SEGUNDA LEITURA

Impasse no TRF-3 cria dificuldades administrativas

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

29 de novembro de 2009, 9h55

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O Tribunal Regional Federal da 3ª Região abrange os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul. Seu movimento forense é o maior entre os TRFs, fruto da industrialização e da enorme população paulista. Mas Mato Grosso do Sul, muito embora pouco populoso, tem questões de grande relevância, consequencia de sua situação geográfica estratégica, fronteira com o Paraguai e a Bolívia.

O TRF-3 é composto por 42 desembargadores federais e divide-se em 3 Seções, que por sua vez se desmembram em 10 Turmas. No ano de 2008 foram julgados 459.806 recursos, individual ou coletivamente, ficando 172.393 casos pendentes.
Além de reexaminar as decisões de 328 juízes federais (dados de 2008, em www.cnj.jus.br, Justiça em Números), o TRF decide, também, apelações e agravos de juízes estaduais em matéria previdenciária e em execuções fiscais federais, que se processam na Justiça Estadual onde não há Vara Federal.

Sua administração, todavia, não se limita ao Tribunal. Estende-se a toda a primeira instância da Justiça Federal nos dois estados. São dezenas de subseções judiciárias, que vão de Caraguatatuba, litoral norte de SP, a Corumbá, fronteira com a Bolívia. Segundo dados do CNJ, trabalham 5.589 servidores do quadro efetivo e 8.580 do pessoal auxiliar (www.cnj.jus.br, Justiça em Números, dados de 2008). No total, incluindo juízes, são 14.497 pessoas.

No Tribunal se decidem complexos problemas administrativos, como licitações, locações de prédios, segurança, gestão ambiental, manutenção de veículos, concursos, capacitação de juízes e servidores, relacionamento institucional e por aí vai, em uma infindável sucessão de encargos.

É óbvio que administrar tudo isto exige preparo, experiência e muita vontade de acertar. Não é tarefa fácil. Para que se tenha uma simples ideia, uma empresa como a Tigre possui 2.844 funcionários, a Votorantim Cimentos 4.986, a Unilever 10.294 e a Magazine Luiza 14.062 (Revista Você S/A- Exame, Edição Especial 2009, “150 melhores empresas para você trabalhar”, pgs. 167, 172, 169 e 148 ). Todas, menos que o TRF-3.

Pois bem, esta hercúlea tarefa administrativa fica, basicamente, nas mãos de três pessoas: presidente, vice-presidente e corregedor. Evidentemente, existem outras atividades importantes a cargo de outros magistrados. Por exemplo, direção da Escola da Magistratura, coordenadoria dos Juizados Especiais, participação em bancas de concurso de ingresso na magistratura, Sistema de Conciliação e Ouvidoria. Mas estes, regra geral, dependem daqueles três, principalmente do presidente.

Nesta pirâmide, que inclui toda a primeira instância, existem centenas de cargos em comissão. O diretor-geral no TRF é o ápice das funções administrativas, mas outras tantas são importantíssimas (v.g., Diretoria de Recursos Humanos).
Por tudo isto, torna-se de todo evidente que o sucesso de uma Região da Justiça Federal está diretamente ligado aos que se encontrem nas três posições estratégicas. A eficiência da cúpula irradia-se de cima para baixo de forma positiva, com reflexo direto na otimização da Justiça. E porque esta tarefa é de grande responsabilidade e extenuante, estabelece a Lei Complementar 35/79, no artigo 102, que o seu prazo de duração é de dois anos.

No TRF da 3ª Região promoveram-se eleições para os cargos de direção. Concorreram os desembargadores federais Paulo Octávio Baptista Pereira e Suzana Camargo Gomes. Ambos magistrados de carreira, aprovados no mesmo concurso (1984) e que dedicaram suas vidas à Justiça Federal. Foi eleito Baptista Pereira, por 21 votos contra 19.

Suzana Camargo, invocando impossibilidade legal de o eleito exercer a presidência, após ter sido corregedor e vice-presidente, ingressou com ação judicial no STF (Reclamação 8.025). No dia 24 de abril, o eminente ministro Eros Grau deferiu liminar suspendendo a posse do magistrado eleito e manteve no cargo os que exerciam a administração.

Aqui, propositadamente, não se aprofunda nem se faz a mais remota análise do mérito. Ao STF, no momento próprio, caberá dar a palavra final. Nem de longe se faz qualquer crítica à administração mantida nos cargos, a qual conquistou avanços na administração da Justiça Federal. O que se pretende é comentar a inusitada situação criada.

Passaram-se mais de sete meses do biênio da atual administração e, possivelmente, outros tantos poderão passar. Afinal, quando sobrevier a decisão colegiada, poderão ser interpostos Embargos de Declaração, juntada de votos vencidos, publicações, ciência ao MPF e outras medidas que contribuem para a passagem do tempo.

Quais as consequências desta situação? Bem, a análise é difícil. Até porque possivelmente não existem precedentes. Mas não é difícil avaliar as dificuldades, a hesitação, as dúvidas de todos os magistrados e servidores que ocupam os cargos transitoriamente e não sabem se nele estarão no mês seguinte. Assumirão planos a longo prazo? Criarão novos projetos? Mantêm o ânimo, a garra, elementos indispensáveis ao sucesso de qualquer administração judiciária? Serão recebidos com entusiasmo pelos servidores, que sempre terão em mente que aquilo pode ser suspenso no dia seguinte?

Evidente que o impasse cria dificuldades para uma boa administração da Justiça. E, abstraindo o caso concreto, certamente motivado pelo excesso de trabalho existente no STF, cumpre repensar a validade temporal das decisões judiciais provisórias. Desde a vigência da Lei 4.348/64, busca-se fixar-lhes prazo de vigência (art. 1º, “b”, 90 dias). Sem sucesso. Sabendo-se que não é raro liminares, antecipações de tutela e prisões preventivas perdurarem por meses ou anos, não seria razoável fixar-lhes perda de eficácia automática depois de determinado tempo? Exigir que, para serem mantidas, fossem renovadas em nova e motivada decisão?

Temas como o aqui tratado, envolvendo a administração da Justiça, são do interesse de todos e, por isso mesmo, devem ser mais discutidos, inclusive nos cursos de Direito, na eterna busca de aprimoramento do sistema judicial. 

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