Direito a cultura

Índio tem os mesmos direitos que o não índio, além dos peculiares

Autor

  • Roberto Lemos dos Santos Filho

    é juiz federal auxiliar da Corregedoria do TRF da 3ª Região titular da 5ª Vara Federal Criminal de Santos (SP) mestre e doutorando pela Universidade Católica de Santos pós-graduado em antropologia USC (Universidade do Sagrado Coração) de Bauru (SP).

25 de novembro de 2008, 13h00

A Constituição brasileira reconhece aos índios o direito à alteridade, vale dizer, o direito de terem cultura diferente, relações diferentes e direitos diferentes. A Constituição reconheceu multietnicidade do país, rompeu e relativizou a postura excludente das diferenças, imposta por regras fundadas em ideologia homogeneizante, criadoras do sujeito abstrato, individual e formalmente igual.

Há registros de que ao tempo da chegada do colonizador português ao Brasil existiam entre 1 a 10 milhões de indivíduos. Hoje a Funai estima que entre 100 a 190 mil índios vivem fora de aldeias. Aproximadamente 460 mil índios vivem em aldeias, distribuídos entre 225 sociedades indígenas. O desaparecimento de milhares de índios e suas comunidades é fruto do aniquilamento e subtração das culturas e dos territórios indígenas.

Até o advento da Constituição de 1988 toda a legislação nacional editada sobre os índios tinha como referência situação de transitoriedade dos indígenas, como se o ideal e natural fosse a “evolução” dos índios para os moldes da “doce, pacífica e mansa” cultura dos não índios, estabelecida pelo colonizador europeu. De acordo com a legislação até então posta, os índios eram tratados como fadados ao desaparecimento.

Esse paradigma não pode mais prevalecer. Com efeito, como previsto na Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas, na Convenção 169/OIT e na Constituição, o governo deve garantir os direitos dos índios sobre as terras que ocupam, encontrando formas eqüitativas para a realização de obras necessárias ao desenvolvimento, com respeito às culturas, costumes e práticas tradicionais próprias.

Vale ressaltar que a Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada em setembro de 2007, estabelece que o Estado deve adotar práticas hábeis a evitar a assimilação forçada e a destruição da cultura dos índios. Cumpre destacar, também, que a Convenção 169 da OIT impõe aos Estados signatários o dever de reconhecer que a diversidade étnico-cultural dos povos indígenas deve ser respeitada em todas as suas dimensões.

O direito positivo avançou e a sociedade e os aplicadores do Direito devem garantir eficácia aos instrumentos normativos editados em favor dos índios. Não pode predominar a ultrapassada visão etnocêntrica e integracionista, que cuidava dos índios como categoria obrigada ao desaparecimento. Cabe à União, aos estados, aos municípios e a todos os cidadãos respeitar e fazer respeitar os direitos dos índios.

O direito à alteridade, à diferença, indica que os índios têm os mesmos direitos que os não índios, além daqueles relativos a sua peculiar situação. As terras são fundamentais para a sobrevivência física e cultural dos indígenas, visto eles entenderem ser parte dela, assim como ser a terra parte deles próprios. É preciso que seja alcançada convivência harmônica entre os índios e a comunidade envolvente, e equilíbrio entre o direito ao desenvolvimento e os direitos assegurados aos índios.

Cabe aos poderes constituídos, aos entes federados e aos cidadãos a adoção de meios para tornar efetivas as garantias asseguradas aos índios na Constituição de 1988, na Convenção 169 da OIT e na Declaração das Nações Unidas Sobre os Direitos dos Povos Indígenas, impondo eficácia ao direito à igualdade por intermédio do respeito à diferença, garantindo, dessa forma, o direito à vida em todas as suas formas.

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