Dança das cotas

Ambev deve pagar R$ 1 milhão por assédio moral coletivo

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23 de agosto de 2006, 7h00

A Ambev — Companhia Brasileira de Bebidas foi condenada a pagar R$ 1 milhão de indenização por assédio moral coletivo. A decisão é do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Rio Grande do Norte), que considerou que a empresa praticava o assédio contra os empregados que não atingiam a cota de vendas. A indenização deve ser paga para o Fundo de Amparo ao Trabalhador.

A ação por dano coletivo foi ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, que apontou a prática de condutas atentatórias à dignidade dos trabalhadores. Segundo o MPT, os trabalhadores que não atingissem as metas de vendas eram punidos e obrigados a passar por situações vexatórias, como o impedimento de sentarem durante as reuniões, a obrigação de dançar na frente dos outros e de usarem camisas com dizeres ofensivos.

Em seu voto, a relatora, juíza Joseane Dantas dos Santos, considerou que "a situação constrangedora a que foram submetidos os empregados da recorrente é, por si só, suficiente para justificar a intervenção do Ministério Público do Trabalho, a fim de coibir tais procedimentos, bem como para o deferimento da indenização por dano moral postulada". A empresa já havia sido condenada pela primeira instância.

Não é a primeira vez que a empresa é condenada na área trabalhista por danos morais praticados contra seus trabalhadores. De acordo com a assessoria de imprensa do TRT-21, já ocorreram decisões contra a Ambev na Justiça do Trabalho de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, assim como no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília.

Em nota enviada à Consultor Jurídico, a Ambev afirmou que “repudia condutas inadequadas em relação aos seus empregados”. Sobre a decisão, disse que irá recorrer ao TST.

Leia a decisão

Acórdão nº 61.415

Recurso Ordinário nº 01034-2005-001-21-00-6

Juíza Relatora: Joseane Dantas dos Santos

Recorrentes: Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV e Ministério Público do Trabalho

Advogados: Débora Renata Lins Cattoni e outros e Izabel Christina Baptista Queiroz Ramos

Recorridos: Os mesmos

Origem: 1ª Vara do Trabalho de Natal/RN

Sentença. Nulidade. Ausência de Prestação Jurisdicional. Não se configura nulidade na sentença que analisa a questão posta sob apreciação, com explicitação de todas as razões que levaram à sua conclusão, salientando-se que não há necessidade de o julgador rebater toda a argumentação levantada pelas partes, não se vislumbrando tal obrigatoriedade nos dispositivos legais (art. 832, da CLT, e 458, II, do CPC) e constitucional (art. 93, IX) incidentes à espécie, haja vista que a obrigação do julgador é fundamentar o seu convencimento.

Inicial. Inépcia. Não Configuração. Não há que se falar em inépcia da inicial quando a parte autora, ao formular sua pretensão expõe longo e articulado raciocínio, de modo a pretender o enquadramento da requerida nos dispositivos legais relativos à matéria ora debate, sobressaindo-se a circunstância de o pedido ter sido formulado de forma a permitir a compreensão do objeto do litígio, a fim de traçar os limites da lide, além de permitir o contraditório.

Ministério Público. Legitimidade. Lei Complementar nº 0075/1993. Artigo 83, III. Inconstitucionalidade. Não Configuração. Prevendo a Constituição Federal, em seu artigo 129, IX, o exercício, pelo Ministério Público, de outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, não se pode falar em inconstitucionalidade do artigo 83, III, da LC nº 075/1993, que estabelece a legitimidade do Ministério Público do Trabalho para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

Assédio Moral. Ocorrência. Indenização. Cabimento. Comprovado o cometimento, pelo empregador, de atos de constrangimento a seus empregados, consistentes na submissão destes a situação vexatória, com utilização de camisetas, pelos vendedores, com apelidos jocosos, além de “brincadeiras” humilhantes, está patente o assédio moral autorizador do deferimento de indenização por danos morais.

Vistos, etc.

Recursos ordinários interpostos por COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS – AMBEV (fls. 581/621) e MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO (fls. 682/699), insatisfeitos com a sentença de fls.517/544, proferida pelo Juízo da 1ª Vara do Trabalho de Natal/RN, que julgou procedente em parte a Ação Civil Pública ajuizada pelo segundo recorrente contra a primeira, condenando esta no pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais), a ser revertido ao Fundo de Amparo do Trabalhador – FAT e, independente do trânsito em julgado da sentença, no cumprimento da obrigação de não submeter seus empregados a situações vexatórias de uso de camisetas com apelidos ou qualquer outro tipo de constrangimento; não impedir o assento de seus empregados em reuniões; não obrigar seus empregados a danças vexatórias; não tolerar que sejam imputados apelidos a seus empregados; não tolerar ou praticar assédio moral no ambiente de trabalho, sob pena de, em caso de descumprimento, pagar multa no valor de R$ 10.000,00 por empregado prejudicado (sem prejuízo da ação correspondente) a ser revertida ao FAT.


A requerida, em suas razões de recursos, suscita preliminar de nulidade da sentença, por negativa de prestação jurisdicional, apontando violação ao artigo 832, da CLT, e 93, IX, da CF; argumenta que a sentença deve ser anulada porque não atentou para a ausência da atualidade da ocorrência dos fatos, aludindo, ainda, a violação dos artigos 128 e 131, do CPC, por ter utilizado prova produzida em outro processo; alega existente inépcia da inicial, em razão de indeterminação do pedido; suscita a inconstitucionalidade do artigo 83, III, da Lei Complementar nº 75, de 20.05.1993, e, ainda, a ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho; trata da impossibilidade da obrigação de fazer/não fazer cumulada com a de indenizar, de acordo com o artigo 3º da Lei nº 7.347 de 1985; diz inexistente o assédio moral e dano moral coletivo reconhecidos; propugna a modificação da sentença, dizendo haver excesso no quantum da indenização, requerendo também a exclusão da multa diária e da multa por litigância de má-fé fixada na sentença dos embargos de declaração (fls. 581/621)

O requerente interpôs recurso adesivo, pugnando pela reforma da sentença, para que seja majorada a indenização deferida, expendendo razões acerca da situação econômica da empresa, o grau de culpa do presente em sua conduta, a intensidade e dimensões dos efeitos negativos do dano infligido à coletividade e a compatibilidade com a dimensão empresarial da ré e de seu capital social (fls. 682/699).

Contra-razões pela reclamante às fls. 635/681 e pela reclamada às fls. 705/715.

Há manifestação do Ministério Público do Trabalho pelo provimento do seu apelo e desprovimento do recurso da empresa (fls. 758).

É o relatório.

VOTO.

1. Da Admissibilidade.

Conheço dos recursos, porque interpostos a tempo e modo oportunos.

2. Do Recurso da Requerida.

2.1. Da Nulidade da Sentença por Negativa de Prestação Jurisdicional.

Alega a recorrente que a decisão proferida em sede de embargos é nula, por implicar em negativa da prestação jurisdicional, apontando violação ao artigo 832, da Consolidação das Leis do Trabalho, e ao artigo 93, IX, da Constituição Federal; argumenta que não houve pronunciamento do Juízo a quo em relação à ausência de atualidade da ocorrência dos fatos denunciados na inicial.

O Juízo de origem, ao apreciar os embargos de declaração, assim fundamentou: As questões expostas nos autos foram enfrentadas e decididas pelo Juízo com supedâneo no conjunto probatório existente dos autos, tudo de forma exaustiva e bem fundamentada, conforme se depreende ao fazer-se uma leitura acurada do decisum, inexistindo, portanto, na sentença quaisquer das hipóteses elencadas no art. 535 da Lei Processual Civil, cabendo a parte embargante valer-se do remédio processual adequado.

Neste aspecto, tem-se que a sentença analisou a questão, com a explicitação de todas as razões que levaram à conclusão ora atacada, salientando-se que não há necessidade de o julgador rebater um a um os argumentos lançados pelas partes, não se vislumbrando tal obrigatoriedade nos dispositivos legais (artigos 832, da CLT, e 458, II, do CPC) e constitucional (artigo 93, IX) invocados, haja vista que a obrigação do prolator é fundamentar o seu convencimento, e isto foi plenamente atendido no caso dos autos. Sobre a matéria, os julgados a seguir transcritos:

NULIDADE DA SENTENÇA – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – Não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional quando a sentença expõe os motivos de seu convencimento. O juiz não está impelido a apreciar as teses defendidas pelas partes, de per si, bastando, para o fiel cumprimento da sua função jurisdicional, que aponte as razões da decisão dada para a solução da lide … (TRT 4ª R. – RO 01348.030/00-3 – 7ª T. – Rel. Juiz Conv. Alcides Matté – J. 05.11.2003).

