Opinião

Anotações sobre a prova no processo civil

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4 de dezembro de 2020, 11h33

O CPC (Lei 13.105/2015), cujo termo inicial de vigência é 18/3/2016, conforme Enunciado Administrativo nº 1 do STJ, completará seu primeiro quinquênio em igual data do próximo ano.

A ConJur publicou, no dia 1º de novembro, entrevista com o professor José Rogério Cruz e Tucci, consagrado processualista, sob o título "Uma lei como o CPC leva dez anos para ser interpretada e bem aplicada". Corroborando tal assertiva, o entrevistado apresentou exemplos de questões relevantes ainda não pacificadas pela jurisprudência do STJ, tribunal competente, em última ratio, para fixar a exegese da lei federal a par de ser o seu principal guardião, conforme CF, artigo 105 e seguintes.

As inovações/alterações introduzidas por nova lei no ordenamento jurídico, em especial um código, realmente pressupõem tempo razoável para receber a mais adequada compreensão da jurisprudência, sobretudo se se levar em conta a similar normatividade precedente, pois há uma tendência quase que instintiva de apego ao passado, no caso, exegético. Em geral, toda mudança, mesmo para melhor, até aquela pessoal, depende, normalmente, de algum prazo para readaptação.

Nessa diretriz, aspecto que veio à tona é aquele relacionado com a prova, em um processo. Ao dispor a respeito, logo nas disposições gerais, o artigo 332 do anterior CPC prescrevia:

"Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa".

Subjacente a tal norma o sentido segundo o qual às partes facultava-se o direito de fazer a prova tendente a demonstrar os fatos a justificar a existência do seu direito, observada a divisão dos respectivos ônus, conforme seu artigo 333.

O preceito similar no vigente CPC, artigo 369, por sua vez, dispõe:

"As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz" (grifos do novo).

Como se verifica, esse comando legal é muito mais incisivo, preciso, assinalando ser direito das partes a produção de provas, cujo objetivo será a eficaz persuasão do julgador, na perspectiva de cada litigante.

Por outro lado, pelo artigo 131 anterior, o juiz tinha a liberdade, motivadamente, para avaliar a prova — o que se denominava, correntemente, de livre convicção motivada, do julgador. O similar, no vigente código, artigo 371, contém nova redação, da qual não consta o advérbio "livremente". Logo, a liberdade, o grau de subjetivismo do julgador, aqui, ainda que se admita a sua subsistência, inobstante a não reprodução do advérbio, ficou muito mais regrado, contido, pois há de fundar-se no que conste, como tal, dos autos. A objetividade, como regra, deve preponderar, ser a tônica a dar lastro ao respectivo julgado. No mínimo, mitigou-se e muito a subjetividade albergada sob a expressão "livremente"; esse parece ter sido o propósito da supressão operada pelo novo dispositivo. Efetivamente, a motivação, princípio constitucional, só se perfaz com efetividade, nas decisões de todos os poderes estatais, por todos os seus órgãos, quando lastreada em elementos de convicção concretos, efetivos, reais, excetuando-se apenas os chamados atos administrativos discricionários.

Na singela comparação, há diferenças, verifica-se, e bem marcantes. Aliás, seria ocioso editar novo código e, naquilo que inovou, parcial ou totalmente, deixar de lhe atribuir inteligência compatível com a novidade, às vezes com adstrição à memória pretérita, no ponto. É claro ser importante preservá-la, todavia arejada pela superveniente mudança normativa, naquilo que for pertinente.

Outro aspecto a observar é o relacionado com os destinatários da prova, na letra de tais preceitos, o "juiz", mas parece claro que o sentido aí é compreensivo não só daquele que atua em primeiro grau, mas também do respectivo tribunal e mesmo, em menor dimensão, das cortes transordinárias porque essas, embora não examinem provas nos recursos que lhes são endereçados, avaliam ou reavaliam, sim, tal contexto em consonância com o quadro fático assentado na instância ordinária, procedendo, as vezes, à chamada revaloração da prova, para concluir ou não se foi ou deixou de ser adequado o acórdão recorrido, não só em face da lei de regência como, também, da jurisprudência já assentada a respeito.

Logo, é de suma importância que o magistrado que tem o primeiro contato com os autos, normalmente o de 1º grau, não se esqueça que não será o único julgador destinatário das provas, aspecto valioso para sopesar a sua suficiência ou não, concretamente, inclusive para deferir ou indeferir, oportunamente, novos elementos de convicção acaso desejados pelas partes, desde que pertinentes.

Finalizando, me veio à lembrança a magnífica e laureada obra intitulada "Prova Judiciária no Cível e Comercial", escrita e editada na década de 1960, de autoria do saudoso professor Moacyr Amaral Santos, catedrático da FDUSP e ministro do STF, a denotar, então, o relevo da matéria, que persiste, sem dúvida, como tal, nos tempos em vigor.

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