Opinião

O Dia do Taxista é todo dia!: a concorrência desleal dos aplicativos

Autor

  • Raul Haidar

    é jornalista e advogado tributarista ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

1 de novembro de 2021, 16h30

"Quem estuda tributação sabe que impostos só podem incidir sobre renda, patrimônio e consumo. Os veículos são tributados pelo ICMS e IPI porque são bens de consumo, classificados como mercadorias (pelo ICMS) e produtos industrializados (pelo IPI)." ("Justiça Tributária", editora Outras Palavras, S.Paulo, 2014, pg.92)

Spacca
No dia 8 de julho deve ser comemorado o Dia do Taxista em São Paulo. Essa data não tem merecido qualquer respeito, da mesma forma como é ignorado o "Dia Nacional de Respeito ao Contribuinte", criado pela lei 12.325 de 15/09/2010, sancionada pelo então presidente Lula, objeto de nossa coluna do dia 24/05/2021.

A homenagem aos taxistas resulta de lei proposta pelo vereador Adilson Amadeu (DEM). No site da Câmara Municipal encontramos sua manifestação, em que afirma:

"O Dia do Taxista (8 de julho) foi instituído em maio de 1994 para prestar uma homenagem a esta categoria diferenciada de profissionais que sabem de todos os assuntos que afetam o cotidiano de São Paulo… Antes da pandemia, os profissionais do setor eram responsáveis pelo transporte diário de mais de meio milhão de passageiros na cidade, com mais de 40 mil trabalhadores legalizados. Atualmente, são cerca de 38 mil carros credenciados e autorizados pelo poder público para rodar nas ruas paulistanas (a maior frota do país e uma das cinco maiores do mundo), divididos em 5 subcategorias…

"…Um contingente de trabalhadores multicultural, composto em sua maioria por homens (85%, segundo estimativas), com carros novos (50% dos veículos possuem, no máximo, dois anos de fabricação segundo pesquisa da SP Turis) e com ótima avaliação e aceitação dos paulistanos (65% de ótimo/bom, 24% de regular, segundo dados da última pesquisa Datafolha que avaliou o serviço prestado pela categoria).

"Com veículos vistoriados e fiscalizados pelo poder público para conferir maior conforto e segurança ao passageiro, taxímetros aferidos pelo Instituto de Pesos e Medidas (Ipem), todos os carros paulistanos também disponibilizam meios de pagamento eletrônico e, em sua grande maioria, contam com aplicativos de corridas instalados…

"…os taxistas estão entre os profissionais que mais refletem o ânimo cosmopolita de São Paulo. Seja rodando durante o dia, à noite ou de madrugada, entre um deslocamento e outro, eles recolhem histórias e repercutem os assuntos que afetam a metrópole: o trânsito, o futebol, as eleições, as manifestações, além de vivenciar e auxiliar na mobilidade urbana dos grandes movimentos esportivos, culturais, turismo e de lazer da cidade. Um aspecto que já se avizinha no horizonte paulistano, à medida que os índices de vacinação avançam em nossa cidade…

"… serviço de táxi é credenciado, regulamentado, fiscalizado e legalizado. Há uma série de exigências profissionais que seus motoristas devem cumprir junto aos órgãos reguladores da administração pública."

Nosso país enfrenta gravíssima crise econômica e financeira, que atinge também todos os brasileiros. Os taxistas que compraram veículo com financiamento bancário são mais afetados: quando atrasem seus pagamentos correm o risco de perder sua fonte de rendimentos.

Enquanto isso somente as instituições financeiras conseguem lucros fantásticos. Veja-se a notícia da última quinta-feira, 28/10 na Folha e no Estadão, ambas com manchete similar : "Santander Brasil lucra R$ 4,3 bilhões no terceiro trimestre, alta de 12,5%” (Folha) e "Lucro do Santander cresce 12,5% no 3º trimestre e vai a R$ 4,3 bi" (Estadão).

Notícia divulgada sobre o nosso colega Vinicius Simony Zwarg, que foi professor da PUC-SP e trabalhou no Procon-SP, informa que o "Santander busca o judiciário para romper planos de previdência privada e prejudica centenas de clientes. Esse mesmo banco moveu ação para cobrar crédito imobiliário de um médico que nada lhe devia! Perdeu a ação e teve que pagar custas e honorários, mesmo após recursos não admitidos. Até hoje esse banco tem o título de 'Empresa Amiga da Justiça'".

Claro está que bancos foram criados para dar lucros, da mesma forma que táxis foram criados para não ficar no ponto… Mas estes sofrem uma terrível e desleal concorrência, que em alguns casos tangencia a criminalidade: os carros por aplicativos!

Consta que os motoristas de aplicativos em São Paulo sejam perto de 300 mil e os taxistas pouco mais de 10% disso. O presidente da Associação de Motoristas de Aplicativos de São Paulo, Eduardo Lima de Souza, afirma que 25% desses motoristas deixaram de trabalhar desde o início da pandemia. Também informou que as tarifas não sofrem reajustes desde 2015 e que 25% dos motoristas deixaram desde o início de 2020, segundo base de dados da prefeitura.

Diz ainda que "Os motoristas entraram numa fase crítica depois desses consecutivos aumentos dos combustíveis. Uma situação muito grave. Não tivemos reajuste de tarifa nem para acompanhar a inflação desde 2015. O motorista vem sentindo isso e muitos vêm desistindo desde o início da pandemia, em 2020".

Mas o pior de tudo é que boa parte das empresas ou "plataformas" de aplicativos não recolhem os tributos ou encargos legalmente devidos. Pelo menos uma delas tem sede ou matriz no exterior e assim provavelmente pratica o crime de sonegação fiscal.

A notícia de nosso repórter José Higídio datada de 04/08/2021 informa que "O preço do transporte é definido pela Uber, sem qualquer possibilidade de concorrência entre os motoristas que ofertam o mesmo produto no mercado", como lembrou Bicalho.

A Uber também faz a gestão das reclamações dos passageiros, inclusive sobre o próprio motorista. Para a desembargadora, a empresa exerce "unilateralmente seu poder diretivo e sancionatório de acordo com sua exclusiva deliberação ou mediante critérios inseridos nos comandos automatizados".

Motoristas de aplicativo são trabalhadores que, como os outros, lutam pela sobrevivência. Há quem prefira os táxis por uma série de motivos. Como autônomos, inexiste empresa que lhes possa proporcionar descontos em postos de gasolina. Também não há registros de que cancelem corridas por alguma razão que não explicam ou que promovam ações trabalhistas contra empresas que descumprem a legislação trabalhista…

Vamos parar por aqui. Não há necessidade de ocupar espaço para dar destaque a assuntos que são do conhecimento público. A imprensa livre, democrática e imparcial faz seu trabalho. O resto é o resto.

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  • é jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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