Crime no Brasil

Cada estado poderia ter a sua própria legislação penal

Autor

  • Marcelo Queiroz

    é especialista em Direito membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC) e do do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).

19 de fevereiro de 2007, 23h00

O bárbaro crime que aconteceu no último dia 7 de fevereiro, que resultou na morte do pequeno João Hélio Fernandes de seis anos, após ter ficado preso pelo cinto de segurança e ser arrastado por sete quilômetros durante o assalto de carro da família no bairro de Osvaldo Cruz, subúrbio do Rio de Janeiro, além de espalhar um grande pesar por todo o Brasil, reacendeu um debate que de tempos em tempos assola nossa sociedade: a diminuição da maioridade penal.

Estudiosos sobre questões relativas à criança e ao adolescente colocam um ponto sofismático que freia esses momentos de grande comoção. A diminuição da maioridade penal resolveria por si só o problema? Decerto que um problema tão grave não se exauriria com um “simples toque de mágica legislativa” muito menos se tratando do sistema jurídico brasileiro.

Um dos cinco envolvidos no crime é de menoridade. Com 16 anos, confessou o crime calmamente e, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, ele responderá por latrocínio (roubo seguido de morte). Porém, só poderá ficar detido por no máximo três anos. O criminoso será encaminhado à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) e deverá cumprir medida sócio-educativa, recuperando a liberdade em 2010.

Com essa barbárie na nossa Constituição, todos estão revoltados, inclusive os pais, que após dar entrevistas, revelam que defendem a redução da maioridade penal e leis específicas para estados mais violentos. Segundo o pai do menino brutalmente morto, Élson Lopes Vieites, tem de rever a legislação. “O Rio de Janeiro, como um dos estados mais violentos, tem de ter uma legislação específica. Se menores de 18 anos cometem crimes bárbaros, eles têm, sim, que ser punidos. Não podem esperar mais três anos para depois cometerem outros crimes piores”, disse, emocionado.

A nossa emendada Constituição de 1988 trata em seu artigo 228 da impossibilidade de mudanças nesse aspecto. “São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial.” A doutrina constitucionalista é unânime nesse sentido, sob o argumento de que este artigo trataria de um direito individual inerente aos descritos no artigo 5º da mesma Constituição, estando protegido pelo manto das chamadas “cláusulas pétreas” ou “cláusulas superconstitucionais”.

Nosso sistema constitucional foi mais zeloso do que os congêneres no direito comparado. Na Espanha, por exemplo, a Constituição prevê uma proteção diferenciada aos menores de 18 anos, sem, contudo, regulamentar em seu texto a maioridade penal.

Em entrevista recente, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, sinaliza, de maneira transversa, que o debate, ainda que exclusivamente no campo jurídico, é bem mais profundo, ao afirmar que os estados deveriam ter liberdade para legislar sobre Direito Penal, adequando às suas realidades. Desta forma, trás à discussão, o intrincado sistema federativo brasileiro, no qual a União possui um extenso rol de competências privativas (dentre as quais legislarem sobre Direito Penal), relegando aos estados uma limitada atuação nas competências remanescentes.

Entretanto, a própria Constituição apresenta o remédio para este “imbróglio jurídico”. Em seu artigo 22, no parágrafo único, ela permite que mediante lei complementar, poderá se conceder tal autorização aos estados. Se o problema não for mexer com a maioridade penal, mas adotar medidas mais rígidas em consonância com outros princípios consagrados na Constituição, talvez valesse a pena tentar. Com a palavra o nosso “renovado” Congresso Nacional.

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