Sistema partidário

Blocos parlamentares e coligações desmoralizam a política

Autor

  • Antônio Augusto de Queiroz

    é jornalista analista e consultor político mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV ex-diretor de documentação do Diap autor dos livros Por Dentro do Governo: como Funciona a Máquina Pública e RIG em Três Dimensões: Trabalho Parlamentar Defesa de Interesse perante os Poderes Públicos e Análise Política e de Conjuntura e sócio-diretor das empresas Consillium Soluções Institucionais e Governamentais e Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas.

4 de fevereiro de 2015, 6h03

A formação de blocos parlamentares apenas para ocupar espaços de poder na estrutura do Legislativo (Mesas e Comissões Permanentes), sem a menor afinidade programática ou ideológica, e que se desfazem logo após cumprirem essa função, leva à completa desmoralização do sistema partidário e eleitoral.

O bloco parlamentar, que consiste na união de dois ou mais partidos, equivale a um só comando, como se fosse um único partido. Entretanto, na prática parlamentar brasileira, os partidos que integram um bloco parlamentar, contrariando os regimentos internos da Câmara e do Senado, continuam com seus líderes, que encaminham votações em nome do partido e não perdem o espaço físico da liderança nem os cargos e outras vantagens a que tem direito. E o mais grave é que esses blocos se dissolvem tão logo atingem seus objetivos, quais sejam: eleger presidentes de comissões e ocupar cargos nas Mesas Diretoras das Casas do Congresso.

Mal comparando, os blocos parlamentares são como as coligações nas eleições proporcionais. Elas são feitas apenas para garantir o quociente eleitoral e assegurar a conversão de votos em mandatos, sem qualquer compromisso com questões doutrinárias. Trata-se de uma verdadeira fraude eleitoral.

Em coligações sem identidade programática, a principal vítima é o eleitor. Imagine o eleitor do Distrito Federal que votou em Érika Kokai (PT), uma defensora dos direitos humanos, mas que seu voto, na prática, ajudou a eleger o pastor Ronaldo Fonseca (Pros), um parlamentar cujo pensamento diametralmente oposto ao da combativa deputada, especialmente em questões como união homoafetiva, aborto, maioridade penal, entre outras. Esse eleitor deve se sentir enganado, assim como o eleitor do pastor, cujo voto foi contabilizado na coligação que ajudou a eleger Érika.

Enquanto as lideranças, os dirigentes partidários e os próprios parlamentares continuarem utilizando desses artifícios para assegurar espaço de poder, dificilmente se avançará em mudanças culturais e de legislação que moralizem e tornem mais equitativas as disputas eleitorais bem como aproximem os representantes dos representados, cujos pressupostos são o cumprimento de programas, a prestação de contas e a alternância no poder.

A solução para evitar esse tipo de fraude, que resulta das coligações e da formação de blocos, seria exigir que os partidos coligados e também aqueles que fizerem parte de blocos parlamentares obrigatoriamente continuem unidos por toda a legislatura, sob pena de perda dos espaços conquistados em razão dessa união. Com isso, só partidos com identidade programática e ideológica se uniriam. Seria equivalente à Federação de Partidos, que são criadas pela união de dois ou mais partidos, porém devem permanecer vinculados programaticamente e sob a mesma liderança no Parlamento por pelo menos três anos.

Para que se aprove uma reforma política digna desse nome, é preciso que parlamentares, lideranças e partidos estejam dispostos a isso e que deem o exemplo, não permitindo a participação em coligação sem identidade programática nem de bloco parlamentar de conveniência, criado apenas para viabilizar o acesso ao poder.

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