Advocacia de excelência

Marilena Winter, eleita presidente da OAB-PR, quer valorizar a advocacia feminina

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20 de dezembro de 2021, 7h32

Um advogado forte é sinônimo de uma democracia forte e uma Constituição respeitada. Assim pensa a primeira mulher eleita presidente da seccional do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil, Marilena Winter, que pretende blindar a advocacia paranaense nas suas prerrogativas, com uma estrutura de excelência à sua disposição.

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Natural de União da Vitória, no interior do estado, na fronteira com Santa Catarina, Marilena é graduada em direito e mestre e doutora em direito das relações sociais pela UFPR (Universidade Federal do Paraná). Atua como procuradora do município de Curitiba desde 1992. E é professora de Direito Civil da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Na OAB, foi conselheira e secretária-geral, participou de comissões e atualmente exerce a função de vice-presidente.

Em entrevista à ConJur, Winter disse que um dos principais focos da gestão será na condição da mulher advogada, que precisa sempre ser considerada a partir de uma perspectiva de gênero. "Considero muito importante que questões relacionadas à realidade feminina e ao universo feminino sejam mais discutidas e esclarecidas, especialmente por profissionais do direito, que podem ajudar na formação de uma cultura na sociedade em que a mulher seja mais valorizada."

A futura presidente também salientou a valorização da jovem advocacia, através da criação de cursos práticos com o objetivo de ajudar os novos advogados e advogadas com questões importantes do dia a dia da advocacia. Além disso, pretende ampliar benefícios financeiros e oferecer a estrutura da OAB-PR para auxiliar aqueles no início da carreira.

Confira a entrevista:

ConJur — Qual o significado de ser a primeira presidente mulher da OAB-PR? Quais são os projetos da senhora para valorização da advocacia feminina?
Marilena Winter — Vejo como uma importante quebra de paradigma. É muito simbólico o fato de que nós vamos comemorar os 90 anos da OAB-PR sob a presidência de uma mulher. Na história da nossa seccional, tivemos apenas sete mulheres que participaram de diretorias. Então acredito que essa quebra paradigmática representa um olhar para o futuro, o reconhecimento do trabalhado das mulheres, da igualdade de condições de exercer qualquer função e ocupar qualquer espaço na sociedade. Isso também vai inspirar outras advogadas, e acho que até as gerações mais novas hoje já conseguem se reconhecer também como valorizadas nesse espaço.

Temos muitos projetos que envolvem o aumento da participação feminina, mas também a valorização das mulheres como um todo. Considero muito importante que questões relacionadas à realidade feminina e ao universo feminino sejam mais discutidas e esclarecidas, especialmente por profissionais do direito, que podem ajudar na formação de uma cultura na sociedade em que a mulher seja mais valorizada. Aqui no Paraná já fazemos parte de um grupo interinstitucional formado por todas as estruturas do sistema de Justiça, ou seja, magistratura, Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia Pública, que se chama Grupo Interinstitucional de Gênero. A nossa luta é justamente para construir uma jurisprudência com perspectiva de gênero. A lei, muitas vezes, é aplicada com muita neutralidade, sem levar em conta a situação singular da mulher no mundo. Daí a importância de advogados já peticionarem considerando a perspectiva de gênero.

ConJur — Quais serão as prioridades do primeiro ano de gestão?
Marilena — Primeiramente, vamos desenvolver alguns projetos diretores, que têm como foco principal a jovem advocacia. Como sabemos, o curso de direito forma bacharéis generalistas, não necessariamente com as habilidades necessárias para o exercício da profissão. Vamos oferecer cursos de curta duração e muito práticos, voltados para que os jovens advogados se familiarizem com peticionamento, sustentação oral, comportamento, audiência. E, além disso, vamos ajudar no planejamento da carreira, organização de escritório, precificação de honorários, relacionamento com o cliente, acolher e oportunizar estágios em grandes escritórios. Também estamos estudando como ampliar os benefícios financeiros para facilitar esse início.

Um segundo passo é montar os chamados escritórios compartilhados com uma estrutura de ponta no Paraná. Queremos criar estúdios adequados onde os advogados possam utilizar computadores, com equipamentos de vídeo e áudio para participar de audiências. Essa medida visa equilibrar as condições entre os mais vulneráveis, como os jovens, as mulheres, pessoas com deficiência e o público LGBTQIAP+.

E, além disso, vamos investir muito na nossa Escola Superior de Advocacia. Temos um projeto grandioso para a ESA. Queremos fazer uma escola de altos estudos jurídicos, para discussão e debate de temas um pouco mais profundos.

ConJur — Tanto a senhora quanto outros integrantes da chapa falaram que estão recebendo a Ordem em um ótimo estado, mas quais serão as principais mudanças em relação à gestão anterior?
Marilena — Sempre foi dito que a OAB-PR é de excelência. Então, a inovação será: queremos ter também uma advocacia de excelência. O advogado como protagonista. Como podemos usar a OAB como um instrumento para que os advogados tenham melhores condições de trabalho? Uma primeira medida nesse sentido é que o advogado conheça todos os programas que a Ordem já oferece. Um exemplo básico é o Anuidade Zero. Um advogado hoje, se utilizar os convênios que temos, pode, pelo sistema de cashback, zerar a anuidade. Em vez de conhecer isso, muitos advogados pleiteiam a redução da anuidade. Não sabem que podem trabalhar para ter um abatimento no seu valor. Precisamos aperfeiçoar a comunicação com a advocacia.

