Solução de conflitos

Quebra do monopólio da Justiça favorece o cidadão

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11 de maio de 2007, 15h10

O princípio da inafastabilidade do Judiciário na solução dos litígios, inciso XXXV, artigo 5º da Constituição, ampliou a atuação do sistema não só conferindo direito ao lesionado, mas também à ameaça a este direito, constituindo, neste ponto, inovação constitucional. Recrudesceu a judicialização das relações sociais sem melhorar os mecanismos para efetiva solução das demandas.

A situação, inicialmente, era entendida como prestígio para a cidadania, mas o volume de causas desembocadas no Judiciário mostrou outro quadro, porque a morosidade dos serviços judiciários impede a eficácia da justiça e prejudica o consumidor dos serviços judiciários. Com o advento da Constituição cidadã, onde se exige “razoável duração do processo,” inciso LXXVIII, artigo 5º, a desjudicialização passa a ser reivindicação do jurisdicionado.

Além da quebra do monopólio judicial, através de leis, adequadas umas, capciosas outras, aparecem formas alternativas para solução dos conflitos, a exemplo dos juizados especiais, da conciliação, da mediação, etc.

A Lei 8.951/94 introduz novos parágrafos ao artigo 890, do CPC, fazendo renascer as sugestões apresentadas pela Comissão Revisora de 1985. As modificações inserem procedimento que retira da esfera do Judiciário, as consignações em pagamento, quando se tratar de obrigação em dinheiro.

A Lei 9.307/96, Lei da Arbitragem, tornou-se quebra do monopólio jurisdicional estatal, porque delegou a árbitros, escolhidos pelas partes, fora do sistema judicial, a solução de questões, imprimindo-lhes o caráter de coisa julgada. Mais presente nas causas relativas às relações internacionais e na área empresarial, esta lei, apesar de pouco usada, incrementa a solução de muitas demandas sem necessidade de acionar o sistema judiciário.

A Lei 10.931/2004 passou para o campo administrativo a solução de litígios, envolvendo retificação de registro de imóveis. Alterou-se a Lei 6.015/73, para delegar ao oficial competência para fazer retificações no registro do imóvel, agilizando o procedimento para corrigir possíveis erros na matrícula, atividade eminentemente administrativa, antes submetida à burocracia judiciária.

A Lei 11.101/2005, que substituiu a Lei 7.661/45, modernizou o processo falimentar do empresário e da sociedade empresarial, criando a recuperação extrajudicial da empresa, através de procedimento que não envolve o Judiciário, mas permite a negociação entre os credores e a empresa devedora.

Mais recentemente, a Lei 11.441/07 alterou dispositivos processuais para autorizar processo administrativo no inventário, na partilha, na separação e no divórcio consensual. Na prática já existia um procedimento semi-administrativo, no inventário e na partilha, apesar da burocracia que se lhe imprimia. A norma confere maior responsabilidade ao advogado, porque chamado para assistir às partes, na lavratura da escritura.

A mudança contribui para a eficiência da justiça, além de agilizar o procedimento, porquanto necessária apenas a escritura pública, sem audiência e outros atos judiciais que contribuíam para burocratizar o desenlace de situações eminentemente patrimoniais.

Ainda é pouco o efeito na diminuição de causas no Judiciário, quer pela opção oferecida às partes, na separação e no divórcio consensual, quer pelo volume de processos que sairão da esfera judicial, em torno de apenas um por cento.

Outros procedimentos poderão ser desjudicializados, a exemplo do cancelamento de usufruto, da consolidação ou reversão da propriedade, no fideicomisso, da adjudicação compulsória de propriedade imobiliária, da expedição de alvarás, etc. Constata-se que, em torno de 80 por cento dos problemas dos cidadãos, situam-se na área de família, registro público e alvarás. A Lei 11.441/07 poderia ser mais abrangente e simplificar tais questões, como se fez no inventário, na separação e no divórcio.

Os débitos fiscais, por exemplo, são apurados, lançados e inscritos na dívida ativa pela administração, mas a norma não lhe permite efetivar a cobrança, providência que deveria competir ao próprio fisco. Aliás, já há precedentes, neste sentido, a exemplo da Caixa Econômica Federal que faz a execução extrajudicial de seus créditos, relativos ao financiamento de imóveis.

O Decreto-Lei 911/69, que alterou a Lei 4.728/65, estabelece normas processuais sobre alienação fiduciária de bens móveis e permite ao credor alienar o bem apreendido, sem necessidade de intervenção do Judiciário.

A Lei 9.514/97, seguindo o mesmo rumo do Decreto-Lei 911/69, instituiu a venda extrajudicial de imóveis financiados e apreendidos. A preocupação do legislador tanto em um como no outro caso, limitou-se a garantir o capital do investidor, sem demonstrar cuidado algum com o financiado. De qualquer forma, constituem exemplos de leis que desjudicializam tais relações comerciais.

Para êxito da desjudicialização, o Ministério Público seria convocado para funcionar como órgão competente para fiscalizar a legalidade do procedimento que se entendesse extrajudicial, como já ocorre na habilitação para o casamento.

Nosso sistema judicial peca quando prioriza vantagens para os operadores do Direito em detrimento dos interesses dos protagonistas principais, os jurisdicionados. Buscam facilidades para acesso às promoções dos juizes ou mercado de trabalho para os advogados sem observar as conveniências do usuário dos serviços públicos. Este descuido, a morosidade, a falta de estrutura, etc., são causas do descrédito do Judiciário.

As empresas, o Poder Executivo e os maus pagadores usam da lentidão do Poder Judiciário para obter vantagens indevidas.

A vontade do cidadão não prevalece quando depara com um conflito, seja de que natureza for, porque obrigado a buscar o Judiciário. O melhor, entretanto, seria não disponibilizar a máquina estatal indevidamente, mas permitida somente quando necessária para dirimir conflito não patrimonial e substituir a vontade das partes, através da força coercitiva do Estado.

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