Mudança de modelo

"Supremo Tribunal Federal deveria voltar a ter discussões prévias"

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13 de setembro de 2015, 6h52

Spacca
O Brasil tem a suprema corte mais transparente do mundo. Todas as sessões do Plenário são transmitidas ao vivo pela TV Justiça e depois ficam disponíveis na internet, no YouTube. Caso se queira saltar a discussão de determinado caso e passar diretamente à conclusão, todos os acórdãos, decisões monocráticas e liminares ficam publicadas no site do tribunal.

Portanto, não é preciso ser um grande estudioso das sessões do Supremo para perceber que a conclusão de um caso é algo cada vez menos frequente no tribunal. Há quem diga que isso acontece porque os votos estão cada vez mais extensos. Também há quem diga que é consequência do aumento da demanda à corte e da complexidade dos temas que são postos em debate.

O fato é que as discussões em Plenário são sempre longas e tendem à polêmica. E o resultado são acórdãos que representam o conjunto de 11 decisões, já que cada ministro argumenta da maneira que acha mais adequada.

Para o professor de Direito André Rufino do Vale, a solução para esse impasse pode estar em discussões prévias ao debate em Plenário. Para ele, o “elemento surpresa” de cada voto leva ao alongamento dos debates, já que os ministros só vão conhecer os posicionamentos dos colegas quando veem o voto no Pleno.

Em sua tese de doutorado intitulada Argumentação Constitucional: um estudo sobre a deliberação nos tribunais constitucionais, Rufino discute o problema de forma bastante abrangente. Para escrever o trabalho, visitou cortes constitucionais de outros países, como Espanha e México, e comparou as práticas de deliberação desses tribunais com o Supremo Tribunal Federal brasileiro.

A tese foi aprovada em fevereiro deste ano na Universidade de Alicante, na Espanha, em convênio com a Universidade de Brasília (UnB), e teve orientação do professor espanhol Manuel Atienza Rodríguez. Em breve, o texto será publicado em forma de livro pela editora Marcial Pons.

Rufino afirma, por exemplo, que não se pode simplesmente creditar à transparência do STF a desfuncionalidade de seu Plenário. “A publicidade já está plasmada na Constituição e faz parte da nossa cultura. É um elemento de história político-institucional que não vai se aperfeiçoar abrindo as sessões secretas ou fechando as sessões públicas. Não é uma questão de tudo ou nada”, afirma, em entrevista à revista Consultor Jurídico. Para ele, o problema é o modelo de discussão brasileiro, chamado seriatim, ou de “texto composto”.

É esse modelo que permite que os acórdãos sejam compostos com 11 votos confluentes apenas na conclusão, mas com argumentações completamente diferentes.

Uma das soluções postas por Rufino é que se volte à prática das discussões prévias não transmitidas pela TV, ideia já rejeitada por alguns ministros da composição atual do Supremo. Outra ideia é que, depois do debate, os ministros elaborem uma ementa com a qual todos concordem com a redação. “Talvez a ementa tivesse que ser um texto um pouco mais impessoal, redigido a várias mãos, via plenário virtual ou discussão no próprio Plenário, pelo menos para casos mais complexos.”

Leia a entrevista:

ConJur — O senhor sustenta em sua tese que é um problema o fato de os ministros do Supremo brasileiro só conhecerem os posicionamentos dos colegas quando as discussões vão ao Plenário. A solução seria alguma forma de deliberação prévia?
André Rufino do Vale —
Sim, isso é fundamental. Umas das conclusões do trabalho foi que essa inexistência de deliberação prévia no Supremo, como existe em praticamente todas as cortes constitucionais que eu investiguei, leva a um problema e a um déficit de deliberação no tribunal. O “elemento surpresa” do voto do relator e dos demais votos causa, inclusive, um incentivo aos pedidos de vista, na medida em que acabam sendo um reflexo da falta de discussão prévia, onde poderiam ser eliminadas muitas dúvidas.

ConJur — Em cortes internacionais, o comum é ter essa deliberação prévia?
André Rufino do Vale —
Nas outras cortes, essa fase de discussão prévia é a principal fase da deliberação. Certas questões mais complexas passam meses, em alguns casos até anos, sendo discutidas internamente, entre os diversos magistrados e seus gabinetes. E no Supremo brasileiro os votos só são revelados em Plenário, ao vivo e a cores. Ou seja, a inexistência de uma deliberação prévia é, hoje, um problema para a deliberação que é praticada no tribunal.

