Regras constitucionais

Pareceres contestam pedido de impeachment contra Dilma

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7 de dezembro de 2015, 7h21

Dois novos pareceres se posicionam contra a decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de aceitar o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff (PT). Em um deles, os juristas Juarez Tavares e Geraldo Prazo afirmam que abrir o processo sem ouvir a presidente é inconstitucional.

No outro, a jurista Rosa Cardoso afirma que o pedido de impeachment recebido por Cunha não tem consistência. Para ela, a ação é uma retaliação ao apoio do PT à abertura de processo contra ele no Conselho de Ética.

Os dois pareceres foram elaborados a pedido da defesa da presidente Dilma, coordenada pelo advogado Flavio Crocce Caetano, ex-secretário de Reforma do Judiciário. Ele também foi o coordenador jurídico da campanha da reeleição de Dilma, em 2014.

Cunha deu seguimento à petição protocolada pelo advogado Helio Bicudo, ex-procurador de Justiça, ex-vice-prefeito da gestão Marta Suplicy em São Paulo e ex-petista. O ex-presidente do PSDB e advogado Miguel Reale Jr. também assina o documento. 

A base do pedido são as chamadas pedaladas fiscais: manobras do governo de atrasar repasses do Tesouro a bancos públicos, fazendo com que as instituições financeiras virem credoras da União, o que é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

O Tribunal de Contas entendeu que a manobra, posta em prática em 2014, foi ilegal e deu parecer pela rejeição das contas de 2014, o que ainda não foi analisado pelo Congresso. Parecer do Ministério Público de Contas afirma que o mesmo mecanismo foi usado neste ano.

Audiência prévia
A peça elaborada pelos juristas Juarez Tavares e Geraldo Prado afirma que faltou obediência a regras constitucionais e legais. Eles avaliam, por exemplo, que Cunha só poderia ter decidido sobre a abertura do processo depois de ter promovido audiência prévia para ouvir a presidente, conforme o artigo 4º da Lei 8.038/1990 e da Lei 1.079/50.

“À partida o ‘juízo político’ seja um ‘processo político’ em sentido lato, as condições para o exercício do poder estão definidas pelo direito e se submetem ao direito não por mero capricho, mas porque de outra maneira não haveria como se controlar o exercício do poder e evitar seus abusos”, sustentam os juristas, que fizeram o parecer pro bono (sem custos).

Os autores do parecer afirmam ainda que “só haverá imputação de responsabilidade quando a atividade do agente político puser em alto risco a ordem administrativa e a democracia, centrada na própria Constituição e seus elementos específicos”. Nesse ponto, os juristas diferenciam perigo de risco à ordem constitucional, destacando que somente a ocorrência de um risco permanente e grave à Constituição se caracteriza como crime de responsabilidade.

No entendimento de Tavares e Prado, as chamadas pedaladas fiscais não constituem risco à ordem constitucional e, portanto, não são crime de responsabilidade. “Somente a ofensa grave — atentado — às leis orçamentárias previstas na Constituição autorizam cogitar do impedimento do Presidente. Não fosse assim, a violação a normas meramente infraconstitucionais, sem assento constitucional, conduziria à afirmação da prática de crime de responsabilidade”, afirmam.

Pedido inconsistente
Em outro parecer divulgado nesta segunda-feira (7/12), a jurista Rosa Cardoso afirma que só se configura crime de responsabilidade quando há dolo (intenção) de cometer o ato ilegal. Nesse sentido, é preciso que um pedido de impeachment aponte exatamente as ações presidenciais que levaram ao crime de responsabilidade, o que não foi feito no pedido aceito por Cunha.

“Crimes de responsabilidade não são puníveis a título de culpa. Crimes culposos precisam fazer referência expressa a esta modalidade, o que não acontece com os tipos invocados. Dolo exige consciência e vontade de realizar”, escreve a jurista. “As operações que foram questionadas pelo TCU [Tribunal de Contas da União] nunca foram consideradas e inscritas na Dívida Líquida do Setor Público, nem no resultado primário, porque o governo entendia que não constituíam operações de crédito.”

Segundo ela, “o TCU vinha acolhendo a operação sem criminalizá-la, porque a entendia aceitável frente à legislação vigente, isto é, [o TCU] admitira fatos correspondentes em anos anteriores, não se pode atribuir à Presidente a prática de ação dolosa”.

Na opinião da jurista, os atos fiscais praticados pelo governo se justificam pela necessidade de manter programas e ações consideradas importantes. A necessidade se caracteriza (Art. 24 do Código Civil)  pelos seguintes requisitos: existência de um perigo atual e inevitável, justificando a ação necessária; que o perigo não haja sido provocado pelo agente e que ele não tenha o dever legal de enfrentá-lo; que não seja exigível o sacrifício do bem ameaçado; e que a situação evidencie a ameaça de direito próprio ou alheio.

Assim, quanto à abertura de créditos suplementares, mediante decretos irregulares, incompatíveis com a obtenção da meta de resultado primário então vigente “a pertinência de invocar-se este tipo de excludente é clara”.

Clique aqui e aqui para ler os pareceres.

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