Novo marco

Maioridade penal deve ser estabelecida por critério psicológico

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  • é desembargador do TJ-PR mestre em Direito pela PUC-SP doutor em Direito pela UFPR professor titular da Faculdade de Direito dos Campos Gerais diretor da Escola Judicial da América Latina e vice-presidente de Capacitação da Rede Latino-americana de Juízes.

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26 de fevereiro de 2008, 15h48

No 1º Congresso Internacional da Justiça — Uma Justiça para o III Milênio —, realizado nos dias 8 a 10 de dezembro de 1997, em Fortaleza, pela Associação Cearense de Magistrados, tivemos o privilégio de propor a discussão da alteração de alguns pontos do Estatuto da Criança e do Adolescente, em especial os relacionados ao jovem com idade de 18 a 21 anos, assim como a aplicação de medidas concernentes a terapias relacionadas com questões patológicas envolvendo o quadro psíquico e a mantença da idade limite de 18 anos para a responsabilidade criminal, entre outras.

Nossas reflexões em voz alta foram naquela oportunidade ouvidas por magistrados de diversos países que ali se encontravam presentes, dentre os quais da Espanha e, por uma feliz coincidência, exatamente as questões e sugestões por nós dadas a conhecer, estão conforme a lei posteriormente aprovada na Espanha. Com o título A Responsabilidade Penal dos Menores na Espanha e o Estatuto da Criança e do Adolescente publicamos um extenso estudo na Revista dos Tribunais.

A Lei Orgânica 4/1992 espanhola estabelece um marco flexível para que os Juizados de Menores possam determinar as medidas aplicáveis a estes enquanto infratores penais, sobre a base de valorar especialmente o interesse do menor. Simultaneamente, encomenda ao Ministério Fiscal a iniciativa processual e lhe concede amplas faculdades para acordar o término do processo com a intenção de evitar, dentro do possível, os efeitos aflitivos que o mesmo poderia chegar a produzir. Assim mesmo, configura à equipe técnica como instrumento imprescindível para alcançar o objetivo que perseguem as medidas e termina estabelecendo um procedimento de natureza sancionadora e educativa, ao que outorga todas as garantias derivadas de ordenamento constitucional.

Os princípios expostos na moção aprovada unanimemente pela Câmara dos Deputados em 1994, sobre medidas para melhorar o marco jurídico vigente de proteção do menor, referem-se essencialmente ao estabelecimento da maioridade penal aos 18 anos e à promulgação de uma lei penal de menor e juvenil que contemple a exigência de responsabilidade para os jovens infratores que não tenham alcançado a maioridade penal, fundamentada em princípios orientados para a reeducação dos menores de idade infratores, com base nas circunstâncias pessoais, familiares e sociais, conforme assinala a própria exposição de motivos da lei em comento.

Na Espanha, o artigo 19 do vigente Código Penal, aprovado pela Lei Orgânica 10/1995, de 23 de novembro, fixa efetivamente a maioridade penal nos 18 anos e exige a regulamentação expressa da responsabilidade penal dos menores de dita idade em uma Lei independente. Também para responder a esta exigência se aprovou a Lei Orgânica de Responsabilidade Penal do Menor, se bem que o disposto neste ponto no Código Penal deva ser complementado em um duplo sentido. Em primeiro lugar, assenta-se firmemente o princípio de que a responsabilidade penal dos menores apresenta, frente à dos adultos, um caráter primordial de intervenção educativa que transcende a todos os aspectos de sua regulamentação jurídica e que determina consideráveis diferenças entre o sentido e o procedimento das sanções em um e outro setor, sem prejuízo das garantias comuns a todo justiciável. Recomenda-se a leitura do estudo que publicamos e já referido para maior aprofundamento.