ConJur — Mas porque isso é um problema?
André Rufino do Vale —
O relator, em vez de ser um condutor da deliberação, fazendo seu voto circular e tenta convencer os demais ministros a seguir uma linha coerente de fundamentação, na verdade, é mais um voto que é revelado junto com os demais, em Plenário. E aí, lá na frente, isso resulta num acórdão com múltiplos votos, cada um com suas próprias fundamentações, que inclusive divergem entre si. Convergem no resultado, mas divergem na fundamentação. Isso é um problema para a coerência das decisões do tribunal.

ConJur — O Supremo brasileiro, no passado, adotou essa prática de  deliberações prévias, certo?
André Rufino do Vale —
Existiam as sessões do conselho, antigamente. Foi uma prática anterior à Constituição de 1988, e isso era considerado fundamental por alguns ministros como elemento de ajuste ou de preparação prévia da deliberação que ia acontecer, depois, em Plenário, em regime de publicidade. Mas isso caiu em desuso e hoje não se pratica mais.

ConJur — O ministro Marco Aurélio costuma dizer que isso transformava as sessões do Pleno em teatro.
André Rufino do Vale —
Essa é a crítica que se faz, por exemplo, no México. Percebi quando estive lá. Eles têm a transmissão das sessões deliberativas pela televisão, o que vem muito da experiência brasileira, e, portanto, eles também praticam essa ampla publicidade que já conhecemos. Creio que sejam os dois únicos países. Mas a diferença é que a corte mexicana faz uma deliberação prévia secreta, fechada, restrita aos ministros. A crítica que se faz lá é justamente a de que o plenário acaba se transformando num mero teatro.

ConJur — Seria possível voltar a esse modelo aqui?
André Rufino do Vale —
Reunião prévia secreta não aconteceria, porque já temos essa cultura da deliberação pública em Plenário, e isso está consolidado. Se fosse adotada a deliberação prévia, em alguma medida não se romperia com essa prática já consolidada da deliberação ao vivo e a cores. O que haveria seria uma possibilidade muito grande de eliminar certas discussões desnecessárias e muitas vezes indevidas no Plenário.

ConJur — Indevidas em que sentido?
André Rufino do Vale —
Certas discussões acaloradas, certas questões de ordem que são levantadas para resolver coisas que já poderiam estar solucionadas antes. Por exemplo, no julgamento do mensalão, fez-se uma sessão administrativa prévia para se discutir coisas mais formais, como horário de julgamento, sustentação oral, elementos mais procedimentais da deliberação que podem ser resolvidos anteriormente. Isso foi ótimo na época, porque evitou uma discussão que inevitavelmente seria feita no Plenário, gastando tempo de julgamento.

ConJur — Mas e a questão da publicidade dos julgamentos? Essas sessões secretas esbarram nisso, não esbarram?
André Rufino do Vale —
Claro, tem a exigência constitucional da publicidade. Mas a deliberação prévia não precisaria ser secreta. Poderia se fazer, por exemplo, uma circulação de textos e de discussões prévias via plenário virtual, poderia haver toda uma procedimentalização disso, o que traria um ganho fenomenal para a deliberação do tribunal. Vejo nesse sentido – nas outras cortes isso é o elemento fundamental de deliberação – que aqui se poderia criar essa cultura sem acabar com a nossa prática de publicidade dos julgamentos. Ou seja, uma coisa não elimina a outra.

ConJur — Quando existiam as deliberações de conselho no Supremo, as discussões no Plenário tinham menos legitimidade?
André Rufino do Vale —
Não. Portanto, a própria prática antiga dos conselhos é uma prova de que o Plenário não perde sua força e sua legitimidade. A discussão continua sendo dentro dessa nossa cultura de publicidade, genuína, ao vivo e a cores. As sessões de conselho eram consideradas importantes por muitos ministros, porque eram utilizadas para resolver questões que não precisariam ser discutidas em Plenário, poupoando o tempo do julgamento – e o tempo do Plenário talvez seja hoje a coisa mais preciosa que existe no Supremo.

