Política de Ordem

"OAB-RJ tem que deixar de ser entidade ideológica", diz Leandro Mello Frota

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10 de novembro de 2015, 20h50

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O advogado especializado em Direito Eleitoral Leandro Mello Frota disputa neste ano sua segunda eleição. Em 2012, ele foi candidato ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil — como suplente, pela chapa de oposição à OAB-RJ. “Não sou político, não tenho tato político, nem sou filiado a partido político”, afirma.

Leandro Mello Frota é mestrando em Ciência Política e Relações Internacionais no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Também é diretor jurídico do Instituto Liberal — que é presidido pelo ex-colunista da Veja Rodrigo Constantino — , membro do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB) e do Fórum permanente de Direito Constitucional da Escola de Magistratura do estado do RJ (Emerj), além de Conselheiro Jurídico da Associação Comercial do estado do RJ e sócio do Gomes e Mello Frota Advogados.

Em relação a sua chapa, Leandro afirma que não possui apoio de nenhum presidente de subseção porque, no RJ, há uma “cultura” que condiciona o apoio da subseção  ao candidato da situação. “Infelizmente, aqui, quando o advogado preside uma subseção, ele acaba acompanhando o atual presidente da seccional”, explica.

Porém, o candidato afirma não se preocupar, pois considera que sua chapa é “extremamente plural” e representará as 60 subseções. Além disso, Frota conta que, durante o período eleitoral, as outras chapas de oposição conversam entre si para possíveis alianças.

Sobre a atual gestão, o presidenciável aponta como os dois maiores problemas a falta de transparência e a presença de ideologia partidária dentro da entidade. Segundo ele, se a OAB briga por uma melhor prestação de contas pelos tribunais, ela deve dar o exemplo. Em relação à ideologia, Leandro diz que “a OAB-RJ tem que deixar de ser uma entidade ideológica. O problema dela, hoje, é que seu dirigente tem uma determinada ideologia”.

Apesar de ligar diretamente a figura do atual presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, ao PT,  Mello Frota ressalta que sua crítica sobre a inserção de ideologias políticas na OAB-RJ é direcionada a todos os partidos. “Quando falo do PT no Rio de Janeiro, é porque há dados concretos. No Rio de Janeiro, o PT domina a máquina. Tanto é que tem o conselheiro federal que é deputado federal”, diz, fazendo referência a Wadih Damous (PT-RJ).

Leia a entrevista:

ConJur — Quais são as propostas da sua chapa?
Leandro Mello Frota —
Uma das minhas bandeiras é o fim da reeleição na OAB. No conselho estadual, todo mundo pode se reeleger mais de uma vez, não há impedimento. Acredito que a OAB não pode ser emprego. Não pode ter carreira dentro da Ordem. Outro ponto que buscaremos é a eleição direta para o cargo de presidente do Conselho Federal da OAB. Não dá para ser da forma que é hoje, pois, caso as coisas aconteçam da maneira como o conselho prevê, nós já temos ideia de quem vai ser o próximo presidente. Acaba sendo um jogo de cartas marcadas e a OAB, que é uma entidade que luta pela democracia, que esteve em todos os momentos históricos importantes, não pode virar uma entidade antidemocrática. Outra proposta que tenho é reduzir drasticamente a anuidade cobrada pela OAB.

ConJur — Qual seria o valor ideal da anuidade da OAB-RJ?
Leandro Mello Frota —
Não sei responder qual seria o valor ideal para uma anuidade. Não quero fazer como as oposições de antigamente que chutavam um valor para depois chegar ao poder descumprir e falar que não sabia que o buraco era mais embaixo. Mas eu acredito que dá para realmente reduzir a anuidade da Ordem se verificarmos como funciona hoje a OAB, como lidamos aqui no Rio de Janeiro. O Tribunal de Justiça nosso é eletrônico, na sua grande totalidade, está ainda avançando para o interior, mas aqui na capital varas cíveis, fazendárias, e é tudo eletrônico. A OAB luta por isso, sempre lutou por isso, e o advogado aqui paga para ter o seu pin, só que a OAB não é eletrônica.

