Sem dolo ou culpa

Justiça de São Paulo absolve homem que matou universitário em briga de bar

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24 de setembro de 2018, 15h43

A reação por instinto reflexo que causa a morte de alguém pode ser considerada conduta atípica. Assim entendeu o juiz Márcio Lucio Falavigna Sauandag, da 22ª Vara Criminal de São Paulo, ao absolver um analista de crédito que quebrou um copo de chope no pescoço de um universitário em uma briga de bar, provocando a morte deste.

Para Sauandag, o réu não praticou lesão corporal seguida de morte, pois não houve dolo ou culpa na ação, caracterizada por ele como um “movimento reflexo”.

O juiz considerou ainda que o movimento do analista de crédito com o copo foi um empurrão instintivo para se desvencilhar da briga, já que a vítima é quem foi tirar satisfação após desentendimento e quem também iniciou a luta corporal.

Inicialmente, o réu foi processado por homicídio doloso duplamente qualificado perante a 5ª Vara do Tribunal do Júri da capital. O Ministério Público chegou a recorrer da decisão de impronúncia do jovem. No recurso, o tribunal acatou a tese, por maioria, de que teria havido dolo eventual no golpe que resultou na morte do universitário, mas, em embargos infringentes, a defesa do analista, patrocinada pelo advogado Luciano de Freitas Santoro, conseguiu que ele não fosse levado a júri. A denúncia acabou sendo alterada para o crime de lesão corporal seguida de morte (artigo 129, parágrafo 3º do Código Penal).

O Ministério Público sustentou, então, que a conduta do réu derivou de motivo fútil, “em razão da desproporcionalidade entre o crime e sua causa”. Já a defesa requereu a absolvição e sustentou que ele agiu em legítima defesa, excludente de ilicitude prevista no artigo 23, inciso II, do Código Penal, pois o acusado apenas reagiu à agressão inicial da vítima, tentando dela se desvencilhar.

Para embasar sua decisão, o juiz disse que os depoimentos das testemunhas foram “provas de enorme valia”, posto que “a ciência ainda não atingiu ponto tal que seja possível vasculhar os meandros da mente humana para constatar as intenções ocultas por detrás das ações externas dos seres”.

Sauandag entendeu que “a reação se deu por instinto, por reflexo, sem amparo em uma vontade consciente, de modo que não houve de sua parte dolo ou culpa”, e concluiu que, “não havendo dolo e nem culpa, não há elemento subjetivo qualquer na conduta do acionado, restando esvaziada, motivo pelo qual inviável sua punição”.

O magistrado afirmou ainda que, para ter se configurado legítima defesa, o réu haveria de manifestar uma reação ponderada, o que não ocorreu. “Não há como falar em reação pensada do acusado, porque, se assim o fosse, não se poderia considerar proporcional causa a morte da vítima a fim de se proteger de uma puxada de cabelo.” A absolvição teve fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

O Ministério Público interpôs apelação no início deste mês. Segundo o advogado Luciano Santoro, “a defesa comprovou, através das testemunhas presenciais e de parecer médico-legal, que o réu agiu em ato reflexo, sobrevindo justa sentença absolutória, razão pela qual espera-se que mais uma vez o Tribunal de Justiça negue provimento ao recurso ministerial, concordando com a tese defensiva”.

Processo 0000184-14.2011.8.26.0052

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