Opinião

É falsa controvérsia sobre uso do IPCA-E
em créditos trabalhistas

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16 de dezembro de 2017, 9h27

A discussão sobre a utilização da Taxa Referencial (TR) ou o IPCA-E para corrigir os créditos na Justiça do Trabalho não é nova. Em agosto de 2015, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu que era devido substituir nos créditos trabalhistas a TR pelo índice dos preços ao consumidor.

Houve muita repercussão sobre esse tema, e o Supremo Tribunal Federal concedeu uma liminar fazendo com que o assunto fosse congelado e todos voltassem a utilizar a TR. Em 26 de agosto de 2015, escrevi artigo sobre este tema na ConJur, que descrevia com detalhes o impacto financeiro para as empresas da substituição da TR pelo IPCA-E.

O problema persiste, embora hoje o cenário seja diferente e a taxa de juros de referência, a Selic, tenha chegado em 6 de dezembro ao seu mais baixo patamar desde 1999 e a diferença entre o IPCA-E e a TR, no acumulado de 12 meses, é de apenas 1,65%,.

Embora se queira emprestar a essa discussão um caráter jurídico, esse tema na verdade é uma questão simplesmente econômica. É lamentável que juízes pouco estudem economia, pois se o fizessem entenderiam essa questão de outra forma.

A segurança jurídica é um pilar básico de qualquer nação e elemento essencial para a economia. Saber que as regras não mudam aos humores e desejos dos agentes, mas que estes são fixados e limitados à legislação e à Constituição, possibilitam aos investidores avaliar seus projetos e fazer investimentos de forma segura. É assim que o mundo funciona.

Os juros de 1% ao mês aplicados pela Justiça do trabalho já penalizam em muito aqueles a quem os juízes acreditam não ter cumprido a legislação. A TR é um fator adicional, de correção monetária, embora os valores devidos já tenham sido corrigidos, dentro da prescrição, pelos dissídios aplicados à cada categoria.

Não há possibilidade de um trabalhador receber valor desatualizado com juros de 12% ao ano mais TR, além da correção dos débitos trabalhistas pelos dissídios dentro do período dos pedidos.

O investimento em uma NTNB Princ (título pós-fixado) do Tesouro Direto com vencimento em 2045 oferece remuneração de IPCA + 5,46% a.a. e uma LTN também do Tesouro Direto oferece remuneração pré-fixada de 10,10% a.a. para resgate em 2027. O mercado oferece remuneração bem inferior à já existente na Justiça do Trabalho, considerando títulos de longo prazo.

A possibilidade de usar o IPCA-E como fator de correção monetária, além de não fazer sentido, transformaria uma ação trabalhista na maior remuneração da economia brasileira. Há uma falsa questão que se coloca nesta discussão, a de que a TR não corrige os valores.

É importante reconhecer que a criação da TR em 1991 queria na verdade evitar o processo de reindexação da economia. Em outras palavras, a intenção era que essa “taxa referencial” fosse uma taxa de juros de referência, mas acabou sendo utilizada como um fator de correção monetária sem, no entanto, retroalimentar a inflação.

Essa taxa é utilizada na caderneta de poupança, uma das principais opções de investimento; utilizada nos financiamentos imobiliários e em muitos outros cálculos de rendimentos de investimentos, como títulos públicos. Não há razão para se imaginar que, se ela é utilizada pelo sistema financeiro como componente de correção monetária, não o poderia ser para os créditos trabalhistas.

Nenhum outro país em todo o mundo utiliza a correção monetária. Para exemplificar, o sistema internacional de contabilidade, o IFRS, somente aceita algo do tipo para países com inflação maior que 100% ao ano.

Continuando ainda com a análise, a adoção de um indicador diferente permitiria a outros reclamantes questionarem à Justiça por que eles receberam valores corrigidos com TR e outros passarão a ser beneficiados com a correção pelo IPCA-E. Caso a nova correção possa retroagir por dois anos um total aproximado de 2,1 milhões de processos poderão retornar à Justiça do Trabalho e requerer cerca de R$ 9 bilhões em novas execuções.

Além disso, a adoção do IPCA-E pode adicionar nos próximos cinco anos valores superiores R$ 17 bilhões às execuções que normalmente ocorreriam, supondo a média de 2016.

Não podemos esquecer que os índices são acumulados e que, mesmo a uma taxa de inflação de 3,9% projetada para os próximos cinco anos e considerando no mesmo período uma TR acumulada anualmente, o IPCA-E supera a TR em aproximadamente 14% no período de cinco anos — prazo médio para um processo com execução.

Outra consequência direta dessa substituição é que as empresas terão de alterar suas contingências e consequentemente suas provisões nos balanços. Além da constrangedora situação das empresas terem de explicar que suas provisões se alteraram sem explicar exatamente por que, as empresas nacionais e multinacionais irão apresentar resultados menores que apresentariam.

Como convencer a matriz — europeia, chinesa ou norte-americana — e mesmo os investidores nacionais que a planta “A” ou “B” e que os projetos “C” ou “D” precisam de investimentos e consequente ampliação do quadro de trabalhadores quando os processos na Justiça do Trabalho são corrigidos de forma diferente do determinado na legislação e que ela é interpretada de forma distinta pelos juízes de determinada região e de determinada corte?

A pergunta simples a ser feita é: a quem atende essa falsa questão?

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