Trava de 30% não se aplica a empresas que encerraram atividades, decide juiz federal
18 de agosto de 2017, 19h11
O limite de 30% ao ano para abatimento de prejuízo fiscal de impostos não se aplica a empresas que já encerraram suas atividades. Foi o que decidiu na quarta-feira (16/8) o juiz Tiago Bitencourt de David, substituto da 5ª Vara Federal Cível de São Paulo. Para o magistrado, o abatimento do prejuízo fiscal é um direito dos contribuintes, e não uma concessão da Fazenda aos cidadãos. E como negar o aproveitamento integral a empresas que não funcionam mais significa “solapar o direito” do contribuinte, a trava não pode se aplicar nesses casos.
“Sequer é outorgado ao Estado pelo cidadão o poder de fazer o que quiser, agindo ao seu bel-prazer”, escreveu o juiz. “E nem se diga que o interesse público justifica, pura e simplesmente, a negação do crédito, pois o interesse público é o móvel do bom funcionamento social como um todo, não se confundindo a busca do bem comum com o interesse fiscal e com a supressão de direitos dos contribuintes.”
Com a decisão, foi extinta a exigibilidade de R$ 209,6 milhões em Imposto de Renda e Contribuição Social sobre Lucro Líquido da empresa VBC Energia, comprada pela Camargo Corrêa em 2009 e extinta. A compradora queria abater o prejuízo registrado pela comprada dos impostos devidos, mas a Receita entendeu que o abatimento deveria ser distribuído ao longo dos anos, e não feito de uma vez.
A tese da Receita, discutida em autuação fiscal já levada à Delegacia Regional de Julgamento, é que a Lei 9.065/1995, nos artigos 15 e 16, impõe o limite de 30% ao ano para abatimento de prejuízo do IRPJ e da CSLL. É a chamada “trava de 30%, declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2013.
O Fisco se baseia em decisão de 2016 do Conselho Superior de Recursos Fiscais (CSRF), órgão máximo do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, que mudou o entendimento sobre a trava. A jurisprudência do Carf costumava ser a de que a trava de 30% era uma forma de prorrogar o aproveitamento do prejuízo fiscal, e não de impedi-lo. Portanto, empresas já fechadas não precisariam seguir esses limites.
Mas em 2016 o CSRF decidiu que, embora o Supremo não tenha entrado em detalhes sobre a declaração de constitucionalidade da trava de 30%, a declaração de constitucionalidade significa a aplicação ampla, inclusive para pessoas jurídicas que não estão mais em atividade.
Para o juiz Tiago de David, a discussão é polêmica, mas a Fazenda não tem razão. Em sua decisão de quarta, ele cita dois agravos de instrumento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região antagônicos em relação à trava para empresas extintas, mas afirma que o próprio STF, na discussão sobre a constitucionalidade da trava, disse que sua aplicação comportava gradações.
“Se, na prática, a restrição se impõe de modo tal que acaba por esvaziar o direito do contribuinte, então há a frustração de posição jurídica atribuída pelo Direito”, afirma o juiz. Segundo ele, o que a Receita pretende, com o argumento, é transformar as orientações generalistas do Supremo em regras aplicáveis a casos concretos.
David também afirma que, embora o CSRF tenha mudado o entendimento do Carf sobre a matéria, a decisão se deu por voto de qualidade. Ou seja, o colegiado empatou durante o julgamento e o presidente da sessão foi quem desempatou por meio do voto de qualidade, “o que obviamente beneficia o Fisco, por a controvérsia sempre é dirimida por servidor indicado pelo Estado”. É que os presidentes de turmas julgadoras do Carf são sempre representantes da Fazenda.
Clique aqui para ler a decisão.
Mandado de Segurança 0019775-53.2016.403.6100
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