Transparência x privacidade

Advogados divergem sobre dever de divulgar financiamento em arbitragem

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10 de agosto de 2018, 11h43

Não há consenso entre advogados especializados em Direito Empresarial se a parte de uma arbitragem que recebeu financiamento para mover o procedimento deve divulgar isso para o árbitro e para seu adversário na disputa. O assunto foi debatido nesta quinta-feira (9/8) no III Congresso Internacional CBMA de Arbitragem, que acontece no Rio de Janeiro.

Nelson Eizirik, sócio do Eizirik Advogados, afirmou que, quando começa uma arbitragem, é importante que a parte financiada informe essa sua condição ao árbitro. Isso porque tal informação pode levar o julgador a se declarar impedido.

Para o especialista em Direito Societário, o árbitro deve conhecer os detalhes do empréstimo, como o valor fornecido ao litigante e o percentual que caberá ao financiador em caso de vitória, pois podem ajudar o julgador a conhecer a estratégia da parte. No entanto, diz, por esse mesmo motivo, o contrato de financiamento não deve ser divulgado à outra parte.

Nessa mesma linha, Rodrigo Garcia da Fonseca, sócio do Fonseca e Salles Lima Advogados Associados, apontou que, em certos casos, não comunicar que há um investidor pode colocar em risco o procedimento arbitral. Segundo ele, há processos em que uma parte insolvente é patrocinada por uma instituição que não se compromete a cobrir os custos da arbitragem. Assim, se o financiador desistir da disputa, o litigante não conseguirá arcar com as despesas.

Contrato de honorários
Embora acredite que não há obrigação de se divulgar o financiamento —salvo se o regulamento arbitral exigir isso —, Julian Fonseca Peña Chediak, sócio do Chediak Advogados, afirmou que a parte e o investidor têm o interesse de informar o empréstimo. Dessa forma, a decisão será mais hígida e menos sujeita à anulação.

No entanto, Francisco Müssnich, sócio do Barbosa, Müssnich, Aragão, avaliou que não é preciso informar o árbitro da existência de financiamento, pois isso não impacta o objeto da disputa. A seu ver, o problema de conflito de interesses deve ser resolvido antes do procedimento arbitral.

“A situação conflituosa nem deveria existir. Se você escolhe um árbitro que tem a ver com a parte, está predisposto a alguma chicana, o que não tem lugar na arbitragem. Não deve existir divulgação do financiamento porque não deve existir financiamento que crie algum conflito entre as partes, como a escolha do árbitro. Todo cliente tem direito a ser financiado quando não tem dinheiro”, disse.

Especialização dos árbitros
Outro ponto que gerou discordâncias entre os advogados foi a necessidade ou não de especialização dos árbitros na matéria que será discutida no procedimento. De acordo com Müssnich, as partes têm que justificar a importância do julgador escolhido para conduzir o caso. Ou seja: é preciso demonstrar que ele tem expertise na área do conflito.

“Quando uma parte escolhe resolver um conflito por arbitragem, entende que será tratada por experts na matéria. Fico sempre ressabiado quando há arbitragem societária com árbitros especialistas em outras áreas, como Direito Penal. [A escolha do árbitro] É matéria que exige enorme reflexão. A parte tem que entender a que serve aquela indicação. É relevante justificar a importância daquela pessoa que está sendo escolhida para a arbitragem”, ressaltou.

Por outro lado, Julian Chediak opinou que a especialização do julgador não é uma prioridade, uma vez que “dificilmente” as arbitragens mais complexas tratarão de assuntos de apenas um ramo do Direito. Como exemplo, citou litígio sobre contrato de compra e venda de ações envolvendo uma multinacional. Nesse caso, haverá controvérsias sobre Direito Societário, Direito Civil e Direito Internacional, diz.

Já Rodrigo Fonseca afirmou que, se uma parte deseja que o árbitro possua certas qualificações, deve elencá-las na cláusula compromissória (que fixa a arbitragem como meio de resolução de conflitos do contrato). Porém, o advogado destacou que o excesso de exigências pode dificultar a escolha do julgador.

Necessidade de anuência
Um ponto comum na opinião dos quatro advogados foi quanto à inclusão de terceiro em uma arbitragem apenas se ficar provado que ele consentiu, ainda que não expressamente, com a cláusula compromissória.

Nelson Eizirik também disse que, se o estatuto social de uma companhia prevê essa forma de resolução de conflitos, um acionista não pode alegar que não aceitou essa condição. Da mesma forma, o controlador indireto está submetido a essa regra, afirmou.

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