Clamor social

"Prisão deve ser para quem comete crimes violentos e contra a administração"

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6 de agosto de 2017, 6h52

A prisão deve ser o destino de criminosos violentos, que representam risco a outras pessoas, e daqueles condenados por corrupção, uma vez que a população tem exigido a punição destes. A opinião é do desembargador Manoel de Oliveira Erhardt presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Diante da situação carcerária brasileira, afirma, as penas restritivas de direitos devem ser regra. No entanto, o clamor social pelo combate à corrupção faria com que os crimes contra a administração de maior gravidade sejam tratados com exceção.

Ehrardt está à frente do tribunal desde abril e já se deparou com dificuldades como o impedimento orçamentário para contratação de servidores (os aposentados não estão sendo repostos) e as instalações inapropriadas de duas subseções em Sergipe. O TRF-5 é responsável pela Justiça Federal em Pernambuco, Alagoas, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe.

Erhardt conta que o tribunal ainda se adapta às sessões das turmas ampliadas impostas pelo novo Código de Processo Civil. Alguns magistrados, explica, resistem aos julgamentos virtuais, onde os votos seriam enviados eletronicamente, pois prezam pelo julgamento presencial, com debates de ideias.

O presidente vê com bons olhos o atual protagonismo do Judiciário no Brasil. “O Judiciário passou a ser um fiel da balança nesses conflitos graves que o país enfrenta. Eu vejo essa participação de alguma maneira como uma prova da solidez que o poder Judiciário alcançou ao longo dos tempos”, explica.

Leia a entrevista:

ConJur – No início de 2017 tivemos vários problemas carcerários. O senhor acha que o juiz deve levar em consideração a superlotação antes de proferir a sentença?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Eu acho que se houver condições de aplicar penas restritivas de direitos, eu entendo que o juiz deve seguir essa opção. Agora é claro que há situações em que não é viável a aplicação das penas restritivas. Costumo dizer que diante da situação carcerária brasileira, a pena privativa de liberdade deve ser realmente destinada a pessoas que oferecem um risco à incolumidade dos outros, aqueles criminosos dos crimes violentos: estupro, latrocínio, esses crimes violentos. E também dos crimes contra a administração de maior gravidade, já que há todo um reclamo nacional para a punição desses crimes. Nos outros casos, eu acredito que se deve intensificar a aplicação das penas restritivas. É uma das formas de tentarmos reduzir esse encarceramento, que ao meu ver não é positivo, principalmente quando se trata de pessoas primárias, de pessoas que não cometeram crimes violentos, de pessoas que não atingiram gravemente esses interesses da administração pública. Não é viável que isso se realize simplesmente, porque é muito cruel para essas pessoas, elas vão enfrentar uma realidade muito hostil nos presídios e por outro lado nós sabemos que grande parte das organizações criminosas tomaram conta hoje dos nossos presídios.

ConJur – Em 2016 entrou em vigor o CPC/215. Como foi a adaptação do tribunal?
Manoel de Oliveira Erhardt –
O CPC/2015 trouxe sem dúvidas impactos relevantes na atuação do tribunal, um deles a questão das chamadas turmas ampliadas, esse é um problema que até agora estamos discutindo como realizar da melhor maneira possível. Essas turmas ampliadas, muitas vezes fazem com que sessões daqui do tribunal se prolonguem até altas horas da noite. Já terminaram sessões próximas da meia-noite.

ConJur – São feitas audiências de conciliação (também previstas no CPC/2015)? Estão dando certo?
Manoel de Oliveira Erhardt –
A conciliação tem sido realizada de uma forma mais intensa no primeiro grau. Nós temos as centrais de conciliação implantadas em cada seção judiciária. E até de uma forma que me deixou muito impressionado pela técnica adotada. Eu tive oportunidade de visitar algumas seções como o Rio Grande do Norte e lá eles implantaram a central de uma forma bem adequada aos objetivos, tem até sala para acolhimento de crianças, com brinquedos, quando as partes não têm com quem deixar os seus filhos.

