Contrabando legislativo

TJ-SP invalida regra que permitia ônibus sem cobrador no município de São Paulo

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2 de junho de 2016, 10h49

O Poder Legislativo não pode se aproveitar de projetos de lei para incluir regras estranhas ao assunto principal da proposta. Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou inconstitucional um dispositivo que liberava a circulação de ônibus sem cobradores na capital paulista. Em julgamento nesta quarta-feira (1º/6), os desembargadores derrubaram a validade do artigo 16 da Lei 16.097/2014.

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Norma que permitia acúmulo de função de motorista e cobrador já estava suspensa desde 2015 por decisão liminar.

O problema é que o dispositivo foi incluído num texto sobre parcelamento de dívidas de IPTU e ISS, para quem tinha débitos com o Fisco municipal até dezembro de 2013. O Programa de Parcelamento Incentivado foi apresentado pela prefeitura, mas o substitutivo aprovado na Câmara Municipal colocou como facultativa a presença de um funcionário nos ônibus, além do motorista.

A norma já estava suspensa desde 2015 por decisão liminar, após ação movida pelo sindicato que representa trabalhadores do setor de transporte. O procurador-geral do município, Robinson Sakiyama Barreirinhas, defendeu a validade do texto integral. Em sustentação oral, disse que exigir cobradores em ônibus onera o Poder Público em mais de R$ 1 bilhão por ano.

Já o desembargador Péricles Piza, relator do caso, concluiu que a inclusão da regra feriu competência privativa do Executivo e constituiu uma “grave ofensa” ao tratar de tema sem relação com questões fiscais, e sem participação popular na discussão da regra.

O procurador-geral do município também afirmou que a obrigatoriedade da categoria não faria sentido, já que 90% dos usuários de ônibus usam bilhete eletrônico — seria o mesmo que manter um chapeleiro no Tribunal de Justiça, comparou.

Para o presidente do tribunal, Paulo Dimas Mascaretti, a justificativa é equivocada porque ignora os 10% dos usuários que ainda usam dinheiro para as passagens. A decisão foi unânime, e o acórdão ainda não foi publicado.

Discussão no STF
O prefeito Fernando Haddad (PT) chegou a levar o caso ao Supremo Tribunal Federal, no ano passado, tentando derrubar a liminar em vigor até então. Mas o ministro Gilmar Mendes, relator, concluiu que o julgamento deveria ser feito pelo tribunal de origem, porque a decisão questionada não representava pronunciamento definitivo sobre a controvérsia.

Em 2015, o STF concluiu que o “contrabando legislativo” — os chamados jabutis — em medidas provisórias não representa mera inobservância de forma, mas um procedimento antidemocrático, pois retira do debate legislativo a discussão sobre normas que irão regular a vida em sociedade (ADI 5.127). 

Vereadores da capital paulista já se articulavam para restabelecer a obrigatoriedade dos cobradores, com o Projeto de Lei 25/2015, aprovado em primeira votação em setembro.

Processo 2056179-95.2015.8.26.0000

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