Também queremos que todo advogado se reconheça. "A minha OAB. Eu sou um advogado do Paraná." E que fora do estado as pessoas identifiquem o advogado do Paraná como um advogado bem cuidado pela sua OAB, blindado nas suas prerrogativas, com uma estrutura de excelência à sua disposição e que ele não passe dificuldade. A Ordem vai cuidar dos desafios cotidianos, para que o advogado possa crescer, trabalhar e exercer o seu papel, que é tão fundamental à sociedade.

ConJur — A questão das prerrogativas foi uma pauta importante da campanha da senhora. Quais as medidas mais urgentes que precisam ser tomadas para defender as prerrogativas dos advogados paranaenses?
Marilena — O Código de Processo Civil retrata uma luta da advocacia, que é a regulamentação dos honorários. O artigo 85 diz claramente que pertencem ao advogado e que constituem verba alimentar. Isso é jurisprudência sedimentada até no STF. Honorários têm prioridade porque é verba alimentar e tem que ser fixado de uma forma digna, correspondente com a responsabilidade que é dessa profissão. O que está acontecendo hoje é que, apesar da construção do CPC, os juízes estão aplicando a equidade inversa, segundo a qual se não for possível aplicar os parâmetros estabelecidos no artigo 85, é possível fazer um arbitramento a juízo do julgador, de forma indiscriminada. Tal regra está sendo aplicada em muitos casos, deixando de lado o parâmetro de 10% a 20% do valor da causa para fixação dos honorário. Será uma luta nossa.

Para além dessa questão, no ponto de prerrogativas, é fundamental o respeito ao papel e à dignidade da advocacia. Queremos atuar de modo a estabelecer uma cultura de respeito, com a criação da Escola de Prerrogativas. A OAB quer conversar com as autoridades, com a Polícia, com a Guarda Municipal, com os órgãos públicos, para que eles possam compreender a importância do respeito às prerrogativas da nossa profissão. Não é individual, mas sim do exercício profissional, que é, enfim, a garantia da defesa do cidadão. Isso é fundamental no estado democrático. Temos clara a ideia de que advogado forte é sinônimo de uma democracia forte, de uma democracia respeitada, e de uma Constituição respeitada.

ConJur — A chapa da senhora teve uma vantagem considerável em relação ao segundo colocado. A que atribui essa vitória?
Marilena — Percebi durante minha campanha muita gente entusiasmada com o fato de ser uma mulher pela primeira vez na história. Esse fato me parece que pesou bastante. Mas não foi só isso. A advocacia avaliou que nossa chapa tinha propostas claras e viáveis. E os eleitores perceberam que nossos projetos eram voltados para a maior inclusão da advocacia vulnerável, o que realmente atendem uma demanda presente.

Acho que também foi um fator importante o modo como foi composta nossa chapa. Procurei compor a chapa de forma que representasse diversos segmentos. O meu vice é um advogado do interior, que poderá ajudar com projetos para esse segmento. Coloquei na diretoria advogados de alguns segmentos que nunca apareciam antes, como o previdenciário. Criei uma diretoria da jovem advocacia. Assim, quando falo que a minha meta é uma advocacia de excelência, penso muito numa visão da advocacia do Paraná cooperando e com pontos de vista diferentes. Quer dizer, é criar um sentido colaborativo entre os advogados paranaenses. Então acho que isso foi algo que encantou um pouco as pessoas pelo nosso projeto. Essa entrega e esse desejo de trazer qualidade.

ConJur — A OAB-PR foi uma das primeiras seccionais em que aconteceram eleições híbridas. Como a senhora avaliou a experiência?
Marilena — Foi muito positiva e o feedback da advocacia também. Não tivemos nenhum tipo de problema com isso. O resultado veio muito rápido. As eleições foram tranquilas. Pouca gente foi votar presencialmente. Tivemos o menor índice de abstenção da nossa história — 85% dos advogados aptos votaram.

ConJur — Quais são as políticas que pretende implementar para aumentar a transparência de gastos?
Marilena — Na atual gestão, investimos muito no nosso Portal da Transparência. No último colégio de tesoureiros da OAB, nosso portal foi considerado um dos melhores do Brasil, exatamente porque colocamos lá todas as despesas. E isso, para mim, é um ponto de honra. Sou advogada pública. O meu trabalho é, essencialmente, fazer o controle da legalidade, inclusive das contas. Não existe gestão sem transparência e prestação de contas. E se puder ser melhor ainda, ela vai ser. Somos a única seccional do Brasil, salvo engano, com a certificação ISO 9001, pois fizemos a descrição dos processos de todos os departamentos. Também já possuímos um programa de compliance e implementamos um portal de compras.

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