ConJur – Qual o tema que mais entra para conciliação?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Foram muitos planos de financiamento habitacional nos últimos anos e, às vezes, compreender bem esses planos é difícil. Depois, quando se vai executar, tem que entender bem a sentença, o que foi determinado. Às vezes, criam uma série de polêmicas, que se não for por meio da conciliação, é difícil de resolver. A Caixa Econômica Federal está muito aberta a esta possibilidade. Aqui a entidade que mais participa das conciliações, a meu ver, é a Caixa.

ConJur – Qual é o plano de sua gestão?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Pretendemos fazer uma gestão de continuidade procurando concluir o que foi iniciado pelo desembargador Rogério Meneses Fialho e também buscarmos uma aproximação maior com a sociedade. Divulgar de uma forma mais intensa o trabalho da justiça federal e do TRF-5. Já fizemos palestras em clube de serviços, em associações e também no meio universitário, para que as pessoas tenham um conhecimento melhor sobre a atuação do Judiciário.

ConJur – Qual é a área mais deficitária do TRF-5?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Vivemos uma fase de muita contenção orçamentária. Nós temos algumas dificuldades em certas sessões judiciárias que não estão com sedes adequadas. Fui visitar duas cidades de Sergipe, Lagarto e Propriá, em que as sedes funcionam precariamente em prédios do INSS. De uma forma que é um pouco destoante das demais unidades da Justiça Federal. No entanto, nós não temos condições imediatas de resolver esses problemas em face das contenções orçamentárias pelas quais passamos.

Também estamos com dificuldade de reposição do quadro funcional, em razão das limitações orçamentárias. Não podemos nomear novos servidores, ainda que ocorram vagas. Só podemos nomear quando as vagas são decorrentes de exonerações. Porque não vão gerar despesas novas. No entanto, nós não podemos repor, por exemplo, funcionários que se aposentam.

Mas no geral, o tribunal vem funcionando bem, ele tem uma equipe técnica muito boa, e tudo isso tem facilitado a obtenção das metas que são fixadas não só pela administração, mas pelo Conselho da Justiça Federal. Em regra, o tribunal sempre cumpre essas metas. Inclusive, ao longo dos últimos anos, vem obtendo prêmios em razão do cumprimento de metas.

ConJur – E a primeira instância, como está de servidores? Também não está completando o quadro?
Manoel de Oliveira Erhardt –
A primeira instância também está na mesma situação de não poder admitir novos funcionários a não ser que tenham exonerações e a situação é ainda mais difícil do que a do tribunal. Houve uma expansão da Justiça Federal com a implantação de muitas varas no interior e isso não foi acompanhado de um aumento significativo no quadro funcional.

ConJur – Como está o funcionamento do Processo Judicial Eletrônico (PJe)?
Manoel de Oliveira Erhardt –
O PJe funciona 100% na entrada de novas ações. Nós temos algum resquício de ações antigas que ainda tramitam no meio físico. Mas hoje nós temos uma predominância dos processos no PJe.

ConJur – E na primeira instância?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Também, na primeira instância é a mesma coisa. Pode haver algumas áreas em que ele esteja em alguma fase, como a criminal, que está começando a ser implementado. Algumas já implantaram, outras estão iniciando. Há alguma coisa de processo físico na primeira instância na área criminal. Mas a predominância já é dos processos virtuais.

ConJur – Qual é o tema que tem mais demanda no TRF-5?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Questões previdenciárias continuam tramitando com muita intensidade, apesar dos Juizados Especiais. No entanto, nós recebemos muitas ações previdenciárias das comarcas da Justiça Estadual, por competência delegada. Também temos muitas questões relacionadas ao direito à moradia. Inclusive, essas questões relacionadas à moradia, em boa parte estão sendo solucionadas com acordos, há um estímulo a conciliação com a Caixa Econômica Federal.

