Recolhimento indevido

Produtor rural tem chances de ser ressarcido

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3 de julho de 2010, 6h18

Grosso modo, a seguridade social é financiada pela contribuição previdenciária devida pelo empregador, incidente sobre a folha de salário, pela contribuição previdenciária devida pelo empregado doméstico e trabalhador avulso, incidente sobre o seu salário de contribuição mensal e pela CSLL e Cofins.

No caso específico dos produtores rurais, a contribuição previdenciária passou a incidir, desde 1997, para as pessoas físicas e, desde 2001, para as jurídicas, sobre a receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural).

Recentemente, no julgamento do RE 363.852, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do artigo 1º, da Lei 8.540/1992, que dera nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II e 30, inciso IV da Lei 8.212/1991.

O caso analisado pelo relator, ministro Marco Aurélio, versava sobre a contribuição previdenciária devida por produtor rural, pessoa física, incidente sobre “a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção” (artigo 25, I e II da Lei 8.212/1991, com as alterações da Lei 9.528/1997).

Em suma, restou decidido nesse precedente que, nos termos do artigo 195, I da CF (na redação anterior à EC 20/1998), salvo previsão constitucional em contrário, não poderia haver cumulação da contribuição diante do mesmo fenômeno jurídico.

Ou por outra, como a Cofins já incide sobre o faturamento, não poderia haver nova contribuição para financiamento da seguridade social incidente sobre a receita da comercialização da produção agrícola. A cumulação do PIS e da Cofins, ambas contribuições incidentes sobre o faturamento ou a receita bruta, é excepcionalmente admitida por contar com autorização constitucional expressa (artigo 239 da CF/88).

Além da dupla oneração da mesma base de cálculo, outros motivos levaram o STF a declarar a inconstitucionalidade da contribuição devida ao Funrural. Ressalta-se, portanto, a violação ao disposto no § 4º do artigo 195 da CF/88, já que a instituição de nova fonte de custeio — receita proveniente da comercialização da produção — somente poderia ser veiculada por meio de lei complementar e a violação da isonomia (artigo 150, II da CF/88), na medida em que, pagando a contribuição sobre o resultado da comercialização dos produtos — e, se contar com empregados, pagando-a tanto sobre a folha de salários quanto sobre o faturamento — o produtor rural receberia tratamento mais gravoso que os demais contribuintes que não têm que arcar com duas contribuições cumulativas sobre a receita e faturamento, a Cofins e a contribuição ao Funrural.

A Constituição Federal permite, também por norma específica, que o produtor rural que exerça sua atividade em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribua mediante aplicação de alíquota sobre o resultado da comercialização da produção (artigo 195, § 8º da CF/88). E não poderia ser diferente, já que por não possuir empregados, essa categoria não teria como apurar e recolher a contribuição sobre a folha de pagamentos.

De acordo com as estimativas da Advocacia Geral da União, essa decisão poderá provocar um desembolso de mais de R$ 11 bilhões pela Previdência, já que os contribuintes terão direito de pleitear a devolução dos recolhimentos indevidos efetuados nos últimos cinco anos. A situação poderá ser agravada ainda mais pelo fato de que a LC 118/2005 que na prática reduziu o prazo prescricional para a restituição de tributos de dez para cinco anos, deve ser aplicada somente aos pagamentos indevidos efetuados após sua vigência, estabelecida em junho de 2005.

Como a jurisprudência está se pacificando nesse sentido, os contribuintes que ajuizarem as ações até junho 2010 contam com grandes chances de obter a restituição dos recolhimentos indevidos efetuados nos últimos dez anos, desde julho de 2000, o que aumentaria o impacto econômico da decisão proferida pelo Supremo.

Apesar de a hipótese analisada pelo STF dizer respeito à contribuição devida pelo produtor rural pessoa física, o empregador rural pessoa jurídica que, desde 2001, por força da Lei 10.256/2001, passou a ter que recolher a contribuição com base na receita bruta, conta igualmente com boas chances de reconhecimento da inconstitucionalidade da exação. Isso porque, tal como no caso do produtor rural pessoa física, a contribuição ao Funrural devida pelo produtor pessoa jurídica tem a mesma base de cálculo da Cofins, desrespeitando a unicidade de incidência à qual apenas a Constituição pode abrir exceção.

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