NULIDADE DA SENTENÇA – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – Embargos rejeitados por estar a decisão embargada devidamente fundamentada, em atenção aos artigos 832, da consolidação e 93, IX, da Constituição Federal, não enseja a nulidade do julgado, mormente quando esta é passível de reforma mediante a interposição de recurso próprio, conforme facultam os artigos 499, 505, da Lei adjetiva civil e mais especificamente o art. 897, "a", consolidado (inteligência dos artigos 794 e 796, da carta trabalhista) (TRT 9ª R. – Proc. 31640-1998-016-09-00-0 – (25013-2003) – Relª Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão – DJPR 07.11.2003).

Destarte, não há qualquer nulidade a ser declarada.


2.2. Da Nulidade da Sentença – Violação dos Artigos 128 e 131, do CPC.

A segunda preliminar de nulidade aventada pela recorrente diz respeito à alegada violação aos artigos 128 e 131, do Código de Processo Civil, apontando que o Juízo de origem considerou como elemento importante e determinante prova produzida em outro processo, que não foi submetida a contraditório neste, o que violaria, ainda, o disposto no artigo 5º, LV, da Constituição Federal. Pretende, por esta razão, que nova sentença seja proferida por outro magistrado, devendo este se ater à prova dos autos.

Os dispositivos legais indicados pela recorrente, aplicados supletivamente ao Processo do Trabalho, têm o seguinte teor:

Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

Em relação ao artigo 128, vê-se que não tem a aplicabilidade pretendida pela recorrente, porque não é o caso dos autos, haja vista que os limites da lide foram respeitados; o que questiona a empresa é se poderia o julgador se utilizar de prova produzida em outro processo para embasar o seu convencimento. Neste aspecto, ainda, não se vislumbra a alegada violação ao artigo 131, na medida em que a apreciação foi produzida de acordo com os fatos e circunstâncias constantes destes autos; o que ocorre, na realidade, é um entrelaçamento de circunstâncias entre as ações individuais, ajuizadas pelos empregados da recorrida, as quais, inclusive, ocasionaram o ajuizamento da presente ação – ação civil pública – pelo Ministério Público do Trabalho.

Em relação aos poderes do Juiz, na condução do processo, quando trata da prova, Humberto Theodoro Júnior assim ensina: Diante da necessidade de descobrir a verdade real, o juiz não pode ser neutro nem indiferente. Não determinar a prova necessária à revelação da verdade não corresponde, por isso, a uma conduta imparcial e sim a um alheamento à missão jurisdicional de assegurar aos litigantes a mais efetiva e justa composição do litígio.

Na hipótese presente, não se pode falar em sentença proferida de acordo com o conhecimento próprio do julgador, haja vista que se trata de prova produzida em outro processo, tendo como reclamada a ora recorrente, também não podendo esta alegar seu desconhecimento sobre os termos dos depoimentos transcritos na sentença, ou violação ao contraditório e ampla defesa, de modo que não há como se concluir pela transgressão ao artigo 5º, LV, da Constituição Federal.

De qualquer sorte, não se verifica que a sentença recorrida tenha se embasado na prova de outros autos, haja vista que o convencimento, como pode se verificar daquela peça, foi firmado pelo que foi demonstrado neste processo, servindo os depoimentos prestados na reclamação nº 323/2005 como simples reforço argumentativo.

Rejeita-se, portanto.

2.3. Da Inconstitucionalidade do artigo 83, III, da Lei Complementar nº 75/1993.

Outro ponto novamente trazido à discussão pela recorrente é a alegação de inconstitucionalidade do artigo 83, III, da Lei Complementar nº 75/1993, afirmando que há extrapolação dos comandos do artigo 129, III e IX, da Constituição Federal, haja vista que conferiu ao Ministério Público do Trabalho mais uma forma de legitimação extraordinária, não prevista na Carta Magna.

O inconformismo da recorrente diz respeito, portanto, à dicção do artigo 83, da Lei Complementar nº 075/1993, que estabelece que: Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: I – …; II – ….; III – promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos. Diz a interessada que tal norma está em confronto com o disposto no artigo 129, da Constituição Federal, que dispõe sobre a função institucional do Ministério Público, prevendo, no inciso III, a possibilidade de promoção de inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, enquanto que o inciso IX permite o exercício de outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

Aponta que houve alargamento na legislação complementar quando foi conferida competência ao Ministério Público para a defesa de interesses coletivos, já que se trata de primazia dos sindicatos, cooperativas e todas as demais formas de associativismo, tratando-se, via de conseqüência, de regra nova com característica de completa e não complementar a Constituição.


Para se tratar da presente questão, tem-se que ter em mente a disposição prevista no artigo 127, da Constituição Federal, com o seguinte teor: O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Saliente-se que o artigo 129, III, já mencionado, prevê expressamente a legitimidade do Ministério Público para a promoção de ação civil pública, inclusive em relação a interesses difusos e coletivos. Além disto, o inciso IX, da mesma norma, é claro ao estabelecer a possibilidade de exercício de funções outras compatíveis com sua finalidade, conforme previsão do artigo 127, acima transcrito.

Sobre o aspecto de legitimação das associações, é mister a transcrição de trecho de artigo da Procuradora Sandra Lia Simon:

A Lei Complementar 75/93 deve ser interpretada de forma lógico-sistemática e não de maneira meramente literal. Afinal, sua característica é de "complementar" a Carta Magna, não podendo, em hipótese alguma, contrariá-la.

Assim, uma das funções institucionais do Ministério Público, incluindo o do Trabalho, é a de propor ação civil pública para a proteção de interesses difusos e coletivos. Limitar esta função à tutela apenas do segundo tipo de interesse (coletivo) é flagrantemente inconstitucional. Ademais, é a Constituição Federal que, originariamente, dá legitimidade ao Órgão Ministerial do Trabalho para tanto e não apenas a Lei Complementar 75/93.

A redação do art. 83, III, de tal lei foi extremamente infeliz e, até mesmo, contraditória. Primeiro, porque os direitos sociais dos cidadãos, incluindo-se os trabalhadores, encontram-se elencados no art. 6º, CF, e podem assumir a difusa. Segundo, porque em última instância, todo direito difuso poderá sempre ser visto como uma "pequena causa", mas o que se busca, na verdade, é um provimento jurisdicional efetivo, que alcance de uma só vez todas as "pequenas causas", garantindo-se o acesso à justiça e a efetividade do provimento jurisdicional(9).

Referido dispositivo legal, entretanto, não é inconstitucional, porque deve ser interpretado sem perder-se de vista os arts. 127 e 129, CF, e considerando-se os demais dispositivos do diploma legal onde encontra-se inserido, pois o art. 6º, VII, da mesma lei complementar reza que – também sem diferenciar os diversos ramos – compete ao Ministério Público da União promover o inquérito civil público e a ação civil pública para a proteção dos direitos constitucionais, do meio ambiente e de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos.

De resto, tem-se que a defesa dos interesses coletivos em Juízo, através da Ação Civil Pública, não se restringe às associações de classe, como alegado pela recorrente, podendo ser efetivada pelo Ministério Público do Trabalho, bem como pelos sindicatos, haja vista os termos do artigo 129, § 1º, que reza que: A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei; sobressai-se ainda o disposto no artigo 5º, da Lei da Ação Civil Pública, que estabelece a possibilidade de seu ajuizamento pelo Ministério Público, União, Estados e Municípios, além de autarquia, empresa pública, fundação, sociedade de economia mista ou por associação, tratando-se, portanto de legitimidade concorrente que não exclui a legitimação de quaisquer dos entes ali apontados.

Desta forma, não se vislumbra a inconstitucionalidade apontada pela recorrente na norma em questão, motivo porque é rejeitada a alegação.

2.4. Da Ilegitimidade Ativa do Ministério Público do Trabalho e Ausência de Interesses Coletivos.

Ainda tratando da interpretação do artigo 83, III, da Lei Complementar nº 0075/1993, a recorrente diz que a legitimidade ali conferida diz respeito tão-somente à defesa de interesses coletivos, quando respeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos; aponta que a matéria ora tratada diz respeito a direitos individuais homogêneos e que, em relação aos direitos sociais, a indicação do artigo 6º, da Constituição Federal, é taxativa, o que não se traduz na hipótese dos autos.

