Tribuna da Defensoria

A abrangência da garantia da inamovibilidade do defensor público

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15 de maio de 2018, 13h21

1. Introdução
A inamovibilidade é uma garantia prevista no artigo 134, parágrafo 1º, da Constituição Federal de 1988.

Tal assunto é alvo de questionamentos acerca da sua abrangência: estaria a garantia da inamovibilidade restrita ao defensor público não ser movimentado contra sua vontade entre comarcas ou abarcaria a impossibilidade de movimentação do defensor público dentro do seu respectivo órgão de lotação?

2. Precedentes sobre a violação da inamovibilidade advindos da Defensoria Pública de Mato Grosso
Podemos citar dois casos paradigmáticos da Defensoria Pública de Mato Grosso: um proveniente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e outro advindo de recente decisão liminar monocrática da comarca de Barra do Garças (MT).

O primeiro caso foi de um defensor de 2ª instância removido, contra sua vontade, para a comarca de Tangará da Serra (MT) com o objetivo de substituir a colega que estava ausente por licença-maternidade, tendo-lhe sido assegurado a garantia da inamovibilidade, nos seguintes termos:

1º) MANDADO DE SEGURANÇA – DEFENSOR PÚBLICO – INAMOVIBILIDADE ASSEGURADA – ARTIGO 134, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – SEGURANÇA CONCEDIDA. Aos defensores públicos é assegurada a inamovibilidade, conforme estabelece o § 1º do artigo 134 da Constituição Federal. TJMT – PRIMEIRA TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PRIVADO – MANDADO DE SEGURANÇA Nº 64352/2009 – RELATOR: DES. JOSÉ TADEU CURY – DJE 18/12/2009).

O segundo caso foi baseado numa portaria da administração superior que, na lacuna da 1ª Defensoria de Barra do Garças, após a promoção do defensor público designado para a 2ª instância, resolveu designar arbitrariamente dois defensores titulares, respectivamente da 2ª e da 6ª Defensoria, para auxiliarem na parte cível da 1ª Defensoria de Barra do Garças, apesar de ter um defensor público titular, que, por discricionariedade da administração, encontra-se designado para a comarca de Cuiabá. Eis parte da decisão em comento[1]:

[…] 16. […] restou evidenciada probabilidade do direito (fumus boni iuris), vez que a primeira defensoria tem defensor público titular, não se podendo admitir que eventual déficit nos quadros da Defensoria Pública Estadual recaia tão somente sobre os ombros dos requerentes, exigindo colaboração de todos os membros desta para que haja a efetiva proteção constitucional dos direitos dos necessitados. Por outro lado é sabido e consabido que no âmbito desta comarca a carga horária de trabalho dos defensores foi diminuída, de tal sorte que ao ficarem responsáveis por mais uma Defensoria — ainda que seja conjuntamente — se mostra incongruente e inadmissível, uma vez que na mencionada defensoria — frise-se — possui membro titular.

Nesse segundo exemplo, percebe-se a violação da garantia da inamovibilidade dentro da mesma comarca, por meio do qual não se pode modificar o campo de atuação dos defensores públicos titulares sem a anuência deles, pois há limitação das suas funções nas Defensorias em que exercem suas titularidades.

Assim, o magistrado deferiu a tutela antecipada, garantindo aos defensores públicos a permanência de exercerem suas funções unicamente nas Defensorias que já eram titulares, eis que foram designados contra suas vontades para exercerem funções cumulativamente em outra Defensoria simultaneamente, gerando sobrecarga de trabalho:

18. Frente ao exposto, consubstanciado no art. 300 do CPC, DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de tutela provisória de urgência, DETERMINANDO a suspensão dos efeitos da Portaria n° 174/2017 DPG, para que o autor CARLOS EDUARDO FREITAS DE SOUZA exerça sua atividade laboral exclusivamente na 2° Defensoria e a autora KAMILA SOUZA LIMA atue tão somente na indigitada 6° Defensoria, excetuando-se as hipóteses de cumulação e substituição legal.

Tais precedentes demonstram de forma clara que a Defensoria Pública de Mato Grosso não vem respeitando a garantia da inamovibilidade dos seus próprios membros, o que gera a necessidade de busca da tutela jurisdicional para corrigir aludidas violações à inamovibilidade do defensor público.

3. Conclusão
Destarte, mormente pelos dois precedentes alhures mencionados, é proposto que a inamovibilidade, garantia constitucional do defensor público, não deve ser entendida exclusivamente como a proteção do defensor público não ser movimentado, sem seu consentimento, entre comarcas, mas deve ter uma maior abrangência, estendendo-se também ao órgão de lotação para o qual foi promovido.

Portanto, tal interpretação é a mais correta, pois resguarda o defensor público para que exerça suas funções livremente, sem que seja compelido a assumir atribuições surpresas, o que contribui para o exercício normal de suas funções.


[1] Processo 247.123, 2ª Vara Cível, Comarca de Barra do Garças, Decisão liminar proferida no dia 30/3/2017.

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