ConJur — Só que as reuniões de conselho eram secretas.
André Rufino do Vale —
Talvez hoje fosse muito difícil o retorno dessas sessões justamente por causa disso. A Constituição de 1988 veio para implantar ampla publicidade e isso deve ser respeitado. O ministro Peluso tentou fazer reuniões prévias fechadas e isso não foi para frente, porque alguns ministros foram contra. Para retornar com essas sessões, precisaria da concordância de todos os ministros, até para dar legitimidade ao procedimento. Como existem ministros nessa composição e, muito provavelmente, sempre vai haver ministros que não vão concordar com essas reuniões fechadas, é muito difícil dizer que elas poderiam retornar. Quando falo em deliberação prévia hoje, é muito mais no sentido da circulação de votos, deliberação em plenário virtual e melhor comunicação entre gabinetes.

ConJur — Muito se fala sobre o alongamento dos votos dos ministros. O ministro Moreira Alves acredita que isso se deve à TV Justiça. O televisionamento tem culpa nessa discussão?
André Rufino do Vale —
O problema é que a discussão em torno da TV Justiça é enganosa. Tende a camuflar questões mais fundamentais, que têm que ser resolvidas antes do que seria a TV Justiça.

ConJur — Em que sentido?
André Rufino do Vale —
A TV Justiça é apenas mais um elemento de publicidade. Fazer edições das transmissões das sessões, acabar com a transmissão ao vivo ou restringir o funcionamento da TV, na verdade, são formas de eliminar uma face da publicidade, mas ela continua. Ou seja, a influência que o espectador presente causa nos votos ou nas sustentações dos advogados continua sendo a mesma. Se há algum tipo de influência, ela não está na transmissão pela TV, mas na própria publicidade.

ConJur — O problema é a publicidade em si, então?
André Rufino do Vale —
A publicidade já está plasmada na Constituição e faz parte da nossa cultura. É um elemento de história político-institucional que não vai se aperfeiçoar abrindo as sessões secretas ou fechando as sessões públicas. Não é uma questão de tudo ou nada. Nem no sistema europeu, em que se fazem críticas a essas reuniões fechadas, aos problemas que elas geram e principalmente ao vazamento de informações para a imprensa, a solução passa por, simplesmente, dar publicidade. O problema está muito mais vinculado ao nosso modelo de decisão, chamado de modelo seriatim.

ConJur — Por quê?
André Rufino do Vale —
Ele permite a cada ministro proclamar seu voto com sua própria fundamentação. E essa fundamentação é decorrente de uma deliberação intragabinete, e não intergabinetes. Ou seja, o processo de deliberação anterior ao Plenário, hoje, é interno aos gabinetes de cada ministro, e o resultado é que a decisão final é a soma dos resultados de várias decisões, que são publicadas na íntegra. Então qual é o elemento de unidade que se tem de fundamentação? Praticamente nenhum.

ConJur — Essa “unidade de fundamentação” não sacrificaria a argumentação?
 André Rufino do Vale —
Existe essa crítica também. E esse é um dado importante. O modelo seriatim inegavelmente tem suas vantagens, porque consegue fazer transparecer melhor a pluralidade da argumentação. Teóricos importantes da argumentação jurídica, como o escocês Neil MacCormick – e no contexto britânico o modelo é esse, seriatim – defendiam essa forma. Você consegue ver melhor como cada magistrado enxerga o problema que está sendo resolvido e os argumentos que estão enfrentando aquela questão jurídica.

ConJur — Então esse modelo traz mais transparência?
André Rufino do Vale —
Dá mais transparência e mais visibilidade às diversas argumentações. Demonstra, também, que, para cada questão jurídica, pode haver múltiplas interpretações. Isso é um elemento importante que muitas vezes é ressaltado pelo ministro Marco Aurélio para defender o modelo: é possível deixar transparecer múltiplas visões que podem existir dentro de uma mesma corte. Só que para uma cultura de precedentes, de estabilização, integridade e coerência, como vem trazendo o novo Código de Processo Civil, isso tem um lado problemático: fica difícil identificar com precisão o que é ratio decidendi, o que é a opinião dissidente, divergente ou concorrente, e, enfim o que é maioria e minoria em relação a determinado argumento. Cultivamos uma cultura individualista de deliberação, em prejuízo da colegialidade e da unidade institucional que devem permear o processo decisório em um tribunal.

