Criptografia em aplicativo de mensagem não permite multa cominatória
24 de junho de 2021, 17h22
Uma empresa fornecedora de aplicativo de mensagens não pode ser multada por descumprir ordem judicial para interceptação e acesso ao teor das conversas de usuários sob investigação, se tais providências são impedidas pelo emprego de criptografia de ponta a ponta. A partir desse entendimento, a 5° Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial do Ministério Público de Rondônia que pedia a reforma do acórdão de 2° instância que afastou integralmente a multa cominatória (astreintes) aplicada contra o WhatsApp.
Segundo os autos, a empresa não consegue fornecer os dados para a investigação porque a criptografia utilizada no aplicativo protege os dados nas duas extremidades do processo, no polo do remetente e no do destinatário da mensagem. Em 1° instância, a multa foi aplicada, mas indeferida pela 2° instância.
Ao analisar o processo, o ministro Ribeiro Dantas lembrou que a 3° Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.568.445, decidiu sobre a possibilidade de aplicação, em abstrato, da multa cominatória. Todavia, ressalvou, é preciso fazer uma distinção entre aquele caso e a situação do recurso em julgamento. "Diversamente do precedente, a questão posta nestes autos é a alegação, pela empresa que descumpriu a ordem judicial, da impossibilidade técnica de obedecer à determinação do juízo, haja vista o emprego da criptografia de ponta a ponta", afirmou.
Segundo o ministro, se a própria empresa, agindo com a finalidade de lucro, gera uma situação em que fica impossibilitada de identificar o conteúdo requisitado pela Justiça, conteúdo este importante para a investigação de crimes e cujo sigilo pode ser legalmente afastado, "seria razoável proibi-la de alegar obstáculo que ela mesma criara", afirma.
Por outro lado, observou, ao buscar mecanismos que protegem a intimidade da comunicação privada e a liberdade de expressão, por meio da criptografia de ponta a ponta, as empresas estão assegurando direitos fundamentais reconhecidos expressamente na Constituição Federal. Diante disso, Dantas entende que a aplicação da multa não deve ser admitida, pois a realização do impossível, sob pena de sanção, não encontra guarida na ordem jurídica.
O magistrado também citou dois julgamentos em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF), que o ministro Edson Fachin e a ministra Rosa Weber, chegaram à conclusão de que o ordenamento jurídico brasileiro não autoriza que, em detrimento dos benefícios trazidos pela criptografia para a liberdade de expressão e o direito à intimidade, as empresas de tecnologia sejam multadas por descumprimento de ordem judicial incompatível com a encriptação. "Diante da fundamentação ora apresentada, a despeito da boa argumentação da acusação, não se pode falar em ofensa ao artigo 10, parágrafos 1º e 2º, da Lei 12.965/2014", concluiu. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
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