Direito tributário

Prazo decadencial não começa na data de registro da declaração de importação

Autor

14 de março de 2015, 7h30

Uma questão cujo entendimento andou oscilando nas esferas administrativa e judicial diz com o prazo decadencial aplicável às operações de importação realizadas ao amparo do regime o drawback na modalidade suspensão, que, como se sabe, responde por parte considerável das importações beneficiadas com o regime.

A título de esclarecimento, essa modalidade consiste na suspensão dos tributos incidentes na importação de mercadoria a ser utilizada na industrialização de produto que posteriormente deve ser exportado, observado o prazo estabelecido no Ato Concessório de emissão da Secretaria de Comércio Exterior – SECEX.

A controvérsia a respeito do início do prazo extintivo do direito do Fisco, no caso das importações realizadas sob o regime drawback­-suspensão, findou por levar à  construção de duas posições, absolutamente distanciadas entre si: uma primeira, sustentando que o termo a quo deste prazo conta-se da data do registro da Declaração de Importação – DI; uma segunda, à qual nos filiamos, que entende que o mesmo prazo decadencial deve contar-se do primeiro dia do exercício seguinte ao dia imediatamente posterior ao trigésimo dia da data limite para exportação, nos termos do inciso I do § 3º do art. 752 do Decreto nº 6.759, de 2009 (Regulamento Aduaneiro).

Para os áulicos da primeira posição, a suspensão do pagamento dos tributos aduaneiros não suspenderia a ocorrência do fato gerador, que ocorre, como sabido, na data do registro da DI das mercadorias estrangeiras, momento em que a obrigação tributária se constituiria plena, conforme previsto no § 1º do artigo 113 do CTN. Assim, como esses tributos estão sujeitos a lançamento por homologação, dever-se-ia aplicar o disposto no art. 150, § 4º, do mesmo diploma legal, que o estabelece em cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador.

Os defensores dessa tese fundamentam-se em acórdão prolatado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ nos autos do REsp nº 1.006.535/PR, de relatoria da Min. Eliana Calmon, que entendeu que o regime aduaneiro de drawback seria irrelevante na fixação do termo inicial do prazo para a constituição do crédito tributário, uma vez que a decadência não se interrompe nem se suspende. Asseveram, também, que nada obstaria o Fisco de promover o lançamento destinado a prevenir a decadência, o qual poderia ser exigido assim que cessasse o evento responsável pela suspensão da exigibilidade, conforme entenderia o próprio STJ (REsp nº 1.259.346/SE).

Será?

Bom, primeiro, cabe destacar que a alegação de que a decadência não se interrompe nem se suspende não responde de modo algum à questão. Afinal, só se suspende ou só se interrompe algo que já se iniciou. Durante o seu transcurso, sim, poder-se-ia falar em não interrupção ou em não suspensão, mas nunca, nunca mesmo! antes do seu início.

Ademais, afirmar que o fato gerador constitui, sempre e sempre, o momento em que se inicia a contagem do prazo decadencial constitui, a nosso sentir, rematado equívoco. Afinal, o próprio STJ já consolidou o entendimento que, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, não havendo pagamento antecipado, a regra a aplicar é o art. 173, I, do CTN (REsp nº 766.050/PR), ainda que, obviamente, o fato gerador do tributo tenha ocorrido em momento anterior.

Aliás, quanto a este entendimento, para que se determine quando se dá o termo a quo do prazo decadencial no caso em que não há pagamento antecipado, há de se promover o cotejo da regra encartada no art. 173, I, do CTN com a legislação de regência de cada tributo sujeito a lançamento por homologação, a fim de que, com base nas informações a respeito do período de apuração e da data de vencimento, se possa vir a situá-lo no tempo.

Especificamente quanto ao drawback-suspensão, embora o fato gerador do imposto de importação ocorra na data do registro da DI, o termo a quo do prazo decadencial – considerando que, nessa modalidade, não há pagamento antecipado de tributos aduaneiros – só se inicia no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, vale dizer, no primeiro dia do exercício seguinte ao dia imediatamente posterior ao trigésimo dia da data limite para exportação, haja vista que o contribuinte que cumpre o regime tem trinta dias após o seu encerramento para promover o recolhimento, parcial ou integral, dos tributos suspensos.

E o lançamento destinado a previnir a decadência, não seria o caso?

Previsto no art. 63 da Lei nº 9.430, de 1996, tampouco é de se aventá-lo, uma vez que a autorização legal é para que, quando a exigibilidade de um tributo estiver suspensa por força de ordem judicial precária (incisos IV e V do art. 151 do CTN) – não por ato administrativo em que se reconhece determinado benefício fiscal, ainda que sob determinadas condições –, o Fisco pode e, na verdade, deve promover o lançamento, já que, além de a contagem do prazo decadencial não se modificar em face do ajuizamento da ação, o tributo continua sendo devido à luz da lei que o disciplinou no momento da ocorrência do fato gerador, suspendendo-se apenas a sua exigência. Noutras palavras, o fato gerador ocorre, o tributo é devido, a contagem do prazo decadencial se inicia, mas o tributo não pode ser exigido em face da decisão judicial não definitiva.

A hipótese aqui é diversa.

No drawback­-suspensão, o fato gerador ocorre, mas o tributo simplesmente não é devido enquanto não findar o prazo de vigência do Ato Concessório. Por isso que se costuma entender que este regime na verdade instituiu uma isenção condicionada a um evento futuro e incerto – a exportação dos insumos após a industrialização.

Por tal razão, entendemos não haver a menor necessidade de se promover o lançamento após a concessão do drawback. Mais: não há mesmo a menor possibilidade de que se venha a fazê-lo, porquanto não se pode conceber possível lançar tributo ainda não devido.

O lançamento, não se pode olvidar, constitui direito potestativo do Fisco, que, obviamente, só pode ser realizado quando recaia sobre direito que já exista. A concessão de uma isenção condicionada importa reconhecer que enquanto não realizada a condição não há o direito do Fisco, donde se torna impossível conceber, por inércia deste, o início da contagem do prazo decadencial.

Não fossem essas razões suficientes, cabe observar que alguns precedentes do STJ tem entendido que o lançamento seria, no drawback-suspensão, atividade desnecessária, porquanto o Termo de Responsabilidade firmado por seu beneficiário já seria título hábil à execução do montante não recolhido, de sorte que, ao menos para alguns integrantes da Corte, o caso seria de prescrição, não de decadência. E, nessa hipótese, somente após o encerramento da vigência do Ato Concessório é que fluiria a contagem do prazo prescricional (STJ, rel. Min. Denise Arruda, RESP nº 658404, DJ em 01/02/2006).

Portanto, seja decadencial ou prescricional o prazo, não há como conceber que a sua contagem inicie-se na data do registro da DI (adotando o nosso entendimento: TRF/3ª Região, JUIZ CONVOCADO RENATO BARTH, REOMS nº 214548, DJU em 30/01/2008; TRF/4ª Região, rel. Des. JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, REO nº 9404139173, DJ em 23/06/1999).

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!