Novos rótulos

Bunge tem 30 dias para indicar produtos transgênicos

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27 de setembro de 2007, 21h00

A Bunge tem 30 dias para identificar a presença de soja transgênica nos rótulos de seus produtos. O juiz Francisco Alexandre Ribeiro da Vara de Rondonópolis aceitou o pedido apresentado em Ação Civil Pública pelo Ministério Público Federal em Mato Grosso.

De acordo com o MPF, uma perícia técnica feita pelo Ministério da Agricultura identificou a presença de organismos geneticamente modificados na soja coletada no estoque da filial da Bunge, destinado à industrialização de óleo e outros produtos alimentícios.

O Decreto 4.680/2003 diz que na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, com presença acima de um por cento do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto.

Rotulagem

Um regulamento do Ministério da Justiça de 2003 definiu a forma e as dimensões mínimas do símbolo que comporá a rotulagem tanto dos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal embalados como nos vendidos a granel ou in natura, que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados.

O símbolo, que é formado por uma letra ‘T’ maiúscula inserida num triângulo equilátero, identificará os produtos comercializados. Ele deve estar no painel principal da embalagem, em destaque e em contraste de cores que assegure a correta visibilidade dos consumidores.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária e o Ministério da Agricultura serão informados da decisão e terão que fiscalizar o cumprimento da determinação judicial.

Leia a decisão

PROCESSO 2007.36.02.000701-5

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

VERSUS

UNIÃO, ANVISA E BUNGE ALIMENTOS S.A.

D E C I S Ã O

O autor requereu a concessão de medida liminar que determine à terceira ré, BUNGE, que providencie a inclusão nos rótulos e documentos fiscais de seus produtos, nos termos do art. 40 da Lei 10.105/2005 e do Decreto 4.680/2003, a informação de que eles derivariam de soja transgênica (emenda à petição inicial, fls.53/55).

2. A referida ré, por seu turno, requereu o indeferimento do pedido liminar, ao argumento de que seu produto final não conteria traços de soja transgênica, razão por que não estaria sujeita, segundo o Decreto 4.680/2003, à obrigação de rotulagem (petição à fls.73/81).

3. Os representantes judiciais da União e da ANVISA, embora intimados a se manifestar, não o fizeram, sob o pretexto de não ter interesse jurídico acerca do pedido liminar sob exame (fls.88/89 e 104/105, respectivamente).

4. É o relatório.

5. A princípio, não se verifica nenhuma controvérsia quanto ao fato de que há traços relevantes de OGM (organismos geneticamente modificados) na soja em grãos que é industrializada pela filial da BUNGE em Rondonópolis, conforme apurado no exame administrativo requisitado pelo Ministério Público Federal à Superintendência Federal de Agricultura em Mato Grosso (ofício às fls.48/50).

6. Importa saber, então, se tal fato deve ou não ser informado nos rótulos dos produtos industrializados pela filial da BUNGE neste município.

7. O art. 40 da Lei 10.105/2005 preceitua:

“Art. 40. Os alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de OGM ou derivados deverão conter informação nesse sentido em seus rótulos, conforme regulamento.”

8. A norma é de uma clareza solar: o alimento e o ingrediente alimentar que contiver ou for produzido a partir de OGM ou derivado deverá conter tal informação no respectivo rótulo!

9. Assim, se os produtos que a filial da BUNGE em Rondonópolis-MT afirma produzir – a saber: óleo de soja degomado (destinado ao refino) e farelo de soja (ingrediente alimentar animal) – o são a partir de OGM (soja transgênica), forçoso é convir que devam, sim, ser devidamente rotulados com esta informação. Note-se que a informação não será no sentido de que tais alimentos/ingredientes CONTÊM OGM, mas, sim, que são produzidos A PARTIR DE OGM.

10. A rigor, a tese advogada pela BUNGE é fruto, no meu sentir, da interpretação isolada e literal do quanto disposto no art. 2º, caput, do Decreto 4.680/2003 – mais precisamente no trecho “com presença acima do limite de um por cento do produto”, – editado para regulamentar o direito à informação estatuído no Código do Consumidor em face dos alimentos transgênicos – e o pior -, agravada pelo solene e total descaso pela superveniência de lei especial sobre o assunto (Lei 10.105/2005).

11. Ocorre que o decreto invocado (Decreto 4.680/03), enquanto ato normativo, por força do princípio da legalidade, é absolutamente subordinado à lei em sua função de regulamentá-la, não podendo, sob nenhuma hipótese inovar na ordem jurídica nem muito menos contrariá-la, razão por que, com a edição da Lei de Biossegurança (Lei 10.105/05), restou revogada toda e qualquer disposição legal ou regulamentar com ela incompatível, mormente aquela invocada pela ré, ao menos no sentido que dela tenta extrair, de cunho exclusivamente gramatical.

12. Note-se que a interpretação sistemática do referido decreto chegaria a resultado bem diverso, mais consentâneo com o que veio a ficar estreme de dúvida pela novel lei, qual seja, de que a rotulagem deva informar tanto o percentual de OGM detectável no produto final, quanto aquele encontradiço na respectiva matéria-prima.

13. A par da sensível fumaça do bom direito, antolha-se, ainda, a presença do periculum in mora. O perigo de demora aqui é qualificado pelo evidente risco de perecimento de direito, não, obviamente, do direito objetivo à informação, mas, sim, do subjacente direito subjetivo coletivo de um sem-número de consumidores, o qual, a cada processamento de soja transgênica sem a consectária rotulagem, será, ao longo da demanda, diuturna e reiteradamente vilipendiado, o que, lógica e curialmente, deve ser coarctado, desde logo, à guisa de precaução e prevenção, pelo Poder Judiciário.

14. Diga-se, por fim, que com a edição da Lei de Biossegurança, no que tange à questão dos alimentos transgênicos, o que se espera da agroindústria e da indústria alimentícia, de um modo geral, é uma tomada de posição, clara e transparente, a seu respeito, sem maniqueísmos nem preconceitos. Entretanto, enquanto não se avança nesse campo – mais pertencente à Ética do que ao Direito -, salvantes raras e louváveis exceções no âmbito empresarial, o mínimo que se deve assegurar é o direito à informação do cidadão brasileiro quanto ao conteúdo e à origem do produto alimentício que está comprando, cabendo a ele, aí sim, tomar também a sua posição a favor ou contra os transgênicos.

15. Ante o exposto, defiro o pedido de medida liminar, determinando à BUNGE que providencie a inclusão nos rótulos e documentos fiscais relativos aos alimentos/ingredientes produzidos a partir de soja transgênica (OGM), por intermédio de sua filial de Rondonópolis, a respectiva informação nesse sentido, nos termos regulamentares estatuídos no Decreto 4.680/2003, no prazo de trinta (30) dias. Oficie-se aos órgãos regionais da ANVISA e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, cientificando-lhes da presente decisão e requisitando-se-lhes a fiscalização do respectivo cumprimento. Citem-se e intimem-se os réus, por carta precatória. Intime-se o autor. Publique-se.

Rondonópolis-MT, 27 de setembro de 2007.

FRANCISCO ALEXANDRE RIBEIRO

Juiz Federal

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