Volta por cima

Faculdades recuperam prestígio com incubadoras de escritórios de advocacia

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8 de fevereiro de 2015, 11h42

Quando a advogada Michelle Green se formou, pela Faculdade de Direito Chicago-Kent, ela, como milhares de outros bacharéis da época, não encontrou emprego. Abriu uma “prática solo” em sua própria casa e foi à luta. Foi uma luta ingrata, por sinal, até que ela soube de um novo programa de sua faculdade: uma incubadora de escritórios de advocacia.

Michelle se inscreveu imediatamente. Ela queria trabalhar com pequenas e médias empresas, mas não sabia como abordar os empresários, não sabia o que propor, pois sequer conhecia suas necessidades. Porém, uma parte do programa da faculdade oferece oportunidades de networking — encontros para formação de relacionamentos profissionais.

Nesses encontros, os pequenos empresários revelaram à nova advogada sua grande necessidade: eles precisavam ter uma assessoria jurídica, como as grandes empresas têm, mas não dispunham de recursos financeiros para contratar um advogado em tempo integral.

Eles a ajudaram a desenvolver um modelo de negócios: “Por que você não me presta dez horas de serviços jurídicos por mês?”, perguntou um deles. Nasceu assim a prática de assessoria jurídica por dez horas de Michelle.

Em seu período na incubadora, Michelle conseguiu vários clientes — o suficiente para montar seu próprio escritório, sem se preocupar com as despesas mensais. Ela criou, na verdade, uma assessoria jurídica sob medida para as necessidades de pequenas e médias empresas (PMEs).

A prestação de serviços por dez horas foi a ideia inicial. Mas, podem ser oito horas… ou 12. Isso depende das necessidades de cada cliente e não é o fator principal. O fator principal é oferecer serviços “sob medida”. Hoje, ela tem três empregados, dois em tempo integral, um em meio expediente. E o escritório vai de vento em popa.

Em busca do prestígio perdido
Houve uma época, no embalo da crise econômica em 2008, que o prestígio dos cursos de Direito nos EUA despencou. Não havia empregos para bacharéis. Quanto a isso, as faculdades não podiam fazer nada. Mas podiam tomar outras iniciativas, como a de ajudar seus estudantes a não depender de emprego. Os programas de residência e de incubadoras de escritórios de advocacia foram os que alcançaram maior sucesso.

A primeira incubadora de escritórios de advocacia para novos advogados foi criada pela Faculdade de Direito da Cidade Universitária de Nova York, a CUNY incubator (City University of New York). Hoje, já são 31 programas de incubadoras funcionando no país — uma página da ABA (American Bar Association) na internet lista os programas e outra página os descreve.

As únicas que não se preocupam com isso são as faculdades que ocupam os primeiros lugares no ranking das melhores do país, como Yale, Harvard, Standford e outras. Seus bacharéis conseguem emprego mais facilmente, por causa do prestígio das instituições.

Mas todas as demais ainda precisam recuperar o prestígio perdido. Algumas já lançaram seus próprios programas, muitas outras se preparam para fazer a mesma coisa. Algumas faculdades financiam seu programa, outras fazem parcerias com organizações ligadas ao mundo jurídico, outras conseguem a ajuda de doadores privados. De uma forma ou outra, estão fazendo alguma coisa para reverter o quadro desfavorável.

“As incubadoras estão se espalhando como fogo na mata”, disse ao Jornal da ABA o diretor do Centro de Justiça Internacional para Desenvolvimento Pós-Graduação, Fred Rooney.

Histórias de sucesso
Houve uma época em que os jornais traziam, com frequência, notícias sobre bacharéis processando suas faculdades por publicidade enganosa — elas anunciavam que a grande maioria de seus estudantes conseguiam emprego em um período de nove meses após a formatura, para atrair estudantes. Porém, o que se via, no final das contas, era desemprego “em massa”: do universo de estudantes que se formavam, a grande maioria buscava subempregos para pagar a dívida do financiamento do curso.

Hoje, essas notícias ruins minguaram, porque o mercado melhorou um pouco, nem tanto, e a ideia do empreendedorismo se fortaleceu entre os bacharéis, muito com a ajuda dos programas de incubadora de escritórios de advocacia e de residência.

No lugar delas, começaram a surgir notícias de bacharéis que esqueceram a busca de emprego e “abriram seu próprio negócio” — isso não é terminologia que se use em advocacia, mas são as palavras que melhor definem um dos maiores sonhos dos americanos: ter sua própria empresa. No caso dos novos advogados, ter seu próprio escritório, sozinho ou com sócios — aqueles advogados que conheceu na incubadora e que estavam no mesmo barco.

Essa é a história de Michele Green, de Bikran Singh e de Yogi Patel, contadas pelo Jornal da ABA, e de centenas de outros bacharéis país afora. Singh disse ao jornal que encontrou seu nicho de mercado onde ele menos esperava: na área da habitação. Na incubadora, ele teve de defender muitos clientes de recursos “parcos ou moderados” na Justiça. Através deles, conseguiu muitos outros clientes, que hoje sustentam seu escritório.

Yogi Patel, por sua vez, conheceu um colega na incubadora que tinha a mesma inclinação: Direito do Trabalho. Fundaram a Lloyd Patel, um pequeno escritório em “midtown Manhattan”, em Nova York, com uma base estável de clientes. Seu grande ganho na incubadora, ele diz, foi aprender a fazer networking. “Até hoje eu emprego uma parte significativa do meu dia em encontros de networking, em cafés da manhã, almoços e jantares”, ele disse.

Mas não pode haver pressa, nem ansiedade, ele afirma. “Às vezes, pode levar um, dois ou até três anos para um relacionamento se converter em trabalho real. Por isso, assusta um pouco no início. Mas você sabe que já deu o pontapé inicial e que, agora, é preciso continuar jogando”.

Além de “oportunidades de relacionamento” em pessoa e online, as incubadoras de escritórios de advocacia oferecem de uma maneira geral:

— Espaço de escritório de advocacia gratuito ou subsidiado.

— Um estipêndio ou uma contribuição financeira.

— Apoio de pessoal, material de escritório e equipamentos (telefone, computador, impressora, copiadora etc.

— Assistência e treinamento por advogados experimentados, juízes aposentados, professores de Direito (mentores) para serviços jurídicos e gestão de escritório.

— Programa de desenvolvimento de cliente.

— Recomendações de casos.

— Pesquisa de recursos jurídicos.

— Programa de educação continuada (obrigatório nos EUA) gratuito ou subsidiado.

— Seguro contra má prática gratuito ou subsidiado.

— Oportunidades de trabalhar como “advogado sombra” (“shadow lawyer”), um advogado nomeado em segredo para proteger uma testemunha de outros réus que podem ser representados por um mesmo advogado.

— Oportunidades de pro bono. Na verdade, esse item é uma “obrigação”. Todos os advogados participantes devem prestar serviços pro bono, como parte do treinamento.

A área de atuação de cada advogado participante é aberta, normalmente, permitindo que cada um desenvolva o nicho de sua escolha. Mas podem ter de atuar em outras áreas, dependendo da disponibilidade de clientes, da organização do curso ou da demanda do mercado.

Mas há exceções. Um programa da Califórnia, por exemplo, é dedicado exclusivamente a advogados que querem se especializar nas áreas de entretenimento, artes, propriedade intelectual e inovação (ou tecnologia). Entretenimento é uma das grandes atividades na Califórnia e não há advogados especializados nessa área em número suficiente para atender a demanda.

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