Interesses nacionais

Japão criminaliza vazamento e divulgação de segredos de estado

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11 de dezembro de 2014, 9h48

Entrou em vigor nesta quarta-feira (10/12) no Japão, sob protestos populares, uma lei que criminaliza o vazamento e a divulgação de segredos de estado. A lei prevê penas de prisão de até dez anos para funcionários públicos ou quem quer que seja que promover o vazamento de informações ou documentos protegidos pelo governo; e de cinco anos para jornalistas que as publicarem.

O governo do primeiro-ministro Shinzo Abe declarou que a lei é essencial para convencer os países aliados, liderados pelos Estados Unidos, a compartilhar inteligência com o Japão, de acordo com os sites The Asahi Shimbun, Al-Jazeera America e outras publicações. Também disse ser necessária para proteger a segurança e os interesses nacionais.

A Agência Kyodo informou que, desde logo, cerca de 460 mil documentos serão qualificados como secretos e, portanto, protegidos pela nova lei. Assim, qualquer versão japonesa do americano Edward Snowden, ex-funcionário da CIA, que divulgar quaisquer desses documentos irá para a cadeia.

O maior problema, no entanto, é o poder de censura implícito na lei. A organização Repórteres sem Fronteiras declarou que a lei “é uma ameaça sem precedentes à liberdade de informação”. O Congresso de Jornalistas do Japão divulgou nota em que declara: “A lei vai cobrir os olhos, os ouvidos e a boca das pessoas e usurpar sua liberdade de expressão e a liberdade de imprensa”.

A lei também será um instrumento, provavelmente eficaz, para intimidar as pessoas que pretenderem denunciar maus procedimentos de autoridades governamentais.

“A lei diz que o ato de vazar informações e documentos oficiais, por si só, é ruim, não importa as circunstâncias”, diz a diretora da Clearinghouse no Japão, Yukiko Miki. A Clearinghouse é uma organização sem fins lucrativos que promove a divulgação de informações. Para eles, o “direito do público de saber” será violado constantemente.

O chefe de gabinete do governo, Yoshihide Suga, nega. Ele diz que a implementação da lei será monitorada por dois grupos de investigação, um deles chefiado pelo primeiro-ministro do Japão. Mas não há nada na lei que proteja a população contra abusos de autoridades, disseram os críticos.

A União para as Liberdades Civis do Japão, formada por advogados e acadêmicos da área jurídica, também se queixou, em uma declaração, da restrição inapropriada do “direito do público de saber”. Para essa organização, as autoridades governamentais poderão classificar como segredo de estado o que quiserem, porque a lei não cria mecanismos para se determinar o que pode ou não ser classificado como segredo de estado.

A incerteza de que o governo vai considerar segredo de estado já está causando um efeito de autocensura no país, disse a diretora da Clearinghouse. “A organização vem recebendo muitos telefonemas de autores de blogs, pedindo esclarecimentos. Querem saber, por exemplo, se devem cancelar a publicação de algumas de suas postagens, para evitar processo judicial”.

Um grupo de cineastas japoneses, incluindo a diretora Yoji Yamada (Trilogia Samurai) e o diretor Isao Takahata (O Túmulo dos Vagalumes), também divulgou uma declaração: “Em vez de uma sociedade tomada por segredos, preferíamos um Japão em que o espírito da democracia florescesse através da divulgação de informações”.

Por enquanto, fica a impressão de que o governo pode fazer o que quiser, com o argumento de que “é para o bem do país”, sem que ninguém saiba exatamente o que está fazendo, disse aos jornais a professora Hisako Ueno, 60, uma em centenas de manifestantes que saíram às ruas de Tóquio para protestar.

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