Em primeiro lugar, há que se ressaltar que a Ação Civil Pública, quando ajuizada perante a Justiça do Trabalho, visa coibir a prática de ilícito constatado no campo das relações de trabalho e tem como característica a busca pela observância das normas jurídicas vigentes, presumidamente descumpridas, de modo a garantir a preservação da ordem jurídica, quando violados direitos sociais constitucionalmente garantidos.

No dizer de Hugo Nigro Mazzilli, na noção mais abrangente de interesse público, estão incluídos os interesses da coletividade, como um todo, os interesses sociais e individuais indisponíveis, os interesses coletivos e os interesses difusos. Desta assertiva, pode-se se concluir que o interesse público, embora de forma reflexa, atinge toda a sociedade, abrangendo, portanto, o interesse coletivo e até o interesse individual indisponível.

Sobre a discussão sobre defesa de direitos coletivos e defesa coletiva de direito, é relevante apontar que os dois conceitos não se confundem, uma vez que defesa de direitos coletivos diz respeito a direito transindividual e indivisível, que pode ser difuso ou coletivo e a defesa coletiva é destinada aos direitos individuais homogêneos, que são, na verdade, direitos subjetivos individuais, divisíveis e integrados ao patrimônio de titulares certos, que sobre eles exercem, com exclusividade, o poder de disposição e somente em casos excepcionais, expressamente previstos em lei, é admitida a defesa desses direitos por pessoa diversa que não seja seu próprio titular.

Há que se ressaltar, ainda, algumas distinções entre direitos difusos e coletivos e direitos individuais homogêneos, que foram muito bem delimitadas pelo processualista e ministro Teori Albino Zavascki.

No campo subjetivo, o direito difuso se caracteriza pela indeterminação absoluta dos titulares, uma vez que a ligação entre eles decorre de mera circunstância de fato, como morar na mesma cidade; nos direitos coletivos a indeterminação dos seus titulares é relativa, já que a ligação decorre de uma relação jurídica, citando-se exemplificativamente os membros de uma determinada categoria profissional, como os advogados; já os titulares dos direitos individuais são perfeitamente identificáveis e a relação que existe entre eles diz respeito ao objeto do direito, uma vez que são sujeitos de direitos com “origem comum”.

No campo objetivo, observa-se que os direitos difusos e os direitos coletivos não podem ser satisfeitos nem lesados senão em relação a todos os possíveis titulares, haja vista que são indivisíveis, ao passo que os direitos individuais homogêneos podem ser satisfeitos ou lesados de forma diferenciada e individualizada, em relação a um ou alguns titulares sem afetar os demais, dada a sua divisibilidade, o que atinge diretamente a discussão acerca da legitimidade do autor para a propositura da Ação Civil Pública na defesa de interesses individuais homogêneos.

Entretanto, a Lei Complementar nº 075/1993 dispõe, quando trata da função institucional do Ministério Público (artigo 5º), que cabe a este a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis, considerando-se os fundamentos e princípios que estabelece, além de consignar, no artigo 6º, VII, a defesa de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos.

Demais disso, não se pode olvidar da inovação trazida com o Código de Defesa do Consumidor, ao estabelecer, no artigo 81 a possibilidade de defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas ser exercida em Juízo individualmente, ou a título coletivo, com explicitação dos casos que envolvam interesses ou direitos difusos, especificamente os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; interesses ou direitos coletivos, consistentes naqueles transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica-base; além disto, trata dos interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Sobre esta matéria, o procurador José Cláudio Monteiro de Brito Filho, em artigo, assim expressa: Note-se que não há referência, na Constituição da República, aos interesses individuais homogêneos. Isso não é, todavia, motivo para estranheza. O Código de Defesa do Consumidor é posterior ao texto constitucional, e nele é que foi prevista a defesa coletiva dos interesses individuais homogêneos, como já explicado.

Prossegue o autor, fazendo menção às disposições insertas nos artigos 82, I, 81, III e 83, III, do Código de Defesa do Consumidor, e 83, III, da Lei Complementar nº 075/1993, nos seguintes termos: Em verdade, a menção a interesses coletivos na norma citada deve ser lida como a defesa de todas as espécies do gênero interesses coletivos, ou seja, os que se prestam à defesa coletiva, que são, repetimos, os difusos, os coletivos (em espécie), e os individuais homogêneos.

Assim, rejeita-se também esta alegação.

2.5. Da Inépcia da Inicial do Pedido de Dano Moral Coletivo.

Renova a recorrente, no recurso ordinário, a alegação de inépcia da inicial, em relação ao pedido de condenação por danos morais coletivos, sob o argumento de que não há a indicação de qualquer prejuízo concretamente à sociedade e prejuízo ou dano com relação ao qual possa ser estabelecida uma relação de correspondência com o valor pleiteado a título de indenização, entendendo, portanto, que se trata de pedido genérico.

A sentença, ao apreciar a argüição da ora recorrente, assim definiu: Não merece prosperar. A inicial é clara ao requer o dano moral coletivo pela injusta lesão da esfera moral de uma coletividade específica, qual seja, a coletividade dos empregados da AMBEV, citando inclusive jurisprudências que corroboram sua tese e a base normativa (Lei 7347/85). O valor da indenização foi pleiteado e as obrigações de fazer e não fazer foram especificamente tratadas.

Da leitura da inicial, verifica-se que o autor trata do dano moral coletivo às fls. 20/29, expondo longo e articulado raciocínio, de modo a pretender o enquadramento da recorrente nos dispositivos legais relativos à matéria ora debate, sobressaindo-se a circunstância de o pedido ter sido formulado de forma a permitir a compreensão do objeto do litígio, a fim de traçar os limites da lide, além de permitir o contraditório, o que ocorreu de fato, bastando, para tanto, verificar os termos da contestação apresentada pela demandada.

Destarte, não há que se falar em inépcia da inicial, rejeitando-se a alegação.

2.6. Do Mérito.

2.6.1. Do Assédio Moral.

A recorrente pretende a reforma da sentença, que reconheceu a prática de assédio moral em seu âmbito, dizendo que nunca teve como objetivo submeter seus empregados, de forma generalizada, indiscriminada e como política de atuação a situações passíveis de enquadramento como representativas de assédio moral, fazendo menção a rígido código de ética implantado.

Acrescenta que, no passado, algumas poucas equipes de vendas, não com intuito de assediar moralmente os empregados, mas como elemento motivacional, adotaram procedimentos como “brincadeiras”, sem submissão a constrangimentos, que geraram insatisfação de alguns poucos, não se tratando de situação generalizada; faz menção a pesquisa feita a respeito, que demonstra não existir situações negativas ou contrárias à honra e à imagem dos trabalhadores, reportando-se à inexistência de atualidade das acusações feitas pelo parquet.

Compulsando-se os autos, verifica-se que o assédio moral, em razão da própria natureza da relação empregatícia, não é desconhecido no âmbito desta Justiça, ganhando relevo a partir da promulgação da Constituição Federal, quando dá destaque à dignidade da pessoa humana, colocando-a inclusive como fundamento da República, conforme se pode aferir da leitura do seu artigo 1º, inciso III.

Artigo contido na Revista do Direito Trabalhista, da advogada Cláudia Brum Mothé, de março de 2006, sobre a questão, alude ao fato de que estudo realizado pela Organização Internacional do Trabalho, realizado no ano de 2000 constatou que na União Européia 8% (oito por cento) dos trabalhadores convivem com o tratamento inadequado de suas chefias, o que denota que, mesmo no chamado primeiro mundo, a ocorrência de tais fatos não é rara.

Sobre a matéria ora tratada, a magistrada e professora Alice Monteiro de Barros destaca em sua obra conceito de Heinz Leymann, para quem assédio moral é a situação em que uma pessoa ou um grupo de pessoas exercem uma violência psicológica extrema, de forma sistemática e freqüente (em média uma vez por semana) e durante um tempo prolongado (em torno de uns 6 meses) sobre outra pessoa, com quem mantêm uma relação assimétrica de poder no local de trabalho, com o objetivo de destruir as redes de comunicação da vítima, destruir sua reputação, perturbar o exercício de seus trabalhos e conseguir, finalmente, que essa pessoa acabe deixando o emprego.

