Fundação de apoio

Universidade deve estar aberta à sociedade civil

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14 de abril de 2007, 0h00

A questão que se apresenta é tormentosa e suscita grandes discussões. Neste debate um segmento da sociedade civil organizada critica as Fundações de Apoio às Universidades com o argumento de que elas se pautam pela ilegalidade ao pretenderem a privatização do ensino público, que se prestam a violar as normas de direito público, especialmente a obrigatoriedade de concurso público e de licitação, ao enriquecimento ilícito dos professores e a gerar conflito de interesses com a universidade na medida em que alguns dirigentes da entidade fundacional também têm assento nos cargos de direção da Academia.

Na verdade não é o que ocorre. As fundações, e dentre elas as de apoio à universidade, inserem-se no que denominamos de Terceiro Setor. Este é formado especialmente pelas fundações privadas e as associações de interesse social. A título de exemplo pode-se destacar a Fundação Bradesco, a Fundação Roberto Marinho e a Fundação São Paulo. O Poder Público é denominado de Primeiro Setor; e o mercado, ou seja, as sociedades comerciais, com finalidade lucrativa, é denominado de Segundo Setor. Esses setores não vivem isoladamente, mas se relacionam de maneira harmônica.

Todas as fundações privadas — e aqui estão inseridas as Fundações de Apoio — são acompanhadas no dia-a-dia pelo Ministério Público do Estado em que se situarem. O Promotor de Justiça com atribuições para exercer o velamento é usualmente denominado de curador de Fundações. O legislador pátrio, em consonância com a tradição dos demais países, trouxe para o Poder Público o encargo de exercer esse acompanhamento. Atribuiu, então, ao Ministério Público essa missão.

O objetivo é garantir à sociedade e especialmente ao instituidor que os bens que ele destaca para a constituição de uma fundação fomentem exclusivamente o exercício das finalidades sociais da entidade e que nunca sejam desviados para outras finalidades. Esse acompanhamento é permanente. Ele se dá desde o primeiro choro da fundação, quando ela nasce como uma criança, e vai até o último suspiro, quando eventualmente é extinta, tal qual um idoso que cumpriu sua missão neste mundo.

Os críticos das Fundações de Apoio se esquecem de que elas, como entidades de natureza jurídica privada — constituídas na grande maioria por professores universitários, com bens que lhes pertencem — podem fazer tudo aquilo que a lei expressamente não proíbe. Esta é uma regra pacífica entre os operadores do direito. E no momento em que são cobradas de um escorreito caminhar, especialmente pelo curador de Fundações, podem exigir deste que interprete as normas preocupado com o incremento das atividades sociais, de maneira a almejar a Justiça social.

As Fundações de Apoio à Universidade se declaram como tal por ato voluntário. Não podem ser obrigadas a isso, por quem quer que seja. Dessa maneira contribuem para a Academia, mas por desejo próprio, por apego a excelência no ensino, na pesquisa e na extensão. E como elas operam no mercado, geram superávit, o qual é investido no reforço do próprio capital ou no apoio à universidade.

Os professores universitários, nos horários que não coincidem com aqueles em que têm de estar à disposição da universidade, ou mesmo dirigentes vinculados à fundação, ao prestarem serviços em projetos desta, capitaneados no mercado, são remunerados por verbas privadas pelas respectivas forças de trabalho, em parâmetros de mercado. Este modo de agir, além de legal, é ético sob o aspecto moral. Afinal de contas o trabalho remunerado é protegido inclusive pela Constituição Federal.

Essa interação entre o público e o privado faz parte da nova ordem mundial há algumas décadas. Até meados do século passado, a Administração Pública era denominada de burocrática, porquanto se preocupava mais com os procedimentos do que com o resultado. Era assim porque fruto de um estado de coisas no qual o nepotismo patrimonialista imperava. Havia desconfiança da Administração em relação ao administrado. Nessa seara, o público permanecia distante do privado. Hodiernamente, onde reina a Administração Pública Gerencial, mais preocupada com os resultados do que com os procedimentos, há perfeita interação entre o público e o privado. Basta lembrar as normas atinentes às organizações sociais, as parcerias público-privadas e as agências reguladoras, dentre outras inovações legislativas.

No conceito de Administração Pública gerencial, o inter-relacionamento entre as Fundações de Apoio, as Universidades, o Poder Público e o mercado, além de salutar, é imprescindível para o incremento das atividades da Academia. São as fundações que, com o superávit obtido junto às atividades em parceria com o mercado, logram investir na universidade, na aquisição de equipamentos, no custeio de atividades de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico, na publicação de trabalhos científicos e no subsídio de participação de docentes em cursos e simpósios, inclusive no exterior, dentre inúmeras outras contribuições.

As críticas, nesse contexto, especialmente às Fundações de Apoio à USP, são de todo improcedentes. Primeiro porque elas não recebem verba pública da universidade. Segundo porque, na medida em que fiscalizadas permanentemente pelo Ministério Público, pautam-se pela estrita observância das normas jurídicas, o que vem sendo verificado diuturnamente no acompanhamento dos atos de gestão. Terceiro porque, como entidades privadas, que vivem fruto do desempenho em projetos custeados também pela iniciativa privada, especialmente por sociedades comerciais, não necessitam submeter-se às regras de direito público, muito menos à contratação de pessoal mediante concurso ou observância dos princípios da licitação.

Quarto porque não há enriquecimento ilícito de seus professores, uma vez que são remunerados pelas tarefas exercidas, nos parâmetros dos preços praticados pelo mercado. Por fim também não há conflito de interesses entre a universidade e suas fundações. A permanência de professores na gestão das fundações, por ato de voluntariedade, é imprescindível para direcionar o rumo destas, em benefício da Academia. Ninguém melhor que os próprios docentes para saber o rumo que a Fundação deverá trilhar para auxiliar no incremento das atividades de ensino, de extensão, de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico da Universidade.

A Universidade não deve e não pode isolar-se em si mesma. Ela precisa estar aberta à sociedade civil e ao mercado, afinal de contas o ensino, a pesquisa, a extensão e o desenvolvimento da tecnologia são exercidos para a melhoria do bem-estar social. Numa época em que a Administração Pública fica cada vez mais moderna e gerencial, resta claro que as críticas às fundações são parte de um discurso desafinado, longe da realidade jurídica vigente, com um elevado cunho ideológico, um colorido desbotado pelo tempo e ultrapassado pelo uso.

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