ConJur – Sobre previdência, o STF negou a desaposentação. Isso teve impacto aqui no TRF-5?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Sim, porque o tribunal tinha majoritariamente acórdãos favoráveis à desaposentação. Alguns recursos estavam represados, suspensos, aguardando a decisão do STF. A vice-presidência, que é quem administra esses recursos, tem remetido esses processos para a chamada readequação.

ConJur – Aqui as turmas não são especializadas ainda, o senhor acredita que tenha esta necessidade?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Necessidade acredito que exista. Todavia, não há condições para se especializar, considerando o pequeno número de integrantes do tribunal. Não é possível fazer esta especialização em um tribunal que tem apenas 15 componentes, dos quais três ficam afastados de turmas por estarem na mesa diretora. Então, se tivéssemos um número maior de desembargadores, com certeza nós faríamos a especialização. Seria muito importante. Mas, no momento, eu não vejo condições de se fazer.

ConJur – Algum Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) já foi levado ao Pleno?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Sim. Entre agosto de 2016 e junho de 2017, a corte admitiu dois IRDRs. Um sobre incidência de fator previdenciário na aposentadoria de professores dos ensinos fundamental e médio, em agosto. E outro sobre a inclusão da Caixa Econômica Federal em processos que envolvem seguros de mútuo habitacional do SFH, em outubro.

No início de julho foi julgado o primeiro IRDR e fixada a tese de que o fator previdenciário incide na aposentadoria por tempo de contribuição diferenciada do professor, salvo em relação ao beneficiário que tenha adquirido o direito à aposentadoria antes da edição da Lei 9.876/99. Já em relação ao segundo tema, todos os processos sobre essa matéria continuam suspensos até a apreciação e julgamento no Pleno, que deve fixar tese jurídica em até um ano na data de admissão.

ConJur – O TRF-5 está julgando recursos de quais anos?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Eu acredito que depende muito de gabinete, isso varia muito de um gabinete para o outro. Eu acredito que haja certo número de gabinetes que estejam julgando recursos de 2016 e talvez um ou outro de 2015. Mas o número mais expressivo de recursos que vem sendo julgados são recursos recentes. Algumas vezes os processos são julgados aqui no tribunal e o STJ anula algum julgamento, mandando retornar. E aí é um processo de 2012/2013, mas já julgado há bastante tempo, que em razão dessa decisão do STJ retornou para o nosso fluxo. Normalmente é o que acontece com esses processos mais antigos. Mas de um modo geral, os gabinetes tem processos de anos mais recentes.

ConJur – O TRF-5 faz sessões virtuais?
Manoel de Oliveira Erhardt –
Nós não adotamos ainda o sistema de sessões virtuais. Embora, com o PJe haja a possibilidade do voto antecipado. Estávamos conversando dessa possibilidade da sessão virtual. Alguns colegas acham bom, mas outros não. Porque cada vez mais precisamos nos aproximar nos julgamentos frente a frente. O que já temos é o sistema de sustentação oral por videoconferência, os advogados podem solicitar a participação no sistema.

ConJur – E qual tem sido o papel do Judiciário frente a essa crise econômica/política que o país passa?
Manoel de Oliveira Erhardt –
O Judiciário, como nós sabemos, ele assumiu um protagonismo que é inédito na história do país. Ele passou a ser um fiel da balança nesses conflitos graves que o país enfrenta. Eu vejo essa participação de alguma maneira como uma prova da solidez que o poder Judiciário alcançou ao longo dos tempos. É uma instituição muito bem estruturada, se nós formos examinar a Constituição Federal brasileira, é sem dúvida um das mais bem estruturadas. Eu acho que nesse ponto o Brasil se destaca pela maneira como organizou seu Judiciário, como deu independência ao Judiciário. E essa atuação vem denotando esse grau de amadurecimento, de independência que o Judiciário brasileiro alcançou. Então, realmente parece que de alguma forma a população brasileira passou a depositar grande parte de sua confiança no Judiciário e isso é positivo.

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