Crime no Rio

Como defender proteção à criança que é adulto precoce?

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12 de fevereiro de 2007, 23h01

Impacto parece ser mesmo o termo apropriado para definir bem a sensação de impotência que temos experimentado no Brasil nos últimos tempos.

O Rio de Janeiro é especialmente uma preocupação nacional. Quando se pensa que tudo já aconteceu, eis que surge uma barbárie nova e somos pegos de surpresa novamente com mais um espasmo de consciência diante de uma situação concreta e nada nova.

Aí, como de praxe, surgem as discussões mais acaloradas sobre Direito Penal e legislação processual que, de modo geral, sempre se pensa em mudar, mas nada se concretiza. Ao contrário da violência que é concreta e surpreendente a cada dia.

Além da sensação de mágoa, pavor, revolta e profunda tristeza, o profissional do Direito, como operador de qualquer uma de suas áreas, ainda experimenta um outro sentimento: o da desilusão.

O que responder às pessoas diante da nossa falta de palavras? Como defender uma tese de proteção à criança e ao adolescente quando nos deparamos, na realidade, com adultos precoces e pavorosamente habituados ao mundo do crime?

Se por um lado a maioridade penal, quanto à diminuição de seu limite, demonstra não ser o cerne do problema, é inevitável que se pense que há de se ter coragem para mudá-la, ainda que imediatamente se possa ter outras idéias.

Não se pode negar que estamos tratando de crimes efetivados exaustivamente por menores de idade, mas maiores na grandeza da crueldade a que se dispõem em realizar.

Quando o menino João foi esfacelado por quase oito quilômetros, esfacelou-se, também e mais uma vez, a inoperância de leis processuais e materiais que insistem em alargar as possibilidades dessa gente que desonra até a “velha bandidagem”, num tempo em que mulher, idoso e criança eram, no mínimo, poupados de cenas mais fortes.

Há anos, quando publiquei um artigo sobre a morte de Tim Lopes, aquele jornalista capturado, preso e torturado até a morte na Cidade Maravilhosa (?), pensei que estivéssemos diante de uma situação limite, do tipo agora vai ou racha. Não foi.

Agora, uma criança, e essa sim merece essa denominação, é esfacelada publicamente e, mais uma vez, penso que passamos do limite. Aliás, pensamos todos, mas até quando? Até quando pensaremos assim? Tomara que não seja somente até que um próximo crime com requinte de crueldade ocorra e todos nós esqueçamos deste que é o assunto de hoje.

A lentidão da Justiça é um problema real e cheio de nuances técnicas. Mas, a lentidão das consciências nos parece tão grave quanto.

Se menos é mais em tantas coisas, talvez menos recursos vazios, menos vaidade, menos folhas recheadas de quase nada signifique, num futuro próximo, uma Justiça com jota maiúsculo mais rápida e muito mais consciente do seu papel social. E isso nos interessa muito.

Passada a perplexidade — mas nunca a indignação — para, por meio desse gesto, pôr mais lenha nessa fogueira, ora de violência, ora de vaidade, ora de responsabilidades formais e por vezes de total irresponsabilidade, fica como resíduo disso tudo parar e procurar entender o quanto de nós há nas “entidades” criminosas e o quanto elas herdaram de nós, sociedade civil supostamente organizada.

Sabe de uma coisa? Aprendemos nesse episódio, que queira Deus não se repita nunca ou, sem precisar ocupar a Deus, quisesse o Estado trabalhar para garantir a segurança nossa e a deles, que enquanto nos lamuriamos de falta de força e excesso de descrédito, eles exacerbam força e poder. Infelizmente.

Enquanto não tivermos a competência mínima de pôr em prática aquilo que nos propusemos em realizar, aprenderemos com a sociedade bandida organizada. E isso, sim, é um luto sem precedentes.

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