"Desafios Supremos"

STF precisa desestimular recursos, apontam especialistas em evento em SP

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18 de agosto de 2014, 19h04

É preciso criar mecanismos que desestimulem as pessoas a recorrer ao Supremo Tribunal Federal. Dessa forma, a Corte poderá se concentrar apenas em questões materialmente importantes para a sociedade. A ideia foi abordada durante o evento “Desafios Supremos”: diálogo entre o STF e a Suprema Corte Americano, que ocorreu nesta segunda-feira (18/8).

O secretário-geral da Suprema Corte dos EUA Scott Harris contou que apesar do grande número de litígios no país, há apenas 8 mil recursos à Suprema Corte por ano e apenas 1% desse total são admitidos. A corte sequer é vista como uma terceira instância recursal. Isso porque, ao longo de mais de um século, criou maneiras de desestimular os recursos.

O efeito é cultural: pouca gente recorre à Suprema Corte porque sabe que dificilmente o caso será admitido. Hoje, 80% de sua demanda é relativa a conflitos entre tribunais federais. Os 20% restantes são para decidir questões consideradas materialmente relevantes.

Ele conta que os casos que chegam à Suprema Corte americana passam por uma seleção feita pelos assessores dos ministros. Cada ministro conta com quatro assessores que têm a função de receber os casos e fazer um memorando recomendando ou não que o caso seja apreciado, com base na questão constitucional de cada ação. Os sucintos documentos são enviados aos ministros semanalmente e os juízes debatem se devem aceitar ou não.

Para o juiz federal americano Peter Messite, a revisão discricionária é algo que deveria ser implantada com mais força no Brasil. Ele explica que para chegar na Suprema Corte americana, as causas devem ter importância geral. Ou seja, os ministros são chamados para resolver conflitos que envolvem matérias de importância nacional, como o casamento homossexual e o aborto.

Efeitos colaterais
Ainda que tenha criado filtros processuais mais severos, o Supremo ainda é sobrecarregado com casos como roubo de galinhas e furto de chinelos. De acordo com Max Fontes, presidente da Harvard Law School Association of Brazil, o instituto da Repercussão Geral gerou uma série de teses que não foram julgadas e estão sobrestando milhares de processos nos tribunais inferiores. “O caminho encurtou, mas ficou muito mais demorado do ponto de vista processual”, afirma.

Fontes conta que medidas legislativas já foram tomadas, tanto de ordem legal quanto constitucional. Mas é insuficiente. Segundo ele, o mais importante é fazer uma reforma procedimental e analisar quais são os procedimentos que o STF precisa adotar para que possa julgar com rapidez essas inúmeras teses que aguardam julgamento. “O maior desafio do Supremo hoje não é jurisdicional e, sim, administrativo”, diz.

Para Oscar Vilhena, diretor da FGV Direito SP, o desafio no Brasil envolve engenharia institucional e de cultura legal. Segundo ele, as questões estão relacionadas às diferenças entre as constituições americana e brasileira: a americana é singela em relação aos temas em que ela cobre e tem apenas sete artigos originais; já a brasileira é “ambiciosa” e tem 240 artigos originais. “As constituições maiores complicam a vida de todos.”

Ainda de acordo com Vilhena, as competências do Supremo padecem de um "defeito de fabricação", com uma quantidade de atribuições que extrapolam o que uma corte constitucional precisa ter. "Nossa Corte é de apelação, é constitucional e é tribunal especial de crimes políticos e de outros atos cometidos. Há uma conjugação em uma instância, do que outros países são  distribuídos”, afirma.

A crítica do diretor é que as propostas de mudança estão mais preocupadas em ampliar o calibre da entrada. Isso, consequentemente, aumenta a demanda. “O STF precisa deixar de ser uma terceira instância onde as pessoas utilizam simplesmente com o objetivo de adiar o fim do processo”, diz. Nessa hipótese, o trabalho seria limitado em duas instâncias e o Supremo, eventualmente, resolveria problemas maiores.

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