ConJur — Tem como conciliar transparência e coerência?
André Rufino do Vale —
Uma forma de unir as vantagens de ambos os modelos – seriatim e per curiam – seria manter a pluralidade de votos e argumentações, mas trazendo um elemento de unidade. Esse elemento poderia ser a ementa, que hoje fica a cargo do relator e muitas vezes reflete apenas o fundamento do voto dele. Talvez a ementa tivesse que ser um texto um pouco mais impessoal, redigido a várias mãos, via plenário virtual ou discussão no próprio Plenário. Pelo menos para casos mais complexos, de maior impacto, como nas ações de controle de constitucionalidade, nos casos com repercussão geral e na edição de súmulas vinculantes. O que acontece hoje é que o tribunal fala por meio de 11 ministros, e não como um tribunal colegiado, e isso gera um problema na própria cultura de precedentes.

ConJur — A ementa deveria ser elaborada pelos 11 ministros, para depois sair os votos que levaram a ela, como um histórico da discussão.
André Rufino do Vale —
Isso. Mas existe outro problema, que é a transcrição literal das falas, dos debates. Então muitas vezes tem o debate e o voto no mesmo acórdão.

ConJur — Por que é um problema?
André Rufino do Vale —
Porque hoje existe a prerrogativa de os ministros excluírem certas falas. E aí você tem um debate capenga, porque um ministro exclui a fala e o debate fica sem aquela declaração, o que torna sem significado o restante da discussão. Numa época em que existe a TV Justiça, fornecendo os elementos que permitem ao cidadão tomar conhecimento da discussão ao vivo, por que trazer para a decisão, para o texto final, a literalidade do debate que aconteceu? Bastaria os ministros juntarem seus votos. Se o voto foi oral, que o gabinete forneça o texto ou algum elemento que represente aquele voto.

ConJur – A prática do Supremo é a do modelo de diversas argumentações para o mesmo resultado. O novo CPC aponta para uma valorização do precedente. O que fazer para se chegar ao equiíbrio?
André Rufino –
Esses problemas de prática deliberativa podem ser resolvidos de duas maneiras: primeiro, a criação de práticas internas de deliberação, como reuniões internas, plenário virtual, regras de convívio interno, circulação de votos etc. E a outra seria a reformas do Regimento Interno, com critérios para se redigir ementa, modificações nos procedimentos de votação, questões de ordem etc. Há uma série de coisas que podem ser feitas sem mudança na legislação processual.

ConJur – No Supremo, cada mimistro lê o seu voto independente do que diz o relator. Só há referência depois da argumentação, com um “acompanho o relator” ou “acompanho a divergência”. Isso seria efeito da ampla publicidade?
André Rufino do Vale —
Isso até pode ter sido incentivado pela publicidade, mas não é o elemento fundamental. Existem pesquisas mostrando que o advento da TV Justiça teria influído no número de páginas dos votos. Eu fui assessor de gabinete no Supremo por oito anos e não creio que tenha alguma coisa a ver com a TV. Isso tem  mais a ver com coisas práticas e simples, como a facilidade de pesquisa, a internet e as tecnologias em geral, que permitem acesso a uma gama de informações muito maior em curto espaço de tempo. A facilidade que você tem, hoje, de construir um voto bem fundamentado e rapidamente é muito maior do que há 15 anos.

ConJur — Mas a TV ajudou.
André Rufino do Vale —
O fato é que a TV Justiça veio numa época em que essas tecnologias estavam se desenvolvendo também, o que pode levar a essa conclusão. Mas às vezes são coisas simples, como o serviço que a biblioteca presta aos gabinetes. Antigamente você tinha que ir fazer pesquisa presencial na biblioteca, e isso tomava tempo. Hoje, você manda um e-mail e 15 ou 20 minutos depois os textos escaneados estão no seu e-mail. Há também aqueles bancos de dados de doutrina na internet, bancos internacionais, quando você precisa do direito comparado. Por exemplo, em casos como o das células-tronco ou o do  aborto de feto anencéfalo, que precisaram de elementos do direito comparado, foi relativamente rápido conseguir as informações. Não acredito que os ministro hoje construam votos mais elaborados porque eles são lidos perante a TV Justiça. Acredito que seja porque as equipes dos gabinetes têm mais facilidade de pesquisa do que há 15 anos.