A ementa abaixo transcrita, originada de recurso apreciado pelo Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, traz posicionamento doutrinário sobre o tema, tratando-o da seguinte forma:

DANOS MORAIS – ASSÉDIO MORAL CONFIGURADO – DEVIDA INDENIZAÇÃO REPARATÓRIA – Constitui assédio moral a tortura psicológica atual e continuada a que é submetido o empregado, consubstanciada no terror de ordem pessoal, moral e psicológico, praticado no âmbito da empresa, podendo ser exercitado pelo superior hierárquico, por grupo de empregados do mesmo nível e pelos subordinados contra o chefe, isto é, pode ocorrer no sentido vertical, horizontal e ascendente. Tem por objetivo, via de regra, tornar insuportável o ambiente laboral, obrigando o trabalhador a tomar a iniciativa, por qualquer meio, do desfazimento do vínculo empregatício. O "mobbing" caracteriza-se pela prática atual e freqüente de atos de violência contra a pessoa do empregado, dos quais participam, necessariamente, o ofensor, o ofendido e espectadores (grupo de empregados), uma vez que tem por finalidade promover a humilhação, o constrangimento perante os demais colegas de trabalho. Marie-France Hirigoyen define o psicoterror como sendo "toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho" (in "assédio moral a violência perversa do cotidiano"). in casu, ficaram comprovados, à saciedade, a humilhação e o constrangimento a que era submetido, rotineiramente, o empregado, na presença dos demais colegas de trabalho, por ato do superior hierárquico, por não ter atingido a meta de produção, consubstanciados na atribuição da pecha de "irresponsável", "incompetente", "fracassado", dentre outros. Cabível, destarte, a indenização por danos morais. Recurso ordinário improvido, no particular (TRT 6ª Reg., Proc. Nº 00340-2004-005-06-00-1, 1ª T., Rel. Juiz Valdir José Silva de Carvalho – DOEPE 04.02.2005).

Sobre a tipificação do comportamento enquadrado como caracterizados do assédio moral, releva ressaltar que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), expendeu informe, no ano de 2002, onde lista alguns atos que se configuram assédio moral, quais sejam: medida destinada a excluir uma pessoa de uma atividade profissional; ataques persistentes e negativos ao rendimento pessoal ou profissional sem razão; a manipulação da reputação pessoal ou profissional de uma pessoa através de rumores e ridicularização; abuso de poder através do menosprezo persistente do trabalho da pessoa ou a fixação de objetivos com prazos inatingíveis ou pouco razoáveis ou a atribuição de tarefas impossíveis; e controle desmedido ou inapropriado do rendimento de uma pessoa.

O também magistrado Cláudio Armando Couce de Menezes em artigo intitulado Assédio Moral e seus Efeitos Jurídicos explicita que o ato de assédio se caracteriza em submeter alguém sem trégua, a ataques repetidos, requerendo a continuidade do comportamento, que pode se constituir em insistência, repetições, procedimentos, omissões, atos, palavras, comentários, críticas e piadas.

No caso dos autos, verifica-se que o Ministério Público do Trabalho expõe que a recorrente manteve tratamento jocoso e humilhante com seus empregados, apelidando-os e fazendo-os passar por constrangimentos, no intuito de ter suas metas de venda atendidas, com propósitos evidentes de perseguição, aludindo ainda a agressão à dignidade do trabalhador, fazendo menção a depoimentos tomados em seu âmbito e em audiências perante esta Justiça, além de confissão perante a Delegacia Regional do Trabalho. Juntamente com a inicial da presente ação, traz o autor ao processo cópia de reclamação trabalhista ajuizada pelo trabalhador André Ramos da Silva (fls. 36 e seguintes), onde há pleito de indenização por dano morais, em razão de constrangimentos a ele impingidos, constando, na causa de pedir o excerto a seguir: Além disso, o reclamante pleiteia a condenação da reclamada em danos morais provocados em virtude do autor ser obrigado a usar uma camiseta no seu trabalho, 02 (duas) vezes por semana com o apelido que lhe foi colocado pelo gerente da marca ANTARCTICA, Sr. Alexandre Barros, seu superior direto na AMBEV, tal apelido causou enormes transtornos ao reclamante que de forma humilhante era obrigado a usar a camiseta que será juntada aos autos no momento oportuno, contendo o apelo arrasado de sua moral e honra, denominado “CABO BOCA DE CAVALO”, assim como era obrigado em caso de não atingir as metas de vendas, a dançar “na boquinha da garrafa”, assistir reuniões em pé, uma vez que tal supervisor virava a mesa e as cadeiras de cabeça para baixo; cantar músicas que o ridicularizava; limpar vidraças, fugindo da função real do reclamante; ser proibido de ingressar na empresa; ser obrigado a realizar flexões, como no regime militar…

Quando da realização da instrução da presente ação, foram tomados depoimentos de testemunhas, sendo relevante para a apreciação da demanda a transcrição de seus termos.

A primeira testemunha trazida pelo Ministério Público do Trabalho, Sr. André Ramos da Silva, reclamante na ação acima referenciada, ao ser perguntado, respondeu: que era vendedor; que eram seis vendedores na sua equipe mais um supervisor; que tinham metas diárias; que não atingidas as metas, nas reuniões matinais se falava e então eram estabelecidas algum tipo de ‘castigo’, como por exemplo, dançar a música ‘na boquinha da garrafa’ ou fazer flexões de braço, ou ainda assistir reuniões em pé; que no caso dele nunca precisou se fantasiar, mas aconteceu em outro segmento; que também foram confeccionadas no estilo militar em uma campanha que fizeram contra a concorrente – Nova Schin – onde além da marca da empresa era colocado um apelido, sendo que o dele depoente era ‘boca de cavalo’; que este apelido lhe foi dado pelo gerente de vendas, Sr. Alexandre Barros e o auxiliar; que ele depoente estava na rota, ao retornar já soube do apelido; que inclusive dois colegas negros foram apelidados, um de caixa preta e outro de Saci, sendo que esse segundo se constrangeu bastante com a situação; que obrigatoriamente nas quartas e nos sábados tinham que utilizar a camiseta; que saíam para a rota com essas camisetas; que também lhes eram dirigidas nas reuniões palavras de baixo calão, tais como ‘porra, incompetente, imprestável’; que havia apenas uma mulher e seu apelido era Filó, porque tinha algumas características físicas assemelhas ao personagem da SBT; que não havia vestiário e já vinham de casa vestidos com a camiseta; que a repercussão fora do ambiente diante dos comentários que eles faziam com os colegas era de perplexidade.; que inclusive um colega, de nome Everaldo Oliveira, que havia sido selecionado desistiu de trabalhar porque não queria laborar com apelido; que não se recorda se a mulher mencionada dançou a música ‘na boquinha da garrafa’; que também na gestão do gerente Márcio, as situações ocorreram; que com esse gerente trabalhou apenas nos últimos três meses antes de sair da empresa e este exigia mais o uso da camisa; …; que o uso de camisetas foi em torno de três meses, sendo que no final da gestão do Sr. Alexandre e início da gestão do Sr. Márcio; que desse tempo nos dias em que não trabalhava com a camiseta com o apelido, trabalhava com a camiseta de acordo com a marca que estavam vendendo, azul para Antarctica, amarela para Skol e vermelha para Brahma e a calça sempre era bege; que sempre trabalhou com a Antarctica; que já no final do seu vínculo houve uma mudança na empresa quando passaram a trabalhar com o projeto marca; que quem vendesse Antarctica também venderia Brahma e quem vendesse Skol também venderia boêmia; que isso já se deu na gestão do Sr. Marcos; que quando houve essa mudança cessou a obrigatoriedade de vestir as camisetas com o apelido, bem como cessaram os mencionados castigos, apenas as advertência verbais continuaram, como por exemplo, um vendedor que estava sorrindo e não havia batido meta e foi advertido na frente de todo mundo e não poderia sorrir porque não havia batido a meta; que não tem conhecimento se qualquer colega tivesse apelido, exceto aqueles colocados pela empresa (grifo não constante do original).

