Profissões trocadas

TRT garante a operador de rádio direitos de radialista

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21 de julho de 2007, 0h00

A Concessionária do Sistema Anhangüera — Bandeirantes, mesmo não sendo uma empresa de radiodifusão, foi condenada a pagar verbas trabalhistas próprias da profissão de radialista a um de seus operadores de rádio de circuito fechado.

A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas) aplicou ao caso a Lei 6.615/78 que regulamenta a profissão de radialista e reconheceu o direito à redução da jornada de trabalho de oito para cinco horas diárias ao trabalhador. A empresa terá de pagar três horas extras diárias acrescidos dos reflexos, de juros e correção. O relator foi o juiz Jorge Luiz Costa. Cabe recurso.

O juiz ressaltou que se considera empresa de radiodifusão, para os efeitos desta lei, aquela que explora serviços de transmissão de programas e mensagens, destinada a ser recebida livre e gratuitamente pelo público em geral, compreendendo a radiodifusão sonora (rádio) e radiodifusão de sons e imagens (televisão). Certamente este não é o caso da concessionária de rodovia que emprego o trablhador favorecido pela decisão do juiz.

No processo, o funcionário alegou que exercia a função de radialista, já que trabalhava, durante toda a sua jornada, operando na base de radiodifusão da empresa. Ele trabalhou de 1999 a fevereiro de 2004 e como foi dispensado sem justa causa recorreu à Justiça. Solicitou diversas verbas trabalhistas e o reconhecimento do direito a uma jornada de trabalho de cinco horas diárias como previsto na Lei dos Radialistas.

A empresa contestou. Afirmou que não tem como atividade preponderante a radiodifusão, que grande parte da jornada do funcionário era despendida em outras atividades, que a comunicação, via rádio, se dava apenas com “resgatistas” e “socorristas”. Alegou, ainda, que a jornada de oito horas foi objeto de negociação coletiva, para possibilitar o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento.

Na primeira instância, a 2ª Vara do Trabalho de Jundiaí (SP) negou o direito à limitação da jornada de trabalho em cinco horas diárias sob o argumento de que a empresa reclamada não se enquadrava como sendo de radiodifusão.

O trabalhador recorreu da decisão. O TRT considerou irrelevante o fato de a empresa não ser de radiodifusão. Os juizes entenderam que basta a operação de rádio de circuito fechado para caracterizar a necessidade de uma jornada de trabalho de cinco horas diárias para os funcionários que tivessem como atividade a operação do instrumento.

Assim, a decisão de primeira instância foi reformada e a empresa condenada a pagar três horas extras diárias acrescidos dos reflexos, de juros e correção.

Segundo o advogado do trabalhador, Tibério Amaral Cunha, do Amaral Cunha Advocacia, a tese defendida buscava reconhecer uma carga horária inferior àquela efetivamente executada por entender que “operador de rádio”, assim como um radialista típico, utiliza exaustivamente a própria voz em sua atividade de trabalho, merecendo por isso uma jornada de trabalho que proteja a sua saúde como ocorre não apenas com radialistas, mas também com telefonistas e músicos.

Leia a íntegra

PROCESSO TRT 15ª REGIÃO 00466-2005-021-15-00-7

RECURSO ORDINÁRIO

1º RECORRENTE: LUIZ EDUARDO FARIA RIBEIRO

2º RECORRENTE: CONCESSIONÁRIA DO SISTEMA ANHANGÜERA-BANDEIRANTES S.A.

ORIGEM: 2ª VARA DO TRABALHO DE JUNDIAÍ

RADIALISTA. JORNADA REDUZIDA. EMPRESA QUE NÃO TEM COMO ATIVIDADE PREPONDERANTE A RADIODIFUSÃO. IRRELEVÂNCIA. Se a empregadora, embora não tendo como atividade preponderante a radiodifusão, mantém esse tipo de serviço, mesmo em circuito fechado, os empregados que se ativam no respectivo setor, como operadores de rádio, se preenchidos os demais pressupostos legais, são considerados radialistas locutores, por aplicação da alínea “d”, do parágrafo único, do art. 3º, da Lei nº 6.615, de 16 de dezembro de 1978, sujeitos, portanto, à jornada reduzida prevista no inciso I, do art. 18, da mesma lei. Direito à jornada reduzida reconhecido. Recurso provido.

