Prevista na Constituição

É necessário criar corte mundial de direitos humanos

Autor

  • Belisário dos Santos Jr.

    é advogado ex-secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do estado de São Paulo (1995-2000) membro da Comissão Internacional de Juristas e membro fundador da Comissão Arns de Direitos Humanos.

14 de dezembro de 2012, 6h40

O Brasil é o único país que, em sua Constituição, promete pugnar pela instituição de um tribunal internacional de direitos humanos (ADCT, artigo 7º). No âmbito internacional, há quatro anos, durante a comemoração dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a ideia voltou e foi incluída na Agenda de Direitos Humanos proposta pelo governo suíço. Recordou-se, então, que a ideia fora proposta por René Cassin, um dos redatores da Declaração de 1948.

A aspiração pela criação do tribunal ganha força agora agregada à ideia da convocação da Terceira Conferencia Mundial de Direitos Humanos, provavelmente para 2018, e também com apoio do governo suíço.

Em exposição sobre o tema no 17º Congresso Mundial da Comissão Internacional de Juristas, realizado entre os dias 11 e 14 de dezembro de 2012, em Genebra, o professor austríaco Manfred Nowak elencou as principais razões para uma corte mundial de direitos humanos. Ele lembrou que não há direitos sem garantias e não há mecanismos universais eficazes em caso de não funcionamento dos instrumentos regionais. De acordo com o professor, os mecanismos de queixas previstos pelos instrumentos da ONU ainda refletem a lógica da guerra fria, e há uma região em especial (Ásia e Pacífico) sem qualquer mecanismo local de proteção internacional. Na avaliação de Nowak, criar uma corte mundial seria mais factível que reformar o sistema de tratados da ONU e esse novo tribunal poderia receber gradativamente as competências judiciais de outros organismos.

A criação de um tribunal mundial nesses moldes tem o apoio da Comissão Internacional de Juristas — que reúne em Genebra cerca de 120 juízes, advogados e líderes internacionais da luta em defesa dos direitos humanos — e de várias outras  importantes organizações que atuam na área dos direitos humanos. Portanto, já entrou definitivamente na pauta global.

No Brasil, há certa resistência à ideia de mecanismos internacionais sobrepairando-se ao Poder Judiciário local, como se constatou diante da reação de ministros do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do caso Gomes Lund (relativo à guerrilha do Araguaia) pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). O Supremo havia decidido pela aplicação da Lei de Anistia aos acusados de tortura. E a Corte Interamericana enunciou sua interpretação sobre a Convenção Americana no sentido de afastar esse privilegio dos acusados de crimes contra a humanidade, compreensão que se assenta na normativa internacional. O Estado brasileiro conformou-se confortavelmente com a decisão do STF, coincidente com a posição oficial do Brasil na CIDH.

O que acontecerá agora, em face da a retomada do plano de criação de um tribunal internacional? O Estado brasileiro honrará a Constituição que o legitima apoiando a iniciativa ou lhe dispensará o mesmo tratamento dado à maioria dos tratados internacionais de direitos humanos, que não têm sequer merecido referência em decisões judiciais, apesar do disposto no artigo 5º, parágrafo 3º da Constituição Federal.

Será interessante acompanhar esse debate e a posição oficial do Estado brasileiro.

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