Bola da vez

Legislativo pode diluir pode de investigação do MP

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12 de junho de 2010, 7h43

O Ministério Público foi escolhido para ser a instituição republicana a ter o seu poder questionado ou ao menos diluído. Pelo menos três propostas de lei investem contra o trabalho da instituição. Uma quer punir promotores que entrarem com Ação Civil Pública, movidos por promoção pessoal ou perseguição política. Outra quer dividir a atribuição do Inquérito Civil entre o Ministério Público e a Polícia. A terceira, prevê a figura do “recurso interno”, que pode ser usado por quem se sentir prejudicado por decisões do MP, na condução de investigação administrativa.

“O Inquérito Civil incomoda muita gente, não há mais dúvida. A Ação Civil Pública incomoda muito mais”, afirma o promotor de Justiça de São Paulo Saad Mazloum. Ele diz que não lembra de ter visto tantas propostas legislativas investindo contra instrumentos que estão cumprindo seu papel social, como é o caso do Inquérito Civil Público e da Ação Civil Pública. “Parece um tsunami”, completa.

A que causou maior reboliço foi o Projeto de Lei 265/2007, de autoria do deputado federal Paulo Maluf (PP-SP). A proposta estabelece punições contra membros do Ministério Público que entrarem com Ação Civil Pública, motivados por promoção pessoal, má-fé ou perseguição política. O projeto prevê que a associação ou membro do Ministério Público, responsável pela ação, deverá pagar multa equivalente a dez vezes o valor das custas processuais, além dos honorários advocatícios.

A proposta gerou protestos de várias entidades. Foi logo chamada de “Lei da Mordaça”. Maluf nega que seu projeto tenha interesses pessoais e afirma que a resistência à discussão do texto é motivada pelos “maus promotores que têm medo da Justiça”. De acordo com o deputado, o debate sobre a proposta que prevê punição a procuradores e promotores que agirem de má-fé é necessário para aperfeiçoar as instituições. Maluf, que é alvo de ações do Ministério Público Federal por suspeita de desvio de dinheiro público, negou que a proposta seja uma represália.

“Não é retaliação. Estou propondo que se vote democraticamente. Não querer votação é tirar a democracia do Brasil. Se é desnecessário, por que ser contra?”, questiona do deputado. “Existem maus padres, maus médicos, maus engenheiros, e por que não podem existir maus promotores?”, completou o questionamento.

Inquérito Civil
A segunda começou a ser discutida esta semana na Câmara dos Deputados. Trata-se do Projeto de Lei 6.745/06. A regra retira do Ministério Público a autonomia e a exclusividade na condução do Inquérito Civil Público. De acordo com o projeto, o inquérito civil poderá ser presidido também por delegado de Polícia e deverá ser submetido, para controle, ao Judiciário, a exemplo do que acontece hoje com os inquéritos policiais.

A proposta é de autoria dos deputados João Campos (PSDB-GO) e Vicente Chelotti (PMDB-DF) e está em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Pela proposta, o Inquérito Civil Público deverá ser submetido à supervisão de um juiz cível. A justificativa é de que a condução exclusiva pelo MP, sem controle jurisdicional, tem resultado em abusos constantes e prejudicado a imagem, a honra e a dignidade das pessoas investigadas.

“A falta do controle jurisdicional sobre atos extremamente importantes para a sociedade, tais como a condução coercitiva de pessoas, requisição de documentos sigilosos geram violências contra os direitos individuais dos cidadãos que apenas a atuação do Conselho Superior do Ministério Público não consegue inibir”, afirma o documento de justificativa encaminhado à Câmara dos Deputados.

Pela proposta, o delegado de polícia também terá competência para instaurar inquérito civil nos casos em que houver indício de prática de crime ou contravenção. A justificativa para a instauração de inquérito civil pela polícia é a de que as autoridades policiais estão mais bem aparelhadas que o MP para a atividade.

Para coibir supostos abusos do Ministério Público, a proposta apresenta três novidades. A primeira prevê a distribuição do inquérito civil instaurado ao juízo cível competente para julgar eventual Ação Civil Pública. Atualmente, o inquérito tramita apenas no âmbito interno do MP e não tem nenhum controle por parte do Judiciário.

A segunda estabelece prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 60, para a conclusão do inquérito civil. Hoje, a legislação não estabelece limite para o encerramento dessas investigações.

A terceira novidade é a alteração da competência para determinar o arquivamento do inquérito civil ou a propositura da ação civil, que atualmente é exercida pelo Conselho Superior do Ministério Público e seria, então, atribuída ao juiz.

Recurso interno
O Projeto de Lei 5.078/09, de autoria do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), prevê uma espécie de “recurso interno”, que pode ser usado utilizado por aqueles que se sentirem prejudicados por decisões do Ministério Público no âmbito do inquérito civil.

Uma emenda do deputado Roberto Magalhães (DEM-PE) acrescentou mais um detalhe, prevendo que o recurso também poderá ser usado quando as ações afetarem direitos individuais ou pessoas jurídicas.

“A Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo já prevê, em seu artigo 108, que da instauração do inquérito civil caberá recurso do interessado ao Conselho Superior, e com efeito suspensivo”, destaca o promotor de Justiça Saad Mazloum, acrescentando que o recurso é cabível apenas contra a instauração do inquérito civil.

Segundo ele, o Projeto 5.078/09 vai bem mais longe, permitindo a interposição de seguidos recursos para questionar cada ato praticado no âmbito do inquérito civil. “Com essa norma será impossível investigar qualquer denúncia”, diz o promotor. O projeto modifica a Lei 7.374/85, que determina que o recurso deverá ser apreciado pelo órgão superior àquele que instaurou o inquérito.

De acordo com o autor, a medida visa evitar o questionamento judicial de pontos que podem ser sanados no âmbito do próprio Ministério Público, pela ação de seus órgãos superiores colegiados. “A atuação revisora dos órgãos superiores do Ministério Público terá um efeito profilático, afastando danos que a formalização de ações temerárias possa vir a causar aos cidadãos”, defende.

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