Inconformadas com a r. sentença de fls. 469/474, cujo relatório adoto, e que julgou parcialmente procedente a ação, recorrem ambas as partes. O reclamante, por meio das razões de fls. 481/491, argumentando que a participação nos lucros deveria ter sido deferida, pois além de prevista na norma coletiva da categoria, foi paga a outros empregados da reclamada; que a ausência do pagamento da participação nos lucros induz o deferimento da multa do art. 477, parágrafo 8º, da CLT e que deveria ter sido aplicada, ao caso, a limitação de carga horária prevista na Lei nº 6.615/78, já que a reclamada estava enquadrada em seu art. 3º, parágrafo único, alínea “d”. A reclamada, por sua vez, pelas razões de fls. 504/508, pretendendo o afastamento dos reflexos das horas de intervalo suprimido.

Contra-razões, pela reclamada, às fls. 498/501.

É o relatório.

V O T O

Conheço dos recursos, porquanto regularmente processados.

Recurso do reclamante.

Participação nos lucros. Multa do art. 477, par. 8º, da CLT.

O acordo coletivo de 2002/2003, complementado por seu adendo (fl. 159), previu, em sua cláusula 77ª, a participação dos empregados da reclamada nos lucros e resultados, estabelecendo, no que interessa ao caso, o seguinte:

“A empresa manterá a política de Participação nos lucros ou Resultados, nas formas da Lei 10.101 de 20/12/00, conforme descrição do programa, devidamente assinada pelo representante dos trabalhadores indicado pelo Sindicato, na forma do art. 2º, I, da referida lei…”.

Posteriormente, a reclamada e o sindicato representante da categoria profissional do reclamante elaboraram, conjuntamente, nos termos da cláusula mencionada, o “Plano de Participação nos Resultados”, que basicamente o condicionava ao atingimento de metas.

E a alegação defensiva, para justificar o não pagamento da participação nos lucros ao reclamante, foi exatamente no sentido de que ele não “atingiu as metas para o seu cargo”.

Entretanto, em momento algum a reclamada disse quais foram as metas previstas ou impostas ao reclamante, como condição para o recebimento da participação nos lucros e, apesar de ter dito, seguindo o que determinava o plano aludido, que o valor de tal participação, “a ser pago a cada um dos empregados tem por base a avaliação individual de seu desempenho, a qual é realizada por seu supervisor”, não juntou aos autos essa avaliação. Ou seja, a reclamada não afirmou qual seria a meta a ser atingida pelo reclamante, nem provou, como lhe competia, que a avaliação realizada pelo superior do reclamante, tivesse sido de qualquer modo negativa.

Por outro lado, o preposto confessou, à fl. 163, que “foi paga a verba participação nos lucros aos empregados no ano de 2003”, apesar de não ter sabido informar o valor respectivo, nem se ela foi paga aos operadores, função desenvolvida pelo reclamante, enquanto a testemunha patronal, que também desenvolvia essa mesma função, disse ter recebido a verba (fl. 164).

Assim, provejo o recurso, para deferir ao reclamante a participação nos lucros e resultados, que deveria lhe ter sido paga no mês de maio de 2003 (item 2.1, fl. 425) e, por falta de outros parâmetros para sua fixação, determino que ela seja paga em valor idêntico ao quitado à testemunha Luiz Roberto Favato, que também exercia a função de operador de rádio.

Indevida, no entanto, a multa do art. 477, parágrafo 8º, da CLT, por não se tratar, a participação nos lucros, de verba tipicamente rescisória.

Horas extras. Jornada reduzida.

O reclamante afirmou, na inicial, que exercia a função de radialista, já que trabalhava, durante toda a sua jornada, operando base de radiodifusão.

Defendendo-se, a reclamada limitou-se a dizer que não tem como atividade preponderante a radiodifusão, que grande parte da jornada do reclamante era despendida em outras atividades, que a comunicação, via rádio, se dava apenas com “resgatistas” e “socorristas” e que as jornadas foram objeto de negociação coletiva, para possibilitar o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento (fls. 185/189).