ConJur — Isso também tem a ver com aqueles votos em que o ministro vai acompanhar o relator, mas faz todo um preâmbulo antes de declarar o voto?
André Rufino —
Claro que a TV acaba trazendo alguma influência nesse aspecto. Mas isso pode ter algum impacto no tempo de julgamento, não exatamente no conteúdo dos votos. A extensão dos votos tem a ver mais com a facilidade da pesquisa, com a preparação das equipes, e também, veja, com o fato de que cada gabinete produz sua decisão sem saber o que os demais ministros estão fazendo. Então cada um tende a analisar a questão de forma exaustiva no interior do gabinete. Se houvesse maior comunicação prévia, talvez se pudesse descobrir que dois ministros têm a mesma opinião. Então, por que vamos fazer dois votos com a fundamentação idêntica se podemos fazer uma deliberação prévia e entrar em algum consenso em torno do que vai ser a fundamentação da decisão? Quando a informação circula melhor, essa dispersão de votos é evitada.

ConJur — A tese também traz um decálogo de sugestões.
André Rufino do Vale —
Esse decálogo vale como uma série de diretrizes de aperfeiçoamento institucional da capacidade deliberativa dos tribunais que foram especialmente investigados, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Constitucional da Espanha. São diretrizes que surgiram de elementos que foram colhidos na pesquisa empírica a partir de um tratamento teórico. Falam, por exemplo, da questão da publicidade ou do segredo das deliberações, sobre como não se vai resolver o problema fechando as sessões públicas (no Brasil) ou acabando com o sigilo de sessões fechadas (em outros países). Ou de práticas internas de deliberação, que promovam algum ganho para o resultado final do julgamento. Algumas são especialmente relevantes como diretrizes de aperfeiçoamento da prática deliberativa do STF, como as que dizem respeito à autonomia do processo deliberativo, à colegialidade, cooperação, unidade institucional, amplitude informativa e cognitiva, etc.

ConJur — Mas são sugestões de dizer que o acórdão tem de seguir um modelo já pronto? Tem a ver com isso?
André Rufino do Vale —
Em certo sentido, sim. Por exemplo, no caso do nosso STF, o modelo seriatim tem que ser aperfeiçoado para que o texto final possa ser utilizado com uma fundamentação consistente e coerente da decisão. Ou daquela questão da ementa, que comentei. O importante é que a tese acaba abrindo um amplo leque de vias e de possibilidades para futuras pesquisas nesse campo das práticas de argumentação nos tribunais constitucionais.

ConJur — Dá para dizer que o Supremo brasileiro é mais ou menos conservador que o Tribunal Constitucional espanhol?
André Rufino do Vale —
Não dá pra dizer que um delibera melhor que o outro. O importante a dizer é que cada corte segue seus elementos históricos institucionais e precisa de aperfeiçoamentos. Na Espanha, talvez o regime seja muito fechado, e os próprios magistrados reconhecem isso. Lá, por exemplo, não se pratica o amicus curiae, então os magistrados só têm acesso aos argumentos levados pelas partes pré-estabelecidas.

ConJur — Pode-se dizer que lá é fechado demais e aqui é aberto demais?
André Rufino do Vale —
Ou aberto demais sem comunicação interna. O problema grave, também na Espanha, é o vazamento de informações, as denominadas “filtraciones”. Como o modelo é muito fechado e a imprensa é ávida por informações, às vezes consegue elementos dos julgamentos que, de tão fidedignos, não poderiam ser obtidos sequer em ambientes de deliberação pública. Isso poderia ser resolvido talvez com uma assessoria de comunicação, e com uma prática de relações institucionais do tribunal com o público externo, com os demais poderes e, principalmente, com a imprensa. E isso eles não têm feito a contento por lá, como os próprios magistrados admitem. Eles também têm seus próprios problemas de prática deliberativa.

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