Opinião

Pesa sobre cada um de nós o dever da serenidade

Autor

  • Atalá Correia

    é professor do IDP (Instituto Brasileiro de Ensino Desenvolvimento e Pesquisa) doutor em Direito Civil pela USP (Universidade de São Paulo) e juiz de direito no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

2 de novembro de 2018, 6h52

Desde a redemocratização, não se vivem tempos tão difíceis em nosso país. A radicalização do discurso político invade nossas vidas, nas reuniões de família, nas conversas de bar e nas onipresentes redes sociais. É necessário saber lidar com esse estado de coisas.

Divergência de opiniões e debate é o que se espera de ordinário numa sociedade plural, onde cada um é absolutamente livre para construir sua visão de mundo e para fazer suas escolhas pessoais. Dito de outra forma, o debate existe porque as pessoas procuram expressar suas opiniões para convencer seus pares sobre objetivos comuns.

A razão busca a certeza e o correto. Havendo convencimento sobre o que é justo, a divergência é superada em bons termos. Ocorre que isso nem sempre é possível. Eventualmente, as partes permanecem firmes em suas posições iniciais, sem se convencerem. Sem que cada um possa seguir o seu caminho e sem um terceiro a quem possam delegar a decisão, lhes restará negociar um acordo ou engajar-se mutuamente num conflito, visando subjugar.

A serenidade, nos campos político e social, é o que diferencia dissensão e conflito, aí exercendo papel muito mais decisivo que a razão. A serenidade exige que escutemos, impõe o diálogo e o exercício da alteridade. Sem que possamos nos entender sobre o que é ideal diante das duras escolhas que as contingências da vida nos impõem, resta-nos o acordo sobre o que é possível. A moderação e razoabilidade são os instrumentos com que se faz a arte do possível. Quem acredita estar certo não admite a possibilidade de erro, não tem motivos para ouvir e, se não consegue convencer, dispõe-se a entrar em luta.

No campo da tolerância e do respeito, após a tomada de uma decisão política, pacifica-se a controvérsia. Há quem se sinta vitorioso e quem se sinta derrotado, o que é absolutamente ordinário nas democracias, mas esse sentimento perde-se no ar da infinidade de interesses comuns que ambos os lados compartilham no dia a dia de sua convivência mútua. No campo do confronto, não há decisão, não há acordo, não há pacificação. Há quem se sinta vencedor por ter subjugado aquele com quem irá conviver. Há quem se sinta injustiçado sob a perspectiva do que acredita ser correto. Entretanto, está aí a semente do próximo confronto que irá se avizinhar, numa espiral crescente. Com isso, as controvérsias diversas, da vida particular e da vida comum em sociedade, só são verdadeiramente superadas no campo do diálogo e do acordo.

Por isso, pesa sobre cada um de nós o dever da serenidade. Passadas as eleições, haverá eleitos e não eleitos, mas não deve haver derrotados. Todos com quem convivemos continuarão em nossas vidas, com divergências persistentes de opinião. Todos continuaremos, como brasileiros, atrelados a destinos comuns. Será necessário retomar o diálogo, fazer concessões mútuas e construir acordos que nos levem a superar as dificuldades e divergências.

Autores

  • é juiz de Direito no TJ-DF, doutorando e mestre pela Universidade de São Paulo e professor no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).

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