Controle da garantia

Empresa que administra FGTS do empregado arca com correções

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26 de junho de 2007, 0h01

A empresa que continua a administrar os valores do Fundo de Garantia de seu empregado deve arcar com as correções. O entendimento é da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região (MG), que condenou a União Brasileira de Educação e Ensino a pagar R$ 13,4 mil, corrigidos até 31 de agosto de 2005, a um ex-funcionário.

O juiz convocado, João Bosco Pinto Lara, ressaltou que a Lei 7.839/89 instituiu a migração das contas bancárias vinculadas à Caixa Econômica Federal. Entretanto, apesar de a instituição de ensino ter passado a depositar o valor do FGTS junto à Caixa Econômica, o valor depositado entre agosto de 1977 a novembro de 1989, continuou sob seu controle, efetuando o pagamento apenas quando o funcionário foi dispensado.

Para ele, “ao permanecer administrando o saldo do FGTS do autor no período acima declinado, sem transferir os valores respectivos para a conta vinculada junto à CEF, a ré assumiu a responsabilidade pela correção monetária e aplicação dos juros de mora conforme os índices devidos, inclusive os chamados expurgos inflacionários”.

Leia a decisão

ACÓRDÃO

Processo : 00854-2006-041-03-00-9 RO

Data de Publicação : 14/06/2007

Órgão Julgador : Sexta Turma

Juiz Relator : Juiz Convocado Joao Bosco Pinto Lara

Juiz Revisor : Desembargadora Emilia Facchini

RECORRENTE: UNIÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E ENSINO – UBEE

RECORRIDO: JORGE ORLANDO PEGHINI

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, oriundos da 1ª Vara de Trabalho de Uberaba, em que figuram, como recorrente, UNIÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E ENSINO – UBEE e, como recorrido, JORGE ORLANDO PEGHINI.

RELATÓRIO

O MM. Juiz da 1ª Vara do Trabalho de Uberaba julgou procedente, em parte, a ação, para condenar a reclamada a pagar a importância de R$ 13.377,86, atualizada até 31.ago.2005, correspondente às diferenças de FGTS devidas durante o curso do contrato de trabalho. Custas e honorários periciais pela reclamada (fs. 770/777).

Embargos de declaração pelo reclamado (fs. 778/787), julgados improcedentes (fs. 788/789).

Recorre a reclamada, alegando a prescrição do direito de pleitear os expurgos inflacionários e julgamento extra petita e ausência de responsabilidade pelo pagamento respectivo (fs. 790/805). Custas e depósito recursal recolhidos (fs. 806/807).

Contra-razões pelo reclamante (fs. 812/815).

Tudo visto e examinado.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Preenchidos os pressupostos intrínsecos (cabimento, legitimação para recorrer, interesse em recorrer, e inexistência de fato impeditivo ou extintivo ao poder de recorrer) e extrínsecos (tempestividade, regularidade formal, quitação das custas e depósito recursal), conheço do recurso.

2. MÉRITO

Inverto a ordem de apreciação das matérias, apreciando primeiramente as de caráter prejudicial.

2.1. Julgamento extra petita

Alega a reclamada que a sentença extrapolou os limites dos pedidos do autor ao deferir diferenças por aplicação dos expurgos inflacionários, não obstante tenha admitido que isto não é postulado na inicial.

Sem razão. Em primeiro lugar, esclareça-se que a condenação diz respeito à aplicação dos juros e atualização monetária (inclusive aqueles decorrentes dos chamados expurgos inflacionários) sobre o FGTS devido entre ago.1977 a nov.1989.

Na inicial o reclamante alegou, dentre outros fatos, que o FGTS não era corrigido conforme os índices aplicados à sua época (f. 14), postulando as diferenças daí advindas. Neste aspecto, a condenação não extrapola a inicial, pois as diferenças envolvem justamente a não-aplicação de índices devidos à época, ainda que reconhecidos posteriormente.

Desnecessário que o reclamante postulasse, de forma específica, a incidência dos expurgos inflacionários sobre as parcelas de FGTS geridas pela recorrente, mesmo porque o pedido formulado é mais amplo, compreendo tal matéria.

Rejeito.

2.2. Prescrição

A reclamada invoca a prescrição do direito de reivindicar diferenças de expurgos inflacionários, tendo em vista que a ação foi proposta em 2006 e o prazo prescricional iniciou-se com a edição da Lei Complementar nº 110/2001.

Inicialmente, faz-se necessário um breve histórico dos autos.

Para apuração das diferenças de FGTS foi determinada em audiência a realização de perícia contábil (f. 697).

O laudo foi elaborado de forma minuciosa, evidenciando dois períodos com distintos sistemas de recolhimento. Com relação ao período de ago.1977 a nov.1989, o perito esclareceu que não houve depósitos na conta vinculada, tendo a reclamada retido os valores respectivos, efetuando seu pagamento quando da rescisão contratual. Com base no índice JAM, apurou o valor que deveria estar em conta vinculada caso os depósitos tivessem sido efetuados a tempo e modo, inclusive em relação aos índices dos expurgos inflacionários, tendo constatado diferença de R$ 13.377,86 (fs. 711/712).

