Opinião

É preciso derrubar vetos à lei do Fiagro para integrar mercado e agronegócio

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31 de março de 2021, 18h12

O setor produtivo relacionado ao agronegócio aguardava ansiosamente a sanção do presidente da República ao PL 5.191/20, aprovado no início deste mês pelo Congresso Nacional. Entretanto, a publicação da Lei nº 14.130/21, nesta terça-feira (30/3), jogou um balde de água fria no investidor e nos produtores rurais, diante dos inúmeros vetos ao texto original do PL.

O Projeto de Lei 5.191/20 foi apresentado pelo deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) com o propósito de criar instrumentos no mercado de capitais para financiar a produção de toda a cadeia relacionada ao setor agroindustrial, possibilitando ao produtor rural e a uma gama de empresários a ele relacionados a obtenção de crédito por uma via paralela àquela oferecida pelas instituições financeiras.

Os instrumentos criados pelo PL buscaram canalizar recursos privados a atividade agroindustrial, por meio de instrumentos análogos aos já existentes na Lei nº 8.668/93, que institui os Fundos de Investimento Imobiliário (FII).

Entretanto, os vetos da presidência da República deixaram o Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) menos atrativo que o FII.

Na Mensagem 111, de segunda-feira (29/3), o presidente da República, por meio dos vetos:

a) Retirou a isenção do Imposto de Renda na fonte sobre as aplicações do Fiagro na remuneração produzida por Certificado de Depósito Agropecuário (CDA), Warrant Agropecuário (WA), Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), e Cédula de Produto Rural (CPR);

b) Retirou o pagamento diferido que, segundo o PL, seria para o momento do resgate da cota do fundo do Imposto de Renda sobre o ganho de capital nas hipóteses em que o proprietário do imóvel rural integraliza o capital do fundo com essa propriedade;

c) Retirou a isenção do Imposto de Renda dos rendimentos distribuídos pelo Fiagro cujas cotas sejam admitidas à negociação exclusivamente em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado.

Este último benefício, na redação do PL 5191/20, seria concedido somente aos fundos que contassem com, no mínimo, 50 quotistas, e não seria concedido ao quotista pessoa física titular de cotas que representem 10% ou mais da totalidade das cotas emitidas pelo Fiagro ou cujas cotas lhe dessem direito ao recebimento de mais de 10% do total de rendimentos distribuídos pelo fundo.

Interessante notar que os diversos vetos colocados na Mensagem 111 se traduzem em benefícios que ainda permanecem em outras normas.

Os rendimentos e ganhos de capital auferidos pelos FII gozam de isenção de IOF e de Imposto de Renda (IR) (artigo 16 da Lei nº 8.668/93).

A isenção de IR ainda existe, como regra geral (artigo 3º, IV e V, da Lei nº 11.033/04), na remuneração produzida pelos mesmos certificados, letras e cédulas indicadas no veto relativo ao item "a" acima indicado.

A mesma Lei nº 11.033/04 ainda prevê a isenção do Imposto de Renda sobre os rendimentos distribuídos pelos FII cujas quotas sejam admitidas à negociação exclusivamente em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado (artigo 3º, III).

A única razão para os referidos vetos dada pela presidência está no suposto "óbice jurídico por acarretar renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro" (trecho da Mensagem 111).

Entretanto, o Fiagro é um novo produto que, certamente, irá movimentar o mercado financeiro e o agronegócio, atrairá investimentos e gerará inúmeras novas fontes de receita. Se esse produto está sendo criado agora, no cenário atual, o erário vai arrecadar mais e não menos do que arrecada hoje.

Ainda, alguns detalhes devem ser ressaltados: a) a redação do PL 5.191/20 não conferia isenção do IR sobre o ganho de capital na integralização de um imóvel rural em um Fiagro, mas sim o seu pagamento diferido, quando da liquidação das quotas; b) a não incidência do IR sobre a distribuição de dividendos é a regra e não a exceção no sistema tributário brasileiro; e c) não houve isonomia tributária entre o FII e o Fiagro.

Diante desse cenário, os profundos vetos presidenciais na redação da Lei nº 14.130/21 revelam que: a) o Fiagro recebeu um tratamento jurídico-tributário aquém daquele dado ao FII; b) o Poder Executivo deixou escapar a oportunidade de se criar um importante mecanismo de investimento privado (nacional e internacional) para o mais importante setor produtivo nacional; e c) os vetos, sob o pretexto de evitar "renúncia de receita", provocarão o efeito inverso de desincentivo do ingresso de investimentos (internos e externos) no setor agroindustrial e, certamente, deixarão de promover o crescimento da arrecadação dos tributos sobre esse setor.

O Poder Legislativo deve se impor para derrubar os vetos e corrigir os rumos da integração entre o mercado financeiro e o agronegócio.

Autores

  • é sócio do escritório Figueiredo & Velloso Advogados Associados, procurador do Distrito Federal, mestre em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito Público–IDP e LLM em Direito Societário pelo INSPER.

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