Reforma penal

Novo Código Penal deve aumentar número de presos

Autor

31 de agosto de 2012, 11h48

A segunda e última parte da audiência pública promovida pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais sobre o novo Código Penal lançou um alerta: O novo ordenamento jurídico deve aumentar o número de presos no país. A avaliação é dos convidados do instituto, que conduziram os debates nesta quinta-feira (30/8), em São Paulo — o advogado Luiz Flávio Gomes e a defensora pública Juliana Belloque, que integraram a comissão, e o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira.

A consideração de que o novo Código Penal traz embutido o risco de aumentar o número de presos contrasta com a do relator do projeto, Luis Carlos dos Santos Gonçalves, que classificou o texto de “descriminalizador e descarcerizador” na primeira parte da audiência, na quarta-feira (29/8).

“Se esse Código passar, vai encarcerar muito mais gente”, declarou Luiz Flávio Gomes, doutor em Direito Penal. Segundo ele, entre 1990 e 2010, o Brasil prendeu 476% mais pessoas. E no novo Código Penal, diz ele, a progressão de regime ficou “duríssima” em alguns casos.

Um exemplo é o que trata dos crimes hediondos. Pelo anteprojeto, se o condenado for primário, o benefício será possível apenas após o cumprimento de metade da pena, sendo que atualmente a exigência é de dois quintos da condenação. “Pensar em progressão na metade [da pena], significa que ele [preso] vai passar praticamente dois terços da pena em regime fechado, porque ainda tem o prazo de espera pela decisão judicial”, disse a defensora pública.

Segundo ela, além do endurecimento na progressão do regime, uma outra norma também tem grande potencial encarcerador — a que proíbe o regime inicial aberto para todos os crimes praticados com violência ou grave ameaça, como resistência contra ordem policial, aborto, lesão corporal leve e grave, e eutanásia. “Em vez de penalizar mais o crime mais grave, vamos encarcerar justamente o crime mais leve, que tem pena fixada em até quatro anos”, disse Juliana. “É um rol muito grande de crimes”.

Ela disse que ao longo da tramitação do projeto pediu ao Ministério da Justiça o número de presos que praticaram crimes com grave ameaça e que estão em regime aberto, mas os dados não foram levantados. “Precisamos ter consciência do volume de pessoas que estamos colocando dentro do sistema”, afirmou. “O ideal é o Congresso Nacional verificar que número é esse para sabermos qual é o efeito que a lei produz”.

Com base em um estudo que ainda está em fase preliminar, Marivaldo Pereira disse que num primeiro momento deve haver redução no número de presos, graças à diminuição de algumas penas. Entretanto, no médio prazo, a quantidade de presos deve subir. “Pode haver aumento do contingente entre 45% e 87%”, estima.

Ele concordou com a crítica geral de que houve pouco tempo para a elaboração do anteprojeto, escrito em apenas sete meses, conforme determinação do Senado, mas disse que o Congresso Nacional tem legitimidade para propor a medida. Marivaldo fez um apelo aos operadores do Direito e interessados no assunto para que participem dos debates relativos ao novo Código Penal. "As consultas públicas não são suficientes. Elas são apenas o início do processo".

Linha do projeto
Na audiência também foi colocada a questão da orientação político-ideológica do projeto. Para Juliana Belloque, o projeto não possui uma linha definidora. “Não dá para dizer que ele é liberal ou conservador.” Ela lembrou que várias votações foram decididas por um ou dois votos.

A ausência de ideologia, porém, foi criticada por um membro da plateia, que afirmou que “a não identificação de uma ideologia é sua própria ideologia, que é o pensamento punitivista”. Ele recebeu aplausos da plateia após a intervenção, com a qual a defensora concordou.

Em relação aos questionamentos de fundo teórico-metodológico apontados por Reale Júnior e René Dotti na primeira parte, Luiz Flávio Gomes discordou de seu colega em alguns pontos e disse que vivemos a era “pós-moderna”, cuja marca é a da “desconstrução”. Segundo o professor, pela primeira vez em 150 anos não nasceu uma nova escola penal após uma geração. “Não temos sequer uma doutrina segura”, disse.

Nesta semana, o senador Pedro Taques (PDT-MT) informou que os senadores poderão apresentar emendas ao Projeto 236/2012, que institui o novo Código Penal, até o dia 5 de outubro. A expectativa é que ele seja aprovado no Senado até meados no ano que vem. Depois disso, ele ainda deverá passar pela Câmara dos Deputados.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!