contribuintes de Ponta Grossa – PR.

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