Opinião

O agravo de instrumento e o microssistema da tutela coletiva na visão do STJ

Autor

  • Thomaz Carneiro Drumond

    é procurador do estado do Acre pós-graduado em Direito Administrativo Tributário Empresarial e em Processo Civil presidente da Comissão de Direito Processual Civil da OAB-AC e advogado sócio de Drumond Leitão Torres Advogados.

11 de agosto de 2021, 21h56

O novo Código de Processo Civil (CPC) enunciou em seu artigo 1.015 as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Desde a publicação da lei, a doutrina procurou desvendar se o rol de hipóteses de cabimento do recurso seria taxativo ou exemplificativo, ou, ainda, se caberiam interpretações restritivas ou extensivas.

Fato é que o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema n° 988 em sede de recursos repetitivos, consolidou o entendimento no sentido de que "o rol do artigo 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação".

Em recente julgamento do REsp 1.925.492-RJ, de relatoria do ministro Herman Benjamin, noticiado pelo Informativo de Jurisprudência n° 695, o Superior Tribunal de Justiça novamente enfrentou a discussão a respeito das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento diante da inovação trazida pelo novo código processual.

Dessa vez, a ação originária consistiu em ação de improbidade administrativa e a parte recorrente se insurgiu por meio de agravo de instrumento contra a decisão que indeferiu o pedido de depoimento pessoal da parte ré. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro entendeu incabível o recurso por não se encontrar entre as situações previstas no artigo 1.015, do CPC, compreendendo ser igualmente inaplicável à ação de improbidade o artigo 19, parágrafo 1º, da Lei n° 4.717/1965, porque a lei se referiria à ação popular:

"Artigo 19
(…)

§1º. Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento".

Porém, o STJ entendeu de forma diversa. De acordo com o ministro relator, "a ideia do microssistema de tutela coletiva foi concebida com o fim de assegurar a efetividade da jurisdição no trato dos direitos coletivos, razão pela qual a previsão do artigo 19, §1º, da Lei da Ação Popular ('Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento') se sobrepõe, inclusive nos processos de improbidade, à previsão restritiva do artigo 1.015 do CPC/2015".

Esclarecendo ainda mais o tema, destacou:

"Nesse sentido: 'os artigos 21 da Lei da Ação Civil Pública e 90 do CDC, como normas de envio, possibilitaram o surgimento do denominado microssistema ou minissistema de proteção dos interesses ou direitos coletivos amplo senso, no qual se comunicam outras normas, como o Estatuto do Idoso e o da Criança e do Adolescente, a Lei da Ação Popular, a Lei de Improbidade Administrativa e outras que visam tutelar direitos dessa natureza, de forma que os instrumentos e institutos podem ser utilizados com o escopo de 'propiciar sua adequada e efetiva tutela" (REsp 695.396/RS, 1ª Turma, relator ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe 27.4.2011).

Outro ponto importante do acórdão foi a menção ao entendimento do próprio Tribunal da Cidadania no sentido de que "o Código de Processo Civil deve ser aplicado somente de forma subsidiária à Lei de Improbidade Administrativa. Microssistema de tutela coletiva", a exemplo do REsp 1.217.554/SP, relatora ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 22/8/2013.

É necessário destacar que tal interpretação encontra lastro também no próprio artigo 1.015, que em seu inciso XIII prevê cabimento do agravo em "outros casos expressamente referidos em lei".

Por isso, o relator concluiu que "a norma específica inserida no microssistema de tutela coletiva, prevendo a impugnação de decisões interlocutórias mediante agravo de instrumento (artigo 19 da Lei n° 4.717/65), não é afastada pelo rol taxativo do artigo 1.015 do CPC/2015, notadamente porque o inciso XIII daquele preceito contempla o cabimento daquele recurso em 'outros casos expressamente referidos em lei", conforme decidido no AgInt no REsp 1.733.540/DF, relator ministro Gurgel de Faria, 1ª Turma, DJe 4/12/2019.

Tal entendimento resulta na aplicação indiscriminada do agravo de instrumento a todas as decisões interlocutórias no âmbito no microssistema da tutela coletiva, em similitude ao que era previsto no CPC de 1973.

Colhe-se, então, que o STJ entende atualmente que se aplica à ação de improbidade administrativa o previsto no artigo 19, §1º, da Lei da Ação Popular, segundo o qual das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento ­ sem restrições e de forma genérica , afastando-se a incidência primária da taxatividade mitigada do artigo 1.015 do CPC, em razão do reconhecimento do microssistema da tutela coletiva.

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