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Protesto indevido de cheque não gera indenização por danos morais, decide STJ

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8 de novembro de 2021, 13h23

A ilicitude da conduta não implica o dever de indenizar se não houver dano efetivo ao bem jurídico tutelado. Assim, alinhando-se à posição da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, a 4ª Turma pacificou a jurisprudência da corte ao decidir que o protesto de título de crédito prescrito, embora irregular, não gera direito automático à indenização por danos morais. 

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Para o STJ, protesto de cheque prescrito
não gera danos morais automaticamente
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Mesmo determinando o cancelamento do protesto indevido de dois cheques — feito após o prazo para execução cambial, mas dentro dos cinco anos que possibilitam a cobrança por outras vias —, o colegiado negou o pedido de indenização feito pelo emissor dos títulos.

O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que, no caso de protesto irregular, o dano moral está vinculado ao abalo de crédito e à pecha de mau pagador decorrentes do ato. No entanto, se o protesto é irregular por causa da prescrição do título — o que significa que não poderá ser executado, embora restem outras possibilidades de cobrança judicial —, "não há direito da personalidade a ser legitimamente tutelado, pois não há abalo de crédito".

Quanto ao caso em julgamento, acrescentou o magistrado, "não só não houve efetivo dano ocasionado, como é certo que o autor não nega que deve, tampouco manifesta qualquer intenção em adimplir o débito".

CPF restrito
O recurso teve origem em ação declaratória de prescrição de débito e baixa de protesto com indenização por danos morais, ajuizada pelo devedor após verificar uma restrição em seu CPF, em vista do protesto, em 9 de outubro de 2009, de cheques emitidos em 27 de setembro de 2005, nos valores de R$ 2 mil e R$ 700.

Entre outros pontos, ele alegou que os cheques foram emitidos para outra pessoa, que os repassou ao portador, com o qual não teve relação jurídica. Argumentou ainda que, após a prescrição dos cheques, resta apenas a ação de cobrança ou monitória para o recebimento do crédito, não podendo o credor promover o protesto do título.

O Tribunal de Justiça do Paraná considerou que o protesto foi regular, pois a dívida expressa nos cheques não estava prescrita, já que entre a data da emissão e o protesto não se passaram mais de cinco anos.

O ministro Luis Felipe Salomão verificou que, ainda que não exista negócio entre as partes litigantes, os cheques foram endossados. Ele explicou que o artigo 20 da Lei do Cheque (Lei 7.357/85) estabelece que o endosso transmite todos os direitos resultantes do cheque, dispondo o artigo 22, caput, que o detentor de cheque "à ordem'' é considerado portador legitimado se provar seu direito por uma série ininterrupta de endossos, mesmo que o último seja em branco.

Segundo o relator, o cheque endossado confere, em benefício do endossatário, os efeitos de cessão de crédito, não sendo necessária nenhuma outra formalidade para tanto.

Obrigação líquida, certa e exigível
Salomão explicou também que o cheque é ordem de pagamento à vista e a execução pode ser movida dentro de seis meses após o prazo de apresentação (30 ou 60 dias, conforme seja da mesma praça ou de praça diferente).

Transcorrido o prazo de prescrição para a execução, o artigo 61 da Lei do Cheque prevê dois anos para o ajuizamento de ação de locupletamento ilícito, a qual, diante da natureza cambial, prescinde da descrição do negócio subjacente. De acordo com o ministro, expirado o prazo para ajuizamento da ação por enriquecimento sem causa, o artigo 62 do mesmo diploma legal admite o ajuizamento de ação fundada na relação causal.

Ao contrário do entendimento das instâncias ordinárias, Salomão concluiu que, no caso, "o protesto é irregular, pois o artigo 1º da Lei 9.492/1997 estabelece que protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida".

Para ele, "a interpretação mais adequada, inclusive tendo em vista os efeitos do protesto, é a de que o termo 'dívida' exprime débito, consistente em obrigação pecuniária, líquida, certa e que é ou se tornou exigível".

O magistrado lembrou que a 2ª Seção, em julgamento de recurso repetitivo, estabeleceu que o documento hábil para protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível (Tema 902). Em relação ao protesto de cheque, a 2ª Seção, também em repetitivo, definiu que "sempre será possível, no prazo para a execução cambial, o protesto cambiário de cheque, com a indicação do emitente como devedor" (Tema 945).

Segundo o relator, é incontroverso nos autos que os cheques foram emitidos em 2005 e apontados a protesto em 2009, quando já havia transcorrido o prazo prescricional de seis meses para a execução cambial. Diante disso, reconhecendo a irregularidade do protesto, a turma julgadora acolheu o pedido de cancelamento do registro. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 1.536.035 

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