Por sua vez, a segunda testemunha, Sr. José Enedino Batista, afirmou: que sempre foi vendedor; que sua equipe era composta de seis vendedores e mais um supervisor; que com a testemunha anterior trabalhou apenas durante trinta dias; que desde que iniciou o seu labor na empresa, sempre havia certos tipos de penalidades para quem não atingisse metas; que o primeiro gerente era o Sr. Alexandre Galvão, o qual penalizava apenas com flexão de braço ou assistir as reuniões matinais em pé; que depois veio o gerente Eron e com ele nada disso acontecia, não havendo qualquer penalidade, apelidos, etc, da mesma forma com o gerente Paulo nada disso foi imposto; que posteriormente veio o gerente Marcelo que permaneceu pouco tempo e que algumas vezes o fazia assistir reuniões em pé; que então veio o gerente Alexandre Barros que chegou para humilhar a todos: assistiam reuniões em pé, dançavam na ‘boquinha da garrafa’, instituiu as camisetas com os apelidos para serem usadas nas quartas e nos sábados além de às vezes terem de cantar músicas humilhantes a seus companheiros; que não eram comum, nessa gestão, as flexões de braço; que não chegaram a ter que usar fantasia; que no caso dele a sua camiseta constava o apelido ‘cabo cu de liga’; que foi o gerente Alexandre Barros quem colocou esse apelido no depoente; que nem ele nem seus colegas tinham apelidos antes; que os apelidos foram colocados pelo gerente Alexandre Barros que o fazia, segundo dizia, pelas características físicas dos empregados; que ele depoente chegou a procurar o setor de Gente e gestão – recursos humanos – para que não lhe fosse colocado o referido apelido, mas mesmo assim o fizeram; que havia apenas uma mulher que tinha um apelido o qual ele não se recorda se era alguém relacionado ao programa A Praça é Nossa ou a um programa infantil; que nos outros dias se utilizavam de uniforme normal de camiseta calça e bota; que sempre trabalhou na venda de Antarctica, sendo que apenas no último mês – julho de 2004 – trabalhou na venda de Skol; que quando ele foi trabalhar na venda da Skol, o gerente Alexandre barros também havia sido transferido, mas ele depoente continuava cadastrado como vendedor da Antarctica e por isso seu gerente era o Sr. Marcos; que o Sr. Marcos não procedia da mesma forma que o Sr. Alexandre; que o gerente Alexandre Barros foi quem impôs os castigos e as situações vexatórias; que nas reuniões eram utilizados palavrões com eles vendedores, …; que isso se dava só internamente nas reuniões; que a empresa não tem vestiário e já saíam de casa com as camisetas; que chegou a falar com o gerente também sob o apelido, mas não foi atendido e que o setor de gente e gestão é superior ao gerente e poderia ter barrado o apelido na camiseta; que o único setor destinado a reclamação de seus empregados era o setor de gente e gestão; que o Sr. Alexandre Barros veio transferido de Fortaleza-CE e ele veio para Natal quando da fusão para a formação do grupo AMBEV; que teve a oportunidade de encontrar com os vendedores de outro estado em convenções que aconteceram aqui em Natal e em João pessoa, onde os colegas de outros estado comentavam que os castigos aconteciam, mas não as camisetas com o apelido; que quando ele saiu da empresa o Sr. Alexandre Barros continuava trabalhando; que ouviu dizer que mesmo teria sido dispensado; que recebia salário fixo mais comissão; que para receber as comissões teria que bater pelo menos 70% da meta; que se não atingisse tal percentual, a comissão era zerada; que em todo o período em que trabalhou para a reclamada, isso aconteceu apenas uma vez.

Ainda, há o depoimento da terceira testemunha trazida pelo parquet, que, ao depor, explicitou: …; que as comissões só eram pagas se fossem atingidas 70% das metas no mínimo, pois caso contrário era zerado e recebia apenas o salário fixo; que essa meta para aferição de remuneração era mensal, mas havia também a meta diária, a qual se não fosse atingida estava sujeita a prenda, tais como dançar na boquinha da garrafa, assistir reuniões em pé, pagar flexões, desenho de caricaturas no quadro, virar a mesa da reunião da equipe que não batia meta; que também estavam sujeitos a todo os tipos de palavrões como …; que teve dois gerentes, pois foi da sala Antarctica, cujo gerente era o Alexandre Barros e o da sala Skol, cujo gerente era Emerson; que em todas as salas de venda isso acontecia; que esse gerente Emerson, além disso, às vezes não deixava os vendedores entrar na empresa, porque não haviam atingido metas, apenas deixando o palm-top para descarregar; que também obrigava vendedores e supervisores a se fantasiarem e saírem caminhando por toda a empresa; que teve inclusive uma vez que obrigou um supervisor a amarrar um bode vivo junto à mesa e lá permaneceu durante todo o dia; que esse gerente inclusive obrigou a equipe Skol, uma vez ir ao Catre para praticar atividades físicas pelo não cumprimento de metas, como flexões, corridas, cabo de guerra, futebol americano, etc, ocasião em que dois funcionários se acidentaram, tendo um quebrado dois dedos e outro a pena; que ele também assim como os demais, era obrigado durante dois dias por semana usar uma camiseta que constava apelido; que o apelido dele depoente era carroça; que nem ele nem seus colegas tinham apelidos antes; que os apelidos lhe forma impostos pelo gerente; que foi o Sr. Alexandre Barros quem colocou o referido apelido; que a empresa tem um setor de gente e qualidade que o setor de recursos humanos, mas em nada os atendia; que se sofresse qualquer tipo de acidente de moto ou qualquer problema, nada valia, queriam reclamar desses abusos e nada resolvia; que esse setor tinha poderes para evitar os atos praticados pelo gerente; que o centro de distribuição daqui é conjugado com o da Paraíba e em um encontro que teve, chegaram a conversar onde os vendedores daquele estado disseram que o tema era o mesmo; que isso se dava em todo local que tivesse AMBEV; que todos tinham apelido, normalmente vinculados a sua forma física ou por algum outro motivo que o gerente assim considerava; que salve engano tinha uma moça na antártica e uma outra na Brahma; que ambas eram vendedoras, mas não se recordas o apelido delas; que todos os funcionários participavam de flexões, dança na boquinha da garrafa, independente de sexo; que quando ele comentava com pessoas de foram da empresa acerca de tais fastos, as pessoas ficavam incrédulas, pois não poderiam crer que tal situação existia em uma empresa como a reclamada; que os vendedores que se acidentaram no episódio do Catre, aquele que quebrou os dedos era supervisor e continuou trabalhando normalmente porque andava de carro, independente do atestado, já o segundo que era vendedor, a empresa o colocou pela perícia e se recorda bem que o mesmo se encontrava numa situação tão difícil que nada a empresa fez para ajudá-lo que vários vendedores se reuniram e cada um ofereceu uma quantia de seus vales-refeição para ajudá-lo; que não sabe precisar a data mas o evento ocorreu ou no final de 2003 ou no início de 2004 e se deu em um sábado; que a empresa não tem vestiário e ele já saía de casa com a camisa com o apelido; que ficou aproximadamente sob a gerência do Sr. Alexandre Barros e depois até o final sob a gerência do Sr. Emerson; que as camisetas foram utilizadas em uma campanha de guerra contra a concorrente – Nova Schin – e que iniciou no final de 2003 aproximadamente e quando ele depoente saiu em março de 2004 ainda se utilizava as camisetas; que aconteceu caso dele não atingir o percentual mínimo de 70% e por conseguinte não receber as comissões; que isso se deu pouquíssimas vezes; que acontecia mais vezes dele chegar no mínimo (70%); que as punições e as camisetas eram tudo idéia do gerente e não havia participação de supervisor ou vendedor.

