Indenização não é renda

Juros de mora em ação trabalhista é verba indenizatória

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7 de junho de 2007, 0h00

Os juros de mora em ação trabalhista configuram verba indenizatória. Por isso, estão isentos de tributação no Imposto de Renda. O entendimento, com base no Código Tributário Nacional, é do desembargador Antônio Albino Ramos de Oliveira, da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (SC). Ele negou recurso à Fazenda Nacional, condenada a restituir valores recolhidos no IR sobre juros recebidos em condenação trabalhista em favor de Célio Rodolfo Muller.

O relator Albino Ramos de Oliveira destacou ainda que as indenizações que não geram acréscimo patrimonial ao trabalhador não configuram fato gerador do Imposto de Renda. Ele foi acompanhado pelos demais desembargadores da Turma.

No recurso, a Fazenda Nacional alegou que o parágrafo 3º do artigo 43 do Decreto 3.000/99 classifica os juros como rendimento de trabalho assalariado. Afirmou também que as diferenças recebidas têm natureza salarial, então, por óbvio, os juros de mora a elas relativos têm natureza salarial. Com isso, a Fazenda concluiu que esses valores configuram acréscimo patrimonial sujeito à tributação.As alegações não foram aceitas.

Os advogados do trabalhador, Kassiano Costa Machado e Karine Siqueira da Silva, do escritório Naschenweng Advogados Associados, alegaram que o decreto regulamentado é inferior ao Código Tributário Nacional e não deveria servir como argumento. Defenderam também que os juros têm natureza indenizatória e não gera riqueza nova.

Para negar o pedido da Fazenda Nacional, o desembargador esclareceu que “os juros têm notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida ou endividamento para cumprir seus próprios compromissos. A indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, aquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba, portanto, qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda”, finalizou.

A Fazenda, se não recorrer às instâncias superiores, terá de ressarcir em cerca de R$ 27,8 mil o trabalhador, além de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação.

Leia o recurso

APELAÇÃO CÍVEL 2006.72.00.012059-2/SC

RELATOR: Des. Federal ANTONIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO: Simone Anacleto Lopes

APELADO: CELIO RODOLFO MULLER

ADVOGADO: Kassiano Costa Machado e Karine Siqueira da Silva

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 04A VARA FEDERAL DE FLORIANÓPOLIS

EMENTA

TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – INCIDÊNCIA SOBRE JUROS DE MORA PAGOS EM VIRTUDE DE CONDENAÇÃO JUDICIAL IMPOSTO POR SENTENÇA PROFERIDA EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA – INADMISSIBILIDADE.

1 – O art. 16 da Lei nº 4.506/64 deve ser interpretado à luz do art. 43 da Lei nº 5.172//66, que lhe é posterior e instituiu o Código Tributário Nacional. De acordo com este último dispositivo, as indenizações que não acarretam acréscimo patrimonial não configuram fato gerador do imposto de renda.

2 – Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito. Inteligência do art. 404 do Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002).

3 – No caso de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos, a indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda.

4 – O Código Civil de 2002 não contém norma que diga expressamente que o acessório segue a sorte do principal, como havia no Código de 1916. Essa regra continua vigente por uma questão de lógica. Não se aplica, entretanto, em toda a sua amplitude, quando a natureza do principal é distinta da do acessório.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de maio de 2007.

Des. Federal ANTÔNIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA

Relator

APELAÇÃO CÍVEL 2006.72.00.012059-2/SC

RELATOR: Des. Federal ANTONIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

ADVOGADO: Simone Anacleto Lopes

APELADO: CELIO RODOLFO MULLER

ADVOGADO: Kassiano Costa Machado e outros

REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 04A VARA FEDERAL DE FLORIANÓPOLIS

RELATÓRIO

Celio Rodolfo Muller ajuizou ação ordinária contra a União, visando a restituição dos valores descontados a título de imposto de renda incidente sobre os juros moratórios pagos em virtude de condenação judicial imposta por sentença proferida em reclamatória trabalhista. Alega que os juros moratórios têm natureza indenizatória e não constituem riqueza nova, o que afasta a incidência do art. 43 do CTN, I e II, do CTN. Alega, ainda, que é ilegal o § 3º do art. 43 do Decreto nº 3000/99, que classifica os juros como rendimento de trabalho assalariado.

A União contestou a ação. Aduziu que o art. 43, § 3º, do Decreto nº 3000/99, ao determinar a incidência do imposto de renda sobre os juros moratórios, apenas regulamentou o disposto no art. 16, parágrafo único, da Lei nº 4.506/64. Aduziu, ainda, que o juro representa rendimento do capital e que o “elemento do juro” é a remuneração, “base da tributação do Imposto de Renda”.

Sobreveio sentença que julgou procedente o pedido para “declarar a inexigibilidade do imposto de renda sobre juros de mora” e condenar a União “a restituir ao autor os valores recolhidos a título de imposto de renda incidente sobre a parcela recebida em ação trabalhista, relativa a juros de mora decorrente do pagamento de horas extras e reflexos em atraso – fl. 48”, tudo corrigido monetariamente pela taxa SELIC. Condenou a União ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.

Apelou a União, aduzindo que, a teor do art. 92 do Código Civil de 2002, os juros são bens acessórios em relação ao valor principal pago na reclamatória trabalhista, de modo que, se “as diferenças recebidas têm natureza salarial, então, por óbvio, os juros de mora a elas relativos têm natureza salarial, e, sendo assim configuram acréscimo patrimonial sujeito à tributação por parte do imposto de renda”.

Com contra-razões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

Des. Federal ANTÔNIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA

Relator

VOTO

1 – De início, cumpre examinar o parágrafo único do art. 16 da Lei nº 4.506, de novembro de 1964, invocado pela União, em sua contestação, como fundamento de validade do § 3º do art. 43 do Decreto nº 3000/99. Dispõe esse dispositivo:

“Parágrafo único. Serão também classificados como rendimentos de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo.”

O texto legal em exame trata os juros decorrentes de atraso no pagamento das remunerações em geral como indenização. Classifica-os, entretanto, como rendimento de trabalho assalariado.

O art. 16 da Lei nº 4.506/64 deve ser interpretado à luz do art. 43 da Lei nº 5.172//66, que lhe é posterior e instituiu o Código Tributário Nacional. De acordo com este último dispositivo, as indenizações que não acarretam acréscimo patrimonial não configuram fato gerador do imposto de renda. Tudo depende da natureza do bem jurídico a que se refere a indenização. Se o pagamento em dinheiro apenas reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, não há aumento no patrimônio material. Nesse sentido: REsp 786769/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 03.04.2006, p. 276.

2 – Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito, e como tal conceituados no art. 404 do vigente Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002):

“Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.”

Outro não era o tratamento dado à matéria pelo art. 1.061 do Código Civil de 1916:

“Art. 1.061. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da mora e custas, sem prejuízo da pena convencional.”

A única inovação trazida pelo Código Civil de 2.002 foi a possibilidade de o juiz conceder indenização suplementar caso os juros de mora não cubram o prejuízo do credor – o que vem, mais uma vez, ressaltar o caráter indenizatório desses juros.

Cuida-se, aqui, de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos. A indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba, portanto, qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda.

3 – O Código Civil de 2002 não contém norma que diga expressamente que o acessório segue a sorte do principal, como havia no Código de 1916. Essa regra continua vigente por uma questão de lógica. Não se aplica, entretanto, em toda a sua amplitude quando a natureza do principal é distinta da do acessório, como no caso dos autos.

Em face do exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

É o voto.

Des. Federal ANTÔNIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA

Relator

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