Contudo, no que tange à alegação de que o obreiro desempenhava outras atividades, na maior parte de suas jornadas, a própria testemunha patronal disse que “a prioridade do trabalho é junto ao rádio; no CCO existem monitores, telões e terminal de computador; raras vezes trabalham em outras tarefas, já que a prioridade é o rádio…” (fl. 164), no que foi secundada pelo depoimento da única testemunha obreira, conforme o qual “o reclamante trabalhava continuamente no rádio”.

O fato de a reclamada não ter como atividade preponderante a radiodifusão, com a devida vênia do juízo de origem, não impedia o reconhecimento da jornada reduzida prevista no art. 18, I, da Lei nº 6.615, de 16 de dezembro de 1978, pois a alínea “d”, do parágrafo único, do art. 3º, da mesma lei, considera também como empresa de radiodifusão, “a entidade privada e a fundação mantenedora que executem serviços de radiodifusão, inclusive em circuito fechado de qualquer natureza”.

É bem por isso, aliás, que o C. Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar caso semelhante ao aqui tratado, já decidiu, em acórdão assim ementado:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPRESA QUE NÃO SE DEDICA PREPONDERANTEMENTE À RADIODIFUSÃO. APLICAÇÃO DA LEI Nº 6.615/78. Estabelecendo a Lei 6.615/78 que considera-se igualmente para seus efeitos empresa de radiodifusão, a entidade que execute serviços de radiodifusão, inclusive em circuito fechado de qualquer natureza e, tendo sido consignado pelo Tribunal Regional que o reclamante, radialista, exerceu funções relacionadas com sua atividade profissional, certamente que a reclamada se equipara a entidade privada que executa serviços de radiodifusão pela aplicação do art. II do par. 1º do art. 173 CF. Agravo de Instrumento não provido. (TST-AIRR 80803/2003-900-01-00.9, 1ª Turma, rel. Juíza Convocada Maria Doralice Novaes, DJ 10/12/2004).

No mesmo sentido: AIIR 413/2003-010-04-40.5.

Também não impedia o reconhecimento da jornada reduzida, o fato de a reclamada ter pactuado norma coletiva autorizando o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, já que, por esse meio, não é possível flexibilizar os termos do art. 18 da Lei nº 6.615/78, haja vista que, além de visar à proteção da saúde do trabalhador radialista, principalmente sua voz, o que a tornaria, por si só, de aplicação cogente, ela não abre essa possibilidade.

E ainda que o reclamante não fosse um radialista típico, o que se admite apenas para argumentar, ser-lhe-ia aplicável, analogicamente, a jornada prevista para esse tipo de trabalhador, dada a inegável semelhança entre as atividades desenvolvidas por eles (art. 8º da CLT).

Por tudo isso, reconheço que o reclamante faz mesmo jus à jornada reduzida prevista no dispositivo legal por último mencionado, motivo pelo qual defiro-lhe o adicional de 50% incidente sobre todas as horas excedentes da 5ª diária, até o limite de três por dia (inicial), com reflexos em RSRs, aviso prévio, natalinas, férias + 1/3 e FGTS + 40% e com a observância da evolução salarial e do divisor 150.

Recurso da reclamada

Entendo, particularmente, que não é a natureza salarial de uma verba trabalhista que provoca reflexos em outras, mas sim a habitualidade com que é paga, a gerar a estabilidade financeira.

Assim, a meu ver, as horas de intervalo suprimido, embora de natureza indenizatória/punitiva, quando habituais, devem integrar a remuneração do trabalhador para todos os fins, produzindo tais reflexos.

Entretanto, por uma questão de disciplina judiciária, rendo-me ao entendimento já pacífico desta C. Câmara, no sentido de que, por terem natureza indenizatória, aludidas horas não refletem nas demais verbas da contratualidade.

Destarte, provejo o recurso, para excluir da condenação os reflexos aludidos.

C O N C L U S Ã O

Posto isso, decide este relator conhecer dos recursos, dar provimento ao da reclamada, para excluir da condenação os reflexos das horas de intervalo suprimido e dar parcial provimento ao do reclamante, para acrescer à condenação a participação nos lucros e resultados e o adicional de 50% incidente sobre as horas excedentes da 5ª diária, mas limitadas a três por dia, mantendo, no mais, a r. decisão de origem, nos termos da fundamentação.

Jorge Luiz Costa

Juiz Relator

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