A aplicação da lei aos maiores de 18 anos e menores de 21, prevista no artigo 69 do Código Penal, poderá ser acordada pelo juiz atendendo às circunstâncias pessoais e ao grau de maturidade do autor, à natureza e à gravidade dos fatos. Aqui está o que de melhor se pode interpretar em termos de inovação e revolução no sistema penal, a possibilidade de aplicação da legislação menorista ao jovem entre 18 e 21 anos de idade, atendidos tais critérios. Estas pessoas recebem, aos efeitos desta Lei, a denominação genérica de jovens. Regulam-se, expressamente, como situações que requerem uma resposta específica, os pressupostos de que o menor apresente sintomas de alienação mental ou a concorrência de outras circunstâncias modificativas de sua responsabilidade, devendo promover o Ministério Fiscal, tanto a adoção das medidas mais adequadas ao interesse do menor que se encontra em tais situações, como a constituição dos organismos tutelares previstos pelas leis.

Aqui outra grande revolução. O tratamento ambulatorial é uma medida destinada aos menores que dispõem das condições adequadas em sua vida para beneficiar-se de um programa terapêutico que lhes ajude a superar processos aditivos ou disfuncionais significativos de seu psiquismo. Está previsto, para os menores que apresentam uma dependência ao álcool ou às drogas e que em seu melhor interesse possam ser tratados da mesma forma na comunidade, que em sua realização podem combinar-se diferentes tipos de assistência médica e psicológica. Resulta muito apropriado para casos de desequilíbrio psicológico ou perturbações do psiquismo que podem ser atendidos sem necessidade de internamento. A diferença mais clara com a tarefa sócio-educativa é que esta pretende lograr uma capacitação, um logro de aprendizagem, empregando uma metodologia, não tanto clínica, senão de orientação psicoeducativa. O tratamento ambulatorial também pode entender-se como uma tarefa sócio-educativa muito específica para um problema bem definido.

Na conclusão do nosso estudo sustentamos, como hoje, que cabe ressaltar, entre tantas outras reflexões que devem surgir a partir do que adotado pela lei, a primeira delas: a mantença da idade limite em 18 anos, com idade mínima em 14 anos de idade, enquanto existam medidas aplicáveis àqueles entre 18 e 21 anos de idade, o que necessita urgente revisão no sistema pátrio vigente. A segunda, de idêntico quilate e inovadora, qual seja, as medidas aplicáveis ao menor e ao juvenil que padeça de distúrbios psicológicos.

A redução da maioridade penal está na pauta do Senado – A proposta de redução da maioridade penal para 16 anos chega ao plenário do Senado pela primeira vez. A matéria é o terceiro item da pauta da Casa.

Pela proposta, adolescentes entre 16 e 18 anos poderão ser responsabilizados criminalmente em caso de crime hediondo. Para isso, será necessário um laudo técnico atestando que o adolescente tem plenas condições de entender o caráter ilícito do crime cometido.

Por ser uma Proposta de Emenda à Constituição, precisa ser aprovada em dois turnos no plenário antes de seguir para a Câmara dos Deputados. Para isso, são necessários os votos favoráveis de pelo menos 49 dos 81 senadores (três quintos dos parlamentares da Casa). Se esse placar não for atingido, a proposta será arquivada.

O projeto é de autoria do então senador e hoje governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM) e se chegar à Câmara, encontrará outras 20 Propostas de Emenda à Constituição tratando do mesmo assunto. Na Câmara, a mais antiga PEC que trata da redução da maioridade penal, tramita na Casa desde 1993, ou seja, há 15 anos. Até hoje não foi votada por falta de entendimento.

Inicia-se uma grande discussão, a qual entendemos tem um marco teórico correto e que pode ser melhor aproveitado, o do critério psicológico. No Brasil na imprensa e aqueles que desconhecem os critérios de aferição da maioridade penal superficialmente discutem apenas o critério biológico, desconhecendo o critério psicológico.

Parece-me que seria o momento de uma intensa discussão a partir da mantença da idade penal em 18 anos, com a possibilidade de medidas considerando os critérios psicológicos, partindo para um sistema misto, qual seja, o bio-psicológico, cujo projeto de José Roberto Arruda pode ser um interessante marco inicial.

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