União homoafetiva

INSS deve pagar pensão por morte a companheiro homossexual

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11 de julho de 2006, 15h42

“A Justiça não pode seguir dando respostas mortas a perguntas vivas.” O entendimento é da juíza da 5ª Vara Estadual de Belo Horizonte, Mariângela Meyer Pires Faleiro, ao analisar o pedido de pagamento de pensão de companheiro homossexual pela morte de um servidor público. A juíza reconheceu a união homoafetiva e determinou que o INSS pague pensão ao companheiro, no valor integral dos vencimentos que o ex-servidor recebia à época da morte. Cabe recurso.

De acordo com os autos, os companheiros homossexuais tiveram uma vida em comum e duradoura desde meados de 1970 até a morte do ex-servidor em janeiro de 2005. Nesse período, conviveram sob o mesmo teto, compartilharam despesas e tinham conta conjunta. Vizinhos e familiares sabiam da relação entre os dois, segundo o processo.

O companheiro do ex-servidor sustenta que obteve o pagamento de pensão pela União junto ao INSS e requereu que fosse reconhecida a convivência da união homoafetiva. Ele afirmou que a legislação previdenciária estadual não faz discriminação quanto à opção sexual.

O Estado alegou que não há amparo legal para o reconhecimento de união estável entre homossexuais, uma vez que essa união refere-se somente à entidade familiar ente homem e mulher, conforme artigo 226, parágrafo 3º, artigo 167 da Constituição Federal e artigo 1.723 do Código Civil. Afirmou ainda que não há legislação pertinente à união homoafetiva e o estatuto do instituto desconsidera a concessão do benefício previdenciário ao companheiro homossexual.

Fundamentos

A juíza afirmou que, apesar de ser o primeiro caso dessa natureza que ela analisa nos seus 16 anos de magistratura, a Justiça não pode e não deve esquivar-se do dever de prestar o amparo jurisdicional. Para a juíza, o caso é essencialmente interpretativo. Ela rebateu a afirmação do Estado de que não há legislação específica para o caso concreto. “A mudança introduzida na legislação estadual no ano de 2000, ao abranger o rol de beneficiários no artigo 7º, inciso I, da Lei 9.380/86, não cuidou de discriminação quanto à opção sexual, posto que ao se referir à entidade familiar, não quis dizer apenas a entidade familiar tradicional”.

Como foi comprovada que houve a união de fato entre os companheiros com as provas documentais, depoimentos de testemunhas e o testamento e escritura do ex-servidor morto declarando que houve a união afetiva, a juíza entendeu que a pensão deve ser estendida.

“O Poder Judiciário tem que ser independente e ter a coragem de inovar, de enfrentar os tabus e de reconhecer a realidade dos fatos que estão batendo à sua porta, adequando a eles a legislação existente”, afirmou.

Ela citou o artigo 201, da Constituição, e o artigo 215 e 217 da Lei 8.112/90, que consideram os beneficiários de pensões. “Tem-se que os artigos mencionados não tratam clara e expressamente da possibilidade de que os companheiros sejam de sexos diferentes, mas também não vedam que tenham o mesmo.”

Segundo ela, se há previsão na Lei Complementar 64 de que são considerados dependentes, entre outros, o companheiro e a companheira, sem discriminação de sexo, interpretar-se ao contrário, é fator de conveniência e injustiça. A decisão foi publicada no Diário Oficial no dia 4 de julho.

Entendimento do STJ

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu o direito de pensão previdenciária por morte de companheiro pela primeira vez em dezembro do ano passado. Os ministros classificaram como discriminatório o argumento de não haver previsão legal para a hipótese e deram a pensão por morte para o companheiro que teve uma união estável comprovada por 18 anos.

O ministro relator, Hélio Quaglia entendeu que a Lei 8.213/91 se preocupou em desenhar o conceito de entidade familiar, contemplando a união estável, sem excluir as relações homoafetivas. Também lembrou que a Constituição Federal não excluiu esse tipo de relacionamento e condenou o INSS ao pagamento da pensão.

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