Neste período, em que a gestão do FGTS não incumbia à CEF, a reclamada procedeu à retenção dos valores devidos, responsabilizando-se pela correção dos depósitos, segundo legislação específica (art. 3º da Lei nº 5.107/66). A partir da Lei nº 7.839/89, instituiu-se a migração das contas bancárias vinculadas à CEF, então órgão gestor. Embora a ré tenha passado a depositar o FGTS junto à Caixa, manteve, com relação ao período anterior, o controle do saldo devido e incidência da correção monetária e juros de mora (fs. 189/203), efetuando o pagamento do que entendia devido a esse título no momento da dispensa.

Tais aspectos já evidenciam a inaplicabilidade do entendimento consubstanciado na O.J. nº 344 da SDI-1 do TST. Somente se pode falar em prescrição bienal após a extinção do contrato de trabalho (art. 7º, XXIX, da CF/88), mesmo porque, no caso específico dos autos, o direito somente surgiu com a rescisão contratual, quando foram então pagos, de forma parcial, os valores relativos ao chamado FGTS – Filantropia. Pelo princípio da actio nata, não há prescrição, considerando que a ação foi proposta em 14.jul.2006.

Ademais, ressalte-se que mesmo nos casos de diferenças de saldo de FGTS sob a gestão da CEF, a O.J. nº 344 da SDI-1 do TST não tem aplicação nos casos de rompimento do contrato de trabalho ocorrido após a edição da referida Lei Complementar.

Nada a prover.

2.3. Diferenças de FGTS

Como exposto acima, as diferenças deferidas relacionam-se à incorreção da aplicação dos índices de correção monetária devidos sobre os valores de FGTS referentes ao período de ago.1977 a nov.1989, cujo saldo não foi depositado em conta vinculada da CEF, mas administrados pela recorrente e pagos no momento da rescisão contratual.

Insurge-se a recorrente, dizendo que administração do FGTS filantrópico possui base legal, que a condenação implica bis in idem e que devem ser satisfeitos os pressupostos da Lei Complementar nº 110/01.

A questão foi bem abordada pelo juízo de primeiro grau. Ao permanecer administrando o saldo do FGTS do autor no período acima declinado, sem transferir os valores respectivos para a conta vinculada junto à CEF, a ré assumiu a responsabilidade pela correção monetária e aplicação dos juros de mora conforme os índices devidos, inclusive os chamados expurgos inflacionários. Independente da licitude do procedimento adotado, deve ela responder pela correta aplicação dos índices devidos, pois não há dúvida que se caso o FGTS de ago.1977 a nov.1989 fosse transferido para a conta gerida pela CEF, o autor faria jus a todos eles, inclusive aqueles tratados pela Lei Complementar nº 110/2001.

Obviamente que o complemento de atualização monetária tratado na referida lei seria de responsabilidade da CEF caso o FGTS relativo a este período estivesse sob sua gestão. Como o valor era administrado pela ré, a recomposição deve ocorrer às suas expensas.

O direito à recomposição dos expurgos de índices inflacionários levados a efeito pelos planos econômicos governamentais é inequívoco, tendo em conta que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça (por ex., ARG-AI-313628-SC, 1ª T., Rel. Ministro Milton Luiz Pereira, D.J. de 25.jun.2001, p. 133; RE-228652-SP, 1ª T., Rel. Ministro José Delgado, D.J. de 17.dez.1999, p. 335), reconheceram o direito à correção do saldo da conta vinculada do FGTS, correspondente aos expurgos inflacionários advindos dos planos econômicos Verão e Collor, o que apenas veio a ser confirmado pelo Governo Federal, com a edição da Lei Complementar nº 110/01.

Neste prisma, irrelevante o não cumprimento dos requisitos impostos no art. 4º da citada lei ou a adesão aos termos fixados, obstado que está pelo sistema adotado pela ré.

Também não se há falar em bis in idem, porque ausente qualquer pagamento feito ao mesmo título ao reclamante. O pagamento dos adicionais instituídos pela aludida lei e os argumentos sobre a socialização da obrigação por ela tratada são irrelevantes, pois tais adicionais não se reverteram ao reclamante no que tange ao FGTS de ago.1977 a nov.1989. O autor não pode ser prejudicado pela opção feita pela reclamada. O inconformismo contra a imposição de obrigações pelo Estado é inócuo nesta seara.

Correta a sentença.

3. CONCLUSÃO

O TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA TERCEIRA REGIÃO, por sua Sexta Turma, à vista do contido na certidão de julgamento (f. retro), preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso; no mérito, sem divergência, negou-lhe provimento.

Belo Horizonte, 04 de junho de 2007.

JUIZ CONVOCADO JOÃO BOSCO PINTO LARA

Relator

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