Opinião

Precatórios, consenso e limites do CNJ

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26 de agosto de 2021, 19h14

Refletindo a rejeição sofrida pela PEC dos Precatórios, o governo federal sinaliza recuo na pretensão de parcelar os precatórios, considerando a existência de caminhos menos danosos ao país ao tema. Analisa-se, assim, a possibilidade de conferir tratamento adequado a essa despesa obrigatória, de forma a excluí-la do limite do artigo 107 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), à semelhança das despesas não recorrentes da Justiça Eleitoral. Solução nesse sentido pode vir do próprio Congresso Nacional ou do Executivo.

Sobreveio, no entanto, afirmação do ministro Paulo Guedes segundo a qual o presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, estaria disposto a veicular, via resolução daquele conselho, limitação ao pagamento dos precatórios e eventual parcelamento do excedente. Ao que afirma o ministro da Economia, o CNJ disporia em ato administrativo que os precatórios seriam pagos em 2022 até o montante de precatórios existente em 2016 — quando da criação da regra do teto de gastos corrigido monetariamente, e o excedente seria parcelado. Haveria, ainda, uma escalonamento em razão do valor.

As regras para pagamento de precatórios estão previstas na Constituição Federal, que veicula prazos, ordem de preferência e demais temas de forma exaustiva. Resolução do CNJ não pode alterar sequer a lei, o que dizer da Constituição Federal, que mesmo ao constituinte reformador impõe severos limites. Não parece crível que o presidente do CNJ e também presidente do STF, detentor de enciclopédico conhecimento jurídico, seja autor dessa ideia.

Para além do vício formal, fato é que mesmo emendas constitucionais, que veicularam parcelamentos e contingenciamento no pagamento dos precatórios, tais como as ECs 30/2000 e 62/2009, foram repelidas pelo STF (ADIs 2356 MC, 2362 MC, 4357 e 4425). O tribunal reconheceu ser ilegítimo que a "via crúcis do precatório (passe) a conhecer uma nova estação, a configurar arrevezada espécie de terceiro turno processual-judiciário". (ADI 4357). Naquela oportunidade foi do ministro Luiz Fux a conclusão de que "permit[ir] que decisões emanadas do Poder Judiciário, já definitivamente constituídas e revestidas de exigibilidade, percam sua força executiva (…) representa escárnio à nobre função jurisdicional". Referindo-se ao ministro Ayres Britto, o ministro Luiz Fux indicou que o colega "bem qualificou a presente Emenda Constitucional [EC 62] como 'emenda do calote'". Evidente, portanto, que não seria ideia sua ventilar que o CNJ poderia alterar a Constituição, sobretudo, repetindo regras que, no passado, já foram, por si, tidas como inconstitucionais.

O que ministro Luiz Fux, preocupado com os flagelo social que esse tema tem causado, tem ressaltado é a necessidade de um consenso em torno desse. Considerando o esforço do CNJ no desenvolvimento de programas e ações voltados à conciliação como forma de solução permanente de litígios, o presidente, ministro Luiz Fux, sugere a adoção dessa via democrática, por meio da qual "todos trabalham juntos para que todos possam ganhar" (site do CNJ).

Essa mesma solução foi outorgada à sociedade pelo Legislativo, que editou a Lei 14.057/2020, atribuindo ao Estado a faculdade de negociar com seus credores, de forma a acordar descontos e parcelamentos. Privilegia-se, assim, a democracia e se confere ao Executivo meio de "melhorar a gestão de gastos sem impor ao particular uma solução principesca, de cima para baixo", como ressaltando no projeto que deu origem à mencionada lei, de autoria do atual vice-presidente do Congresso Nacional, Marcelo Ramos. Essa inciativa merece elogios de toda a sociedade e deve ser prestigiada pelos autores envolvidos na superação do tema relativo aos precatórios.

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