Então, digamos, se eu tirar uma certidão, tenho que vir numa OAB. Sou sortudo, pois meu escritório é do lado da nossa sede, mas imagina o colega que mora bem longe, vai ter que procurar uma OAB, eles vão ter que imprimir o boleto, ele vai ao banco ou paga pelo celular, volta para a OAB, entrega, pega esse papel, manda para o presidente ou para o diretor responsável pela assinatura para constar e depois ir buscar. É um tempo que se perde… A OAB é altamente burocrática e, se cortarmos a burocracia, deixarmos uma OAB toda virtual, pelo menos para certidões, processos e processos éticos, com certeza conseguiremos reduzir a anuidade.

Não precisaremos de tanta gente, de tanto material. Hoje em dia é tudo em nuvem. Sou sócio de escritório e, quando passou a ser tudo virtual, reduzi pasta, papel, impressora, luz. Hoje em dia o cliente me manda via Dropbox, ou manda e-mail. Se consegui na minha pequena realidade, imagina uma entidade como a OAB? Também pretendemos ampliar a prestação de contas feita pela OAB. O que é feito hoje não é o ideal, já que não há nenhum órgão que verifique, de fato, se a prestação é real ou não.

ConJur — Há algum órgão que o senhor prefira para fazer essa verificação?
Leandro Mello Frota —
Não tenho nenhum órgão em mente, mas acredito que a Ordem não possa deixar de ser transparente, pois, já que ela briga pela transparência cada vez maior nos tribunais, tem que dar o grande exemplo.

ConJur — O senhor concorda com o projeto de lei que busca essa a fiscalização externa pelo Tribunal de Contas da União (TCU)?
Leandro Mello Frota —
Não sei se o TCU seria o melhor órgão para fazer isso. Porém, ainda não parei para verificar qual órgão se enquadraria melhor. Primeiro, nós temos que tentar entender o que é a OAB porque ela é uma entidade sui generis, cabe em tudo. Então, realmente, tinha que ter um debate sobre esse tema. Se vai ser o TCU, se será outro órgão, não sei. O que sei é que ela não pode ficar da forma que está, sem que a sociedade e os advogados saibam para onde vão os gastos pagos com nossa anuidade.

ConJur — Qual o lugar que a OAB deveria se situar, tanto na fiscalização externa quanto no campo de institucional?
Leandro Mello Frota —
A OAB-RJ tem que deixar de ser uma entidade ideológica. O problema dela, hoje, é que seu dirigente tem uma determinada ideologia. Não tenho nada contra, eu sou liberal, então cada um professa a fé e a ideologia que quiser, mas a OAB não pode, em hipótese nenhuma, ter uma ideologia, ela tem que ser uma entidade que está ao lado dos advogados. Infelizmente, tanto no plano federal quanto aqui no Rio de Janeiro, a OAB tem deixado a desejar. Por exemplo, na reforma política, a OAB colocou pequenas mudanças do PT e de alguns movimentos sociais. Nada contra o PT. Poderia ser qualquer outro partido, o PSDB, por exemplo, mas ela deveria ter ouvido a advocacia e não meia dúzia de dirigentes.

ConJur — Suas críticas a essa inserção de ideologia partidária é aberta a todos os partidos?
Leandro Mello Frota —
Sim, a todos. Quando falo do PT no Rio de Janeiro é porque há dados concretos. No Rio de Janeiro, o PT domina a máquina. Tanto é que tem o conselheiro federal que é deputado federal. A OAB tem que ser independente. Os tribunais entendem que o mandato é do partido, isso em caso de deputado federal, estadual e vereador. Se o mandato é do partido, como é que, por exemplo, neste caso concreto, o conselheiro federal vai formular algum projeto que contrarie o interesse do partido dele? Se ele faz isso e o mandato é do partido, ele pode ser expulso do partido e perder o mandato. Se ele pode sofrer essa represália, ele deixa de ser independente.

