Desobediência e calote

Vereadores de São Paulo descumprem ordem judicial

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31 de dezembro de 2006, 6h00

A Câmara Municipal de São Paulo ignorou uma determinação do Tribunal de Justiça paulista e fez um corte de R$ 114 milhões na verba do orçamento destinada ao pagamento de precatórios alimentares. O Tribunal havia ordenado ao município que reservasse R$ 407 milhões do orçamento de 2007 para o pagamento de precatórios. Os vereadores acharam que era muito e destinaram apenas R$ 293 milhões a este fim. Os credores do município, mais uma vez, perderam.

A conta de diminuir reduz mais a esperança dos credores da prefeitura. O pagamento desse tipo de precatório é o que está mais atrasado em todo o estado de São Paulo. A prefeitura ainda não pagou os credores que deveriam ter recebido há mais de seis anos. Muitos, inclusive, já morreram. Em 2006, o município só quitou três das seis parcelas anuais.

“O Legislativo não tem o poder de restringir o cumprimento de ordens judiciais”, diz o presidente da Comissão de Precatórios da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil Flávio Brando em uma crítica à interferência dos vereadores. Ele assegura que esse tipo de determinação fere o princípio da estabilidade jurídica e sugere que os prestadores de serviço da prefeitura pensem nisso antes de atendê-la.

Para o advogado, a prefeitura deveria reunir esforços para reaver os valores da dívida ativa. Segundo ele, o débito dos contribuintes do município é de cinco a dez vezes maior que o valor dos precatórios devidos. “A prefeitura não cobra e não paga. Falta vontade e habilidade para fazer a cobrança”.

A solução, na opinião de Brando, está na aprovação do Projeto de Emenda Constitucional que se encontra na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A proposta prevê que os próprios credores façam a cobrança dos valores da dívida ativa. A idéia é uma alternativa ao projeto apresentado pelo ministro aposentado Nelson Jobim, que versava sobre a mesma matéria.

O vereador Paulo Fiorilo (PT) diz que tanto ele quanto a bancada do PT na Câmara desde o início foram contra a redução do valor para pagamento dos precatórios alimentares. Ele entende que a conclusão do relator, vereador Paulo Frange (PTB), seguida pela maioria do Plenário, desrespeita a Constituição Federal.

Fiorilo observa que o orçamento destinado ao pagamento de precatórios em geral não ficou muito distante do determinado pelo Tribunal de Justiça. O que critica é a drástica redução para os alimentares.

Felipo Scolari, presidente do Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Estado de São Paulo, diz que é um absurdo o Legislativo ser o primeiro a descumprir determinações judiciais. “É decepcionante. O cidadão fica perplexo”, indigna-se, ao lembrar ainda que se o contribuinte deixa de pagar impostos uma das soluções é a penhora de seus bens. “Quando é o contrário, não acontece absolutamente nada”.

Para Scolari, é necessário instituir sanção contra o governante que deixa de pagar os precatórios. Ele entende que o orçamento é apertado e reconhece que nos últimos dois anos melhorou o fluxo de pagamento dos precatórios alimentares. Mas ainda considera que não é o suficiente. “É um calote vergonhoso, desumano, que passou dos limites”.

A possibilidade de reverter a decisão dos vereadores depende de uma medida judicial, que deve ser ajuizada pelo presidente do Tribunal de Justiça paulista. Caso contrário, os credores terão de se contentar com os R$ 293 milhões e torcer para estar entre os que receberão em 2007.

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