Ainda, foram ouvidas testemunhas trazidas pela recorrente, tendo o depoimento da primeira, Sr. Wallace Silva Brito, o seguinte teor: que trabalha para o réu desde junho de 2002; que atualmente é supervisor de vendas; que foi vendedor três anos e dois meses; que depois foi vendedor ‘coach’ e depois passou a supervisor; que iniciou como vendedor Antarctica e depois passou a ser vendedor Skol; que seu primeiro gerente foi o Sr. Eron, depois o Sr. Paulo, depois Marcelo Fan, depois Alexandre barros, Sr. Márcio e agora o Sr. Marcelo; que como vendedor da Antarctica ficou sob a gerência do Sr. Alexandre barros e quando foi para a Skol foi na mesma época em que o Sr. Alexandre Barros foi transferido para Skol; que quando este foi desligado ficou sob a gerência do Sr. Marcos e por último do Sr. Marcelo; que sempre atingiu o mínimo de 70% de metas de maneira de que nunca zerou suas comissões; que já deixou de atingir as metas, mas isso se deu raramente; que ele depoente já chegou a assistir reuniões de pé, mas flexões de braço nunca aconteceram desde que ele entrou na empresa; que ele nunca dançou na ‘boquinha da garrafa’, pois quando isso acontecia ele já tinha batido as metas; que isso era tido como uma forma motivacional onde todos ficavam rindo; que palavras de baixo calão eram comum serem utilizadas mas não para chamar uns aos outros, mas expressões como ‘foi do caralho bater essa meta, vamos atingir essa porra’; que havia uma vendedora; que acredita que ela tenha visto ou ouvido esses palavrões; que hoje não há mais isso em virtude dos problemas que existiam; que também chegou a usar a camisa na guerra contra a concorrente e seu apelido era ‘cabo cisticercose’; que é um tipo de verme; que alguns colegas de trabalho já o chamavam assim, os mais próximos; que ele não se importava com o tal apelido em sua camiseta; que a empresa não tem vestiário, apenas banheiro; que eles já vinham de casa vestindo a camiseta em dias de quartas e sábados; que não se recorda quanto tempo durou o uso dessas camisetas; que quando ele foi para Skol o uso das camisetas já havia acabado; que apenas em dias de sábado como era liberado ir com qualquer camisa desde que fosse da empresa, alguns optavam por ir com a dita camiseta; que as prendas mencionadas se deram apenas na gestão de Alexandre Barros; que sob a gerência de Márcio já não mais existia; que o Sr. Alexandre Barros foi desligado aproximadamente no final de setembro de 2004; que as camisetas eram para todas as equipes, mas na equipe de vendas da Antarctica que estava sob a gerência do Sr. Alexandre barros, este como era brincalhão resolveu colocar apelidos em todos e imprimi-los nas camisetas; que as camisetas das outras equipes não constavam apelidos; que não sabe informar se foram criados apelidos para alguém; que a grande maioria já tinha apelidos pré-existente; que a empresa dá assistência médica, plano odontológico, 14º salário e no caso dele depoente paga 70% da mensalidade da universidade; que o relacionamento entre os vendedores e seus superiores era de camaradagem; que o Sr. Alexandre barros inclusive pelo seu jeito extrovertido e brincalhão era muito bem quisto entre os vendedores e ele depoente inclusive o idolatrava assim como os outros e sentiu quando o Sr. Márcio o substituiu pois esse era mais fechado, muito certo, não chamava ninguém pelo apelido, mas também falava sério com os vendedores; que quando disse que sempre procurava bater suas metas para não se expor negativa mente é porque considera não atingir as metas como que for negativamente, uma vez que sempre quis crescer dentro da empresa e o fato de não bater metas ia contraio a esse objetivo; que as reuniões matinais são obrigatórias e atualmente duram em torno de 40 minutos; que a empresa paga hora extra; que não recebeu a cartilha Cultura AMBEV que consta nos autos às fls. 255 e tampouco o Código de Ética AMBEV que consta às fls. 254.

A segunda testemunha da recorrente, Sr. Délio Pio Gonçalves Paiva, assim explicitou: que trabalha desde 10.02.2003, como vendedor; que quando entrou era vendedor da marca Skol; que em agosto de 2004 foi instalado o projeto marcas onde não havia mais a figura de um vendedor para cada marca, sendo que a partir de então ele passou a trabalhar com Antarctica e Brahma; que enquanto vendedor da marca skol o gerente era o Sr. Emerson; que na primeira reunião matinal do mês já ficava acordado entre os supervisores, vendedores e o gerente que a melhor equipe receberia uma premiação, esta de R$ 1.000,00, mas a pior equipe pagaria uma prenda; que se recorda por exemplo que em um mês o supervisor se vestia de galinha e os vendedores de pintinho para fazer uma dança, em outra oportunidade o supervisor teve que ficar com um bode durante todo o dia andando com este Bode e assim sucessivamente; que havia um estagiário na sala de vendas e era quem sabia onde tinham as fantasias e juntamente com os supervisores as providenciava; que tal atitude vem desde a época que era uma revendedora e o Sr. Emerson era gerente dessa revenda; que quando o Sr. Emerson foi ser gerente da AMBEV aproveitou praticamente toda a equipe e por isso continuaram com o mesmo sistema; que todo vendedor novato tinha que dançar a música ‘na boquinha da garrafa’; que sempre atingiu o mínimo de 70% de maneira que nunca zerou sua comissão, mas já teve meses que já chegou a não atingir as metas; que pelo que se lembra na sala da skol não existia penas como assistir reuniões em pé ou pagar flexões; que aconteceu uma vez que alguns colegas ficarem de pé durante a reunião por não terem atingido metas individuais; que depois da criação do projeto ‘marcas’ esse tipo de prendas acabou; que na sala da Skol usava camisa camuflada com o nome próprio; que apenas na sala da Antarctica foram utilizado apelidos nas camisetas; que essas camisetas foram utilizadas por apenas alguns meses não se recordando durante quanto tempo e numa espécie de guerra contra a concorrente; que a equipe da Skol só usou apelido na camiseta uma vez em uma brincadeira formatada pela empresa em que foram para o catre pratica exercícios durante um sábado; que o apelido dessas camisetas foi escolhido por cada um deles e não se tratou de camisetas camufladas e essas camisetas forma utilizadas apenas nesse dia; que nesse dia um dos vendedores se machucou e ficou um tempo afastado pela perícia; que ele se cotizaram para ajudar o referido colega; que ele tem por prática tal atitude uma vez que sabem que quando afastado pela perícia o salário se reduz; que esse vendedor se machucou no momento em que jogava futebol ou futebol americano; que a prenda estabelecida na primeira reunião matinal do mês era feita de forma descontraída, quando o gerente de vendas chegava a frente dos vendedores e cada um sugeria uma prenda e daí decidiam qual seria; que o relacionamento dos vendedores com seus superiores inclusive gerente é fácil e tranqüilo e entre os vendedores também pelo menos da parte dele; que não sabe dizer como o gerente gerenciava a questão das fantasias para as prendas; que recebeu os documentos de fls. 254 e 255; que não chegou a ler detalhadamente os ditos documentos; que inclusive anda com um crachá com disposições sobre a cultura da empresa e crenças.

Dos depoimentos ora transcritos, tem-se, sem sombra de dúvidas, que os fatos narrados pelo parquet na inicial restaram suficientemente comprovados, salientando-se que a defesa da ora recorrente se centra na inexistência de objetivo de submeter seus empregados a situações vexatórias, acrescentando que, se tal tivesse ocorrido, já teria sido extravasado os limites de suas dependências.

Ora, tal assertiva não corresponde à realidade dos fatos sob apreciação nos presentes autos, bastando, para se chegar a esta conclusão, as cópias de julgados colacionadas às fls. 448/451 e 452/456, do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, onde ficou constatada a submissão dos empregados a “castigos”, tais como fazer flexões, vestir saia de baiana, passar batom, usar capacete com chifres de boi e perucas coloridas. Ainda, no mesmo sentido, os acórdãos proferidos pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (fls. 456/464 e 465/469) e do Rio Grande do Sul (fls. 470/475, 476/481 e 482/482).

Os autos trazem notícias de procedimentos investigatórios no âmbito do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina e Minas Gerais, o que denota que o tratamento dispensado aos empregados da recorrente era similar nas várias unidades da Federação, o que afasta a alegação de que se trataram de fatos isolados.

Em relação especificamente à obrigação dos empregados da recorrente de utilizar camiseta onde constava apelido de cada um, o que deflui de tal procedimento é que era para uso em serviço, incluída a sua obrigatoriedade, haja vista que raciocínio diverso levaria à inocuidade do investimento da empresa em confeccionar tais “fardamentos”. E relevante a circunstância de que os nomes apostos nas camisetas expuseram os empregados a ridículo, trazendo-lhe constrangimentos evidentes.

Neste aspecto, a fundamentação da sentença é irretocável, conforme transcrição a seguir: Inaceitável e perfeitamente punível o comportamento da reclamada, representada pelos gerentes, quanto à punição dos empregados que não atingissem metas. Não se pode aceitar que a pessoa obrigada a vestir uma camiseta constando um apelido como por exemplo “cabo cu de liga” e saindo para efetuar vendas em sua rota esteja feliz de ser reconhecido por este nome. Aliás, apelidos, exceto aqueles carinhosos normalmente dados entre os amantes e aqueles costumeiramente utilizados entre os familiares nunca são bem aceitos por quem os recebe. Quem gosta de ser chamado de “o gordo” ou “Dumbo” ou mesmo de “CDF”. Obviamente ninguém. Ainda mais quando o apelido sugere uma característica física que muitas vezes sequer a pessoa tem (apenas quem jocosamente quer apelidar, o vê) ou muitas vezes a pessoa despreza em si e é motivo até mesmo de depressão (como por exemplo nariz grande, orelhas de abano que, graças a Deus e à evolução da medicina são corrigíveis atualmente). Tal situação, sem sombra de dúvidas, atingiu a auto estima, e, consequentemente, a dignidade e a honra dos trabalhadores, agravando-se ainda mais pela extensão do fato além dos limites da empresa, pois os vendedores eram obrigados a sair com as referidas camisetas e, ainda, saíam de casa vestindo as referidas camisetas, sendo que sua humilhação se estendia ao seu convívio familiar e vizinhos, conforme noticiado pelas testemunhas.

De resto, a instrução traz elementos que reforçam as alegações do autor, especificamente em relação à forma de tratamento utilizada no âmbito da reclamada, quando seus empregados eram expostos a situações vexatórias, como “dançar na boquinha da garrafa” ou assistir em pé reuniões, com as cadeiras viradas, quando não batidas as metas, restando patente a situação humilhante a que foram submetidos. Sobre o tema ora tratado, são citados os julgados a seguir, verbis:

ASSÉDIO MORAL – DANO MORAL – ABUSO DO PODER DIRETIVO – Quando o empregador valendo-se do seu poder diretivo, submete o empregado a tratamento humilhante e discriminatório, resta configurado o assédio moral, passível de indenização por dano moral (TRT 14ª R. – RO 00696.2004.402.14.00-5 – Relª Juíza Maria Cesarineide de Souza Lima – DOJT 01.07.2005).

ASSÉDIO MORAL – CONFIGURAÇÃO – O que é assédio moral no trabalho? é a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias, onde predominam condutas negativas, relações desumanas e anti-éticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigidas a um subordinado, desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização. A organização e condições de trabalho, assim como as relações entre os trabalhadores, condicionam em grande parte a qualidade de vida. O que acontece dentro das empresas é fundamental para a democracia e os direitos humanos. Portanto, lutar contra o assédio moral no trabalho é contribuir com o exercício concreto e pessoal de todas as liberdades fundamentais. Uma forte estratégia do agressor na prática do assédio moral é escolher a vítima e isolá-la do grupo. Neste caso concreto, foi exatamente o que ocorreu com o autr, sendo confinado em uma sala, sem ser-lhe atribuída qualquer tarefa, por longo período, existindo grande repercussão em sua saúde, tendo em vista os danos psíquicos por que passou. Os elementos contidos nos autos conduzem, inexoravelmente, à conclusão de que se encontra caracterizado o fenômeno denominado assédio moral. Apelo desprovido, neste particular. Valor da indenização. Critério para a sua fixação. A fixação analógica, como parâmetro para a quantificação da compensação pelo dano moral, do critério original de indenização pela despedida imotivada, contido no artigo 478 consolidado, é o mais aconselhável e adotado pelos pretórios trabalhistas. Ressalte-se que a analogia está expressamente prevista no texto consolidado como forma de integração do ordenamento jurídico, conforme se infere da redação do seu artigo 8º. Ademais, no silêncio de uma regra específica para a fixação do valor da indenização, nada mais salutar do que utilizar um critério previsto na própria legislação laboral. Assim, tendo em vist a gravidade dos fatos relatados nestes autos, mantém-se a respeitável sentença, também neste aspecto, fixando-se que a indenização será de um salário. O maior recebido pelo obreiro -, por ano trabalhado, em dobro. (TRT 17ª R. – RO 1142.2001.006.17.00.9 – Rel. Juiz José Carlos Rizk – DOES 15.09.2002) – grifo não existente no original.

Também não assume a relevância pretendida pela recorrente o tempo de duração de tais episódios no âmbito da empresa. O importante é o fato de sua ocorrência, sendo válida e relevante a pretensão acerca da obrigação de não deixar que torne a acontecer, de modo que é plenamente justificável a postulação ora realizada, haja vista que tais atitudes degradam as condições de trabalho dos empregados, que ficam sujeitos a pressões de toda a sorte.

2.6.2. Do Dano Moral Coletivo.

O recurso da requerida, neste tópico, diz respeito à alegação de que não se configura dano moral à coletividade de empregados e muito menos à sociedade, mas danos individuais a pessoas certas e determinadas, com reparações já determinadas por esta Justiça.

Como é sabido, o dano moral decorre de afronta ao artigo 5º, X, da Constituição Federal, que estabelece a garantia de inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de violação perpetrada.

Sílvio de Sávio Venoza, em sua obra Direito Civil – Responsabilidade Civil ensina que: Dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico. A noção de dano sempre foi objeto de muita controvérsia. Na noção de dano será sempre presente a noção de prejuízo. Nem sempre a transgressão de uma norma ocasiona dano. Somente haverá possibilidade de indenização, como regra, se o ato ilícito ocasionar dano.

O Ministro Orlando Teixeira da Costa, ao tratar da ação trabalhista sobre dano moral, em painel do IV Congresso Brasileiro de Direito Individual do Trabalho, realizado em São Paulo, nos dias 25, 26 e 27 de março de 1996, faz menção aos ensinamentos de Carmen Garcia Mendieta, que define dano moral como é o que sofre alguém em seus sentimentos, em sua honra, em sua consideração social ou laboral, em decorrência de ato danoso, incidindo, por conseguinte, em bens de ordem não-material, mencionando como exemplo de bens dessa natureza a liberdade, a honra, a reputação, a integridade psíquica, a segurança, a intimidade, a imagem, o nome. Prossegue, dizendo que Logo, quando a CLT fala em "ato lesivo da honra ou da boa fama" está enquadrando juridicamente essa conduta nas hipóteses de dano moral.

José Alberto Couto Maciel, em artigo publicado na Síntese Trabalhista, diz que o trabalhador, como qualquer outra pessoa, pode sofrer danos morais em decorrência de seu emprego, e, acredito até, que de forma mais contundente do que as demais pessoas, uma vez que seu trabalho é exercido mediante subordinação dele ao empregador, como característica essencial da relação de emprego. Ora, o empregado, subordinado juridicamente ao empregador, tem mais possibilidade do que qualquer outro de ser moralmente atingido, em razão dessa própria hierarquia interna em que se submete à sua direção, a qual o vê, na maioria das vezes, como alguém submisso às suas ordens, de forma arbitrária.

Continua o autor, afirmando que, na doutrina italiana, o ressarcimento moral não se confunde com o valor material, pois, como informa GABBA, o ressarcimento moral não é uma equivalência material entre a lesão e o ressarcimento devido, mas uma compensação pela dor moral.

Em relação ao dano moral coletivo, o Procurador Xisto Tiago de Medeiros Neto leciona: Resta evidente, com efeito, que, toda vez em que se vislumbrar o ferimento a interesse moral (extrapatrimonial) de uma coletividade, configurar-se-á dano passível de reparação, tendo em vista o abalo, a repulsa, a indignação ou mesmo a diminuição da estima, infligidos e apreendidos em dimensão coletiva (por todos os membros), entre outros efeitos lesivos. Nesse passo, é imperioso que se apresente o dano como injusto e de real significância, usurpando a esfera jurídica de proteção à coletividade, em detrimento dos valores (interesses) fundamentais do seu acervo.

Nehemias Domingos de Melo, em artigo Dano Moral Coletivo nas Relações de Consumo, assinala:

É importante destacar que foi possível cogitar-se do dano moral coletivo a partir do alargamento da conceituação do dano moral porquanto conforme preleciona André de Carvalho Ramos, “com a aceitação da reparabilidade do dano moral em face de entes diversos das pessoas físicas, verifica-se a possibilidade de sua extensão ao campo dos chamados interesses difusos e coletivos”.

A doutrina pátria tem se esforçado para definir adequadamente o dano moral coletivo. Neste aspecto o jurista Carlos Alberto Bittar Filho procurou defini-lo afirmando ser “ … a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos”. Para ao depois arrematar: “Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial”.

Ora, como anteriormente já mencionado, a recorrente tem como corriqueira a adoção das “brincadeiras” em questão, inclusive em âmbito nacional, conforme prova dos autos, que configuram, de forma indene de dúvidas, dano moral a seus empregados, expondo-os a situação de ridículo e constrangimento perante a todos os colegas de trabalho, bem como a sociedade em geral, por serem obrigados a transitar com uniforme onde constavam apelidos ofensivos, o que ocorreu em razão de ato patronal violador do princípio da dignidade da pessoa humana.

Em corroboração à argumentação ora exposta, faz-se a transcrição de arestos que trataram de matérias similares:

DANOS MORAIS. EXPOSIÇÃO DO TRABALHADOR A SITUAÇÃO VEXATÓRIA. Incorre no dever de reparar danos morais a empresa que, na vigência do contrato de trabalho, expõe o empregado a situações vexatórias, ainda que denominadas de “brincadeiras”, como é o caso de obrigá-lo a vestir, quando não atinge a meta de vendas estipulada, o colete do “mico”, calcinha vermelha ou fantasia de frango sobre a cabeça ou, ainda, a atravessar o “corredor polonês” enquanto é agredido com atos obscenos pelos colegas de trabalho (TRT 15ª Reg., Proc. 00939-2004-004-15-00-0, 3ª Turma, 5ª Câm., Rel. Marcelo Magalhães Rufino, DOE 16.09.2005, Unânime).

ELEIÇÃO DO “EMPREGADO TARTARUGA”. ATO PATRONAL CONSTRANGEDOR E OFENSIVO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – EXPOSIÇÃO DO EMPREGADO A RIDÍCULO E A VEXAME. REPARAÇÃO POR DANO MORAL. VIABILIDADE. Afronta a dignidade da pessoa humana a instituição, pela empresa, de “eleição” mensal de “empregado tartaruga”, para assim designar pejorativamente aquele trabalhador que cometeu atrasos no horário de entrada nos serviços, expondo o empregado “eleito” ao ridículo, além de colocá-lo em situação vexatória perante os demais colegas de trabalho. Louvável seria o empregador instituir mecanismos para estimular ou incentivar os seus empregados à assiduidade e à maior produtividade, sem causar-lhes constrangimentos no ambiente de trabalho. Pedido de reparação por dano moral que se acolhe. Recurso ordinário do empregado a que se dá provimento (TRT 15ª Reg., 029389/2001-ROS-2., 5ª TURMA, Rel. José Antonio Pancotti).

DANO MORAL – VENDEDOR QUE NÃO ATINGE METAS – SUBMISSÃO A SITUAÇÃO VEXATÓRIA NO AMBIENTE DE TRABALHO. Demonstrando a prova testemunhal que o empregado – vendedor – quando não atingia as impostas metas de venda, era obrigado a usar um chapéu cônico, contendo a expressão "burro", durante reuniões, na frente de todos – vendedores, gerente, supervisores – oportunidade em que era alvo de risadas e chacotas, indubitáveis o vexame e a humilhação, com conotação punitiva. O aborrecimento, por certo, atinge a saúde psicológica do empregado e, estando sujeito a tal ridículo e aflição, por óbvio estava comprometido em seu bem estar emocional. Tal procedimento afronta diretamente a honra e a dignidade da pessoa, bens resguardados pela Carta Maior. Iniciativas absurdas e inexplicáveis como esta têm que ser combatidas com veemência, condenando o empregador ao pagamento de indenização por dano moral (TRT 9ª Reg, Ac. 2ª T., DJ 20.09.02, RO nº 1796/2002, Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther).

Como se vê, a situação constrangedora a que foram submetidos os empregados da recorrente é, por si só, suficiente para justificar a intervenção do Ministério Público do Trabalho, a fim de coibir tais procedimentos, bem como para o deferimento da indenização por dano moral postulada, não havendo que se falar em reforma da sentença que reconheceu o assédio moral autorizador da imputação de indenização por dano moral.

No que tange ao ponto do recurso, que trata da impossibilidade de cumulação da obrigação de indenizar com obrigação de fazer/não fazer, tem-se que a recorrente faz alusão ao artigo 3º, da Lei nº 7.347/1985, que dispõe: A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, dizendo que tal dispositivo veda a cumulação de tais pedidos.

Não se pode, entretanto, dar ao dispositivo mencionado a interpretação restritiva pretendida pela recorrente, levando-se em conta a destinação da ação civil pública, citando-se, como argumentação, o julgado abaixo, proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, que trata com absoluta propriedade da questão:

PROCESSO CIVIL – DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA TUTELA DO MEIO AMBIENTE – OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS ART. 3º DA LEI 7.347/85 – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA – ART. 225, § 3º, DA CF/88, ARTS. 2º E 4º DA LEI 6.938/81, ART. 25, IV, DA LEI 8.625/93 E ART. 83 DO CDC – PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO, DO POLUIDOR-PAGADOR E DA REPARAÇÃO INTEGRAL – 1. O sistema jurídico de proteção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, § 3º) e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2º e 4º), está fundado, entre outros, nos princípios da prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. Deles decorrem, para os destinatários (estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, comportando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagar quantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações essas que não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso. 2. A ação civil pública é o instrumento processual destinado a propiciar a tutela ao meio ambiente (CF, art. 129, III). Como todo instrumento, submete-se ao princípio da adequação, a significar que deve ter aptidão suficiente para operacionalizar, no plano jurisdicional, a devida e integral proteção do direito material. Somente assim será instrumento adequado e útil. 3. É por isso que, na interpretação do art. 3º da Lei 7.347/85 ("a ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer"), a conjunção "ou" deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo, com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alternativa excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins). É conclusão imposta, outrossim, por interpretação sistemática do art. 21 da mesma Lei, combinado com o art. 83 do Código de Defesa do Consumidor ("art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela. ") e, ainda, pelo art. 25 da Lei 8.625/1993, segundo o qual incumbe ao ministério público "IV – Promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: A) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente (…) ". 4. Exigir, para cada espécie de prestação, uma ação civil pública autônoma, além de atentar contra os princípios da instrumentalidade e da economia processual, ensejaria a possibilidade de sentenças contraditórias para demandas semelhantes, entre as mesmas partes, com a mesma causa de pedir e com finalidade comum (medidas de tutela ambiental), cuja única variante seriam os pedidos mediatos, consistentes em prestações de natureza diversa. A proibição de cumular pedidos dessa natureza não existe no procedimento comum, e não teria sentido negar à ação civil pública, criada especialmente como alternativa para melhor viabilizar a tutela dos direitos difusos, o que se permite, pela via ordinária, para a tutela de todo e qualquer outro direito. 5. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (STJ – RESP 200301950519 – (605323 MG) – 1ª T. – Rel. p/o Ac. Min. Teori Albino Zavascki – DJU 17.10.2005 – p. 00179) – grifo não constante do original.

Assim, não merece provimento o apelo, no particular.

2.6.3. Da Multa Diária.

Em outro tópico, a recorrente trata do não cabimento da multa que lhe foi impingida, sob o fundamento de que não existiu comportamento institucionalmente estabelecido e generalizado com o objetivo de submeter empregados a situações constrangedoras que deva ser afastado por determinação judicial; traz questionamentos acerca dos limites determinantes da imposição, do período de apuração ou, ainda, se seria aplicável em caso de situação isolada e específica. Diz que a imposição de multa diária somente é cabível em relação a situações concretas, que possam ser constatadas objetivamente, o que não é o caso do chamado assédio moral, que denota avaliação subjetiva.

No primeiro aspecto tratado no recurso, tem-se que a matéria está superada, conforme se pode verificar da fundamentação supra, acerca da existência do assédio moral e dano coletivo.

Em relação à alegação de imposição de multa diária, não se verifica que tenha havido tal determinação nos autos. O dispositivo da sentença é claro ao determinar: d) não tolerar ou praticar assédio moral no ambiente de trabalho, sob pena de, em caso de descumprimento, pagar multa no valor de R$ 10.000,00 por empregado prejudicado (sem prejuízo da ação correspondente) a ser revertida ao FAT.

É sabido que, em relação às obrigações de fazer e não fazer é perfeitamente aplicável o disposto no artigo 461 do Código de Processo Civil e parágrafos. O processualista Humberto Teodoro Júnior trata da absoluta percuciência o tema sob apreciação, nos seguintes termos:

A reforma do art. 461 do CPC se fez com o evidente e confessado propósito de imprimir "novo ritmo e nova eficiência ao processo de execução", no caso das problemáticas obrigações de fazer e não fazer. 12 Nesse campo, o procedimento inovado da execução se caracteriza pela preocupação de proporcionar, sempre que possível, a execução específica, e, para tanto, são previstos:

a) medidas sub-rogatórias, as mais variadas, cuja prática imediata, pode até dispensar a actio iudicati, proporcionando, ainda dentro do processo de conhecimento, a imediata satisfação do direito do credor;

b) a astreinte – multa diária aplicável, de ordinário, após a sentença, ou antecipadamente, nos casos de relevância da pretensão e do risco de frustração da sentença