ConJur — O senhor é favorável a um advogado se desfiliar da OAB enquanto exercer cargo público?
Leandro Mello Frota —
Sou. Se atua na Ordem como conselheiro estadual, federal, suplente, e for exercer algum mandato ele deverá sair do cargo dele. Se for suplente e estiver exercendo temporariamente o mandato, pode até pedir licença, porque é uma suplência. Imagina, abre mão hoje do cargo na Ordem, chega depois de amanhã e ele perde o mandato. Mas ele não pode exercer paralelamente duas funções, de OAB e de um mandato, seja ele de qualquer partido. Agora, ganhou uma eleição é obrigado a sair da OAB, a OAB não pode servir de trampolim para interesses partidários de ninguém, qualquer partido.

ConJur — O que achou das declarações do deputado Eduardo Cunha, que classificou a OAB de cartel e criticou o exame da Ordem. Também gostaria de saber sua opinião sobre a resposta da OAB.
Leandro Mello Frota —
Eu não lembro da resposta da OAB. Primeiramente, eu sou altamente a favor do exame da Ordem.  Acredito que o presidente da Câmara tenha sido um pouco infeliz da forma que ele falou, inclusive ofendendo todos nós advogados. E aí, assim, apesar de eu não me lembrar direito o que o nosso presidente falou, mas creio que se foi nessa linha, certamente concordo com ele. O presidente da Câmara ofendeu a gente, todos os advogados com a frase dele, ali não é um cartel, mas tem que ser muito mais transparente. Mas, está longe de ser um cartel. E ele é contra o exame da Ordem e foi besteira, questão política dele, eu sou extremamente a favor. Sempre fui a favor do exame da Ordem.

ConJur — O senhor faria alguma alteração no Exame da OAB?
Leandro Mello Frota —
O exame da Ordem, nos moldes de hoje, é como uma autoescola, não aprende a dirigir, aprende a passar no exame, infelizmente. Infelizmente, o nosso exame da Ordem não prepara, ele só separa, e tem que ser assim, já que a OAB não tem feito nada, não tem usado o seu poder político e o seu peso institucional para ir contra essas aberturas de cursos jurídicos pelo país. Cursos fracos, cursos sem metodologia nenhuma, e que colocam uma horda de bacharéis que muitas vezes não tem culpa, não puderem cursar em universidades sérias e acabaram tendo que cursar onde deu, infelizmente. O Exame tem mudar, mas sou favorável a ele.

ConJur — O que o senhor acha das regras para a propaganda eleitoral destas eleições?
Leandro Mello Frota —
Olha, as novas regras são extremamente favoráveis para quem está no poder. Estão inaugurando tudo, novas sedes, e fazendo cursos jurídicos, apresentando palestras já que agora, no dia 11 foi o nosso dia, então, as OABs inteiras do Brasil aproveitaram para uma série de eventos, para ele, para essa pessoa, para o presidente ou para o candidato do presidente é muito mais fácil, é uma campanha muito mais tranquila. Eu também achei bem interessante, porque ela, pelo que vi, diminui os desgastes de campanha. Elas eram muito longas e extremamente cansativas, o que tem que fazer é pensar numa forma interessante de alcançar os nossos colegas, que aqui no Rio são cento e cinquenta mil, é uma campanha bem grande, são sessenta subseções, mas para quem é oposição, e de fato oposição tradicional, as regras realmente ajudam a sepultar essas candidaturas. Quem tem uma candidatura nova, com conhecedores de novas mídias, e que tenha militância jurídica de fato, atrapalha um pouco, mas nada que não possa correr atrás um pouquinho. Acho que é mais sola de sapato e gastar mais fala.

ConJur — O senhor tem alguma política específica para a advogada?
Leandro Mello Frota —
Geralmente os órgãos e as entidades tratam as mulheres como números. A questão não é mulher ou homem, o que tem que ter são pessoas preparadas e que queiram de fato mudar a advocacia, pode ser mulher, pode ser homem, pode ser jacaré, pode ser o que for. Agora, quando colocamos uma cota, vai ter uma obrigatoriedade de colocar qualquer pessoa lá, seja homem ou seja mulher, só para completar a foto. Imagina, se tenho uma chapa aonde e coloco cem mulheres, serei obrigado a procurar por aí cinquenta homens. E aí qualquer pessoa vai acabar pegando qualquer um, que é o que acontece hoje com partidos políticos. Eles têm aquela obrigação. Quando eles lançam as chapas de ter uma foto de mulher, foto de gênero, não é que acaba sendo foto feminina. Vai ver a funcionária do gabinete de alguém, a advogada dele é a mãe, é a manicure do cara, é a empresária dele, ou seja, colocam pessoas ali que vão ter um voto. Isso vai acabar acontecendo em todas as OABs. Minha crítica é tratar qualquer gênero como cota e acredito que numa instituição, o que tem que ter são pessoas de fato que queiram mudar os rumos da advocacia.

ConJur — O senhor acha que esse aumento da participação feminina deve ser feito de outra maneira?
Leandro Mello Frota —
Sim. Em primeiro lugar, o critério para a escolha de conselheiro deveria mudar. Por exemplo, há uma obrigatoriedade de comprovar que advogou por um tempo. Para ser conselheiro não, basta ter cinco anos, ou seja, aquela pessoa que passou, não passou na prova da Ordem e nunca fez nada da vida, ficou em casa, foi surfar, foi para onde quer que seja, mas manteve a carteira, pagou a anuidade, ela pode ser conselheira. Então, assim, o critério tinha que ser um critério muito mais meritocrata, ela tinha que provar que ela é advogada de fato, de que ela não está advogada. Ela não só é advogada no registro, e sim se ele está militando, como é que uma pessoa que não milita na advocacia, como é que uma pessoa que não advoga vai entender os problemas? Ela vai entender que, por exemplo, as petições estão demorando seis meses para serem juntadas, que, faltam juízes em serventias, que a advocacia não é bem tratada nos cartórios, a advocacia ganha mal pelos escritórios. Como é que uma pessoa que não advoga vai entender isso? Não vai entender, então vai ser conselheiro só para ocupar a função, seja homem ou seja mulher. O critério deveria ser meritocrata. Comprovar que de fato advoga, cinco anos, não tenho problema nenhum, pode até ser três, que é uma ideia reduzir para ficar três anos, não vejo problema, desde que comprove que o candidato, que o conselheiro ali de fato advoga, tem prática.

ConJur — O que o senhor acha do Código de Ética da Ordem?
Leandro Mello Frota —
A OAB, infelizmente, ainda está um pouco ultrapassada, especialmente na parte da propaganda dos advogados. Ninguém aqui vai defender que um escritório coloque uma propaganda depois da novela das 20h, das 21h, na Globo, "Olha, eu sou o escritório tributário X, me procure e tal". Agora, perder tempo discutindo como é que é a forma do cartão, como é que o cartão tem que ser, aí acaba sendo uma perda de tempo, a OAB tem que ser muito mais dinâmica. Infelizmente, as nossas instituições de hoje em dia entendem que para resolver tem que regular cada vez mais. Lidamos primeiro com a nossa criatividade, a nossa liberdade. Se começarem a infringir tudo, como atuaremos? Especialmente aqueles advogados que estão começando, que querem empreender, que querem montar seu próprio escritório, eles fazem como? Cheio de regras, cheio de descrições. É muito complicado, a OAB tinha que parar um pouquinho, se situar no mundo, os tempos mudaram, não é mais aquela Ordem do século passado e começar a olhar para o advogado, especialmente para o jovem advogado, que é maioria, e começar a tratá-los de uma maneira muito mais digna.

ConJur — Qual é o papel da Ordem hoje na crise que o Brasil passa?
Leandro Mello Frota —
Só hoje nós vivemos três crises graves, eu vou citar as três, mas não vamos colocar em ordem de importância porque todas são graves. A primeira crise é a crise econômica, o país passa por uma crise grave econômica, cada vez mais nós estamos vendo fábricas fechando, desemprego. Aqui no Rio, só até maio, na capital, três mil empresas fecharam. O município diminui, a arrecadação tributária, a empresa deixa de pagar imposto. Certamente esses empresários, médios empresários tinham funcionários, que foram para o olho da rua, tiveram que sacar o seu seguro desemprego, ou seja, onera mais o Estado e vira uma grande bola de neve. Em segundo nós temos uma crise de infraestrutura gravíssima, tem aí a crise elétrica, obras que não andam, com falta de planejamento e escolhas erradas. A crise de água, em São Paulo, no Rio.

Por exemplo, enquanto nós vivemos uma crise elétrica muito grave, seiscentas CCHs, pequenas centrais hidrelétricas estão presas por falta de licenciamento ambiental, ou melhor, falta de autorização de licenciamento ambiental, e o país em crise. Ou seja, se liberassem essas seiscentas, não estou dizendo liberar sem critério, não, liberar com critério, mas liberar essas seiscentas entraria na nossa matriz energética nove gigawatts de energia. Então, assim, já ajudaria a sair um pouco da crise. Por fim, temos uma crise moral, que é muito grave. Nós temos hoje em dia uma presidente que não governa, uma presidente que, infelizmente, está deixando o país sem rumo. Hoje em dia nós percebemos que quem tem tocado o país é o partido do vice-presidente, o PMDB, que também tem presidente da Câmara, presidente do Senado. A OAB tem a obrigação de utilizar o seu peso político, institucional. Ela é uma entidade que pode propor ações civis públicas, pode propor ações diretas, e combater essas três crises.

Eu sou liberal. Não se resolve crise econômica massacrando empresários. Nossa carga tributária é de 40% e cada vez ela aumenta mais. Temos uma carga tributária, até desculpa a piada, igual da Noruega, igual da Suíça, e eu não acredito que o Brasil seja uma Suíça, nem uma Noruega. Temos que 60 mil cargos de confiança, enquanto nos Estados Unidos são dois mil, enquanto na França são quinhentos. A OAB tem que ir contra essas gastanças de dinheiro público com apadrinhados. É o papel dela. Ela tem que contribuir, estar aí em cima. Também não deve deixar que os empresários sejam massacrados por uma carga tributária altíssima, que acaba indo também para o bolso dos mais pobres. A OAB tinha que combater esses aumentos absurdos da carga tributária, tanto dos empresários quanto para a população, combater o que a presidente vem fazendo bem.

Não basta o nosso presidente ir para a TV e fazer uma crítica dizendo que "Olha, ela tem que mudar, tem que pedir desculpa", não tem que pedir desculpa, não, presidente tem que ingressar com várias ações para obrigar que o Estado não faça o que ele vem fazendo, isso no âmbito econômico e de infraestrutura. Sem entrar no mérito do impeachment, só cabe impeachment se de fato comprovarem que ela cometeu algum mal feito. Ninguém pode tirar a presidente por simplesmente querer, porque não gosta, isso aí é de fato papo de golpista.  Agora, se for pela tese que tem que tirar pelas péssimas medidas, escolhas econômicas, escolhas de infraestrutura, eu peço desculpa para todo mundo, teria que tirar muito governador, de quase todos os partidos políticos, muito prefeito. Será que os governantes, ainda mais aqueles que estão em reeleição ou tiveram mandato renovado só descobriram isso depois de oito anos no poder, ele acordou e alguém falou "Olha, não tem mais água"? E ele "Como não tem mais água? Eu bebi água ontem", não, claro que não. E o mais engraçado é que a população só descobriu isso depois de beber em fonte.

ConJur — O senhor acha que o Brasil está mais punitivista? Isso atinge o advogado?
Leandro Mello Frota —
Ele está mais político. Acredito que isso tem ocorrido no mundo inteiro. Existe um fenômeno, por mais transparência, um fenômeno por combate cada vez mais às corrupções, isso em todas as esferas. Nós podemos perceber que, por exemplo, aqui vamos falar da nossa operação “lava jato”. São obras não só aqui no Brasil, como em outros países. É uma prática mundial. Agora, qual o grande problema da corrupção aqui brasileira? Se parar até para ver é uma coisa até que simples, mas que as pessoas têm medo de falar, é que a alta burocracia faz a corrupção. Se há 60 mil cargos de confiança e, para tirar uma simples certidão, uma licença ambiental, por exemplo, é necessário tratar com 30 ou 40 funcionários, é óbvio que vai existir corrupção, é óbvio.

Se os critérios fossem mais claros, o Estado sofresse realmente uma grande transformação, reduzindo drasticamente seus cargos, e aí cabem não só reduzir no Ministério, mas reduzir tudo, cargos de confiança. Tenho certeza que nós iríamos reduzir a corrupção no Brasil. É claro que nós não iríamos acabar, somos humanos, temos lá suas falhas, mas realmente reduzir nós iríamos. O que não dá é, por exemplo, teve um caso aí de quebra de sigilo que foi muito noticiado de um ex-ministro aonde quem fez a quebra foi um cargo de confiança. Como controlar tanta gente na administração pública? Como combater a corrupção ali? Aí acabamos combatendo quando explode, como, por exemplo, que é o caso agora, e aí a minha grande preocupação é o seguinte, a Lava Jato vai sumir, não vai sumir?

Ótimo, isso aí é o de menos, quem cometeu o crime vai ser punido, desde que se respeite as garantias. Mas se não combater faz chegar àquela corrupção, todos os empresários têm dito: "Olha, para fazer obra no país, tem que pedir ajuda a funcionário, tem que comprar não sei quem". Se não alterar isso, nós não vamos só alterar os empresários, caem três ou quatro empresas, surgem outras e as outras fazem as mesmas coisas, porque nós não alteramos o modus operandi de corrupção.

ConJur — O senhor acha que o aumento das penas soluciona o problema com o crime?
Leandro Mello Frota —
Não, eu sou contra o aumento de pena, aumentar a pena também por aumentar não resolve. Infelizmente o nosso Parlamento, ele tem feito o quê? Ao longo dos tempos, paliativos para mostrar para a sociedade que ele faz alguma coisa. São simplesmente paliativos e não resolvem nada. O que nós temos que fazer, e é aí que a OAB tem um papel fundamental, é iniciarmos um debate realmente pela reformulação do nosso Estado. Não estou nem entrando aqui em artigos políticos. É reformular o Estado, não importa o político que assuma o nosso Brasil, não importa o partido político que assuma. O Estado, da forma que está, inchado, com uma carga tributária altíssima, uma infraestrutura péssima, não vai adiantar nada, vamos continuar perdendo nosso tempo.

Ocorreu um crime aqui no Rio, caso concreto, facada, e o nosso presidente da Ordem teve a brilhante ideia de finalizar a faca. Isso é absurdo. Eu até brinquei: “se amanhã ou depois os bandidos começarem a assaltar as pessoas com raquete de mata mosquito, vai querer finalizar a raquete de mata mosquito?”. O problema é que ocorre um crime, grave, de comoção e alguém surge com a ideia de aumentar a pena para esse crime, e ninguém diz assim, "Olha, o crime ocorre por causa disso, disso e disso". Se vai aumentar a pena ou não, é indiferente, temos que analisar cada caso, não vamos falar de aumentar a pena de tudo. Tem que analisar quais são as raízes sociológicas que fizeram com que essa brutalidade começasse a ser praticada, e dessa forma. Olhando isso, aí sim conseguiremos fazer uma avaliação do que é melhor. Se é melhor aumentar a pena, se é melhor diminuir a pena, se é melhor investir aqui ou ali.

ConJur — Qual é a sua opinião sobre a advocacia pro bono?
Leandro Mello Frota —
Não vejo problema nenhum. Eu advogo pro bono, sou advogado de vários ativistas, alguns até de renome internacional. Faço pro bono, já fiz para várias instituições e nunca tive problema.

ConJur — Quem são seus exemplos no Direito?
Leandro Mello Frota —
Sobral Pinto, que é uma pessoa e um advogado fantástico. Eu tento seguir muito a linha dele, inclusive, defendendo durante a minha caminhada, não importa a sua ideologia, não importa a sua fé, mas a advocacia está acima disso. Sobral Pinto, católico, liberal, defendeu Luís Carlos Prestes, comunista, ateu, então, e viraram amigos. Essa é a maior prova de respeito e tolerância ao posicionamento da outra pessoa, isso é algo assim fantástico. E, eu tive o privilégio de estagiar durante cinco anos com um advogado aqui do Rio que já faleceu. Era o Paulo Goldrajch. Ele foi advogado de presos políticos, atuava na área do Direito Criminal e faleceu em dezembro de 2006. Inclusive presidiu o sindicato dos advogados, foi conselheiro da Ordem. Foi uma pessoa que me deu o prazer de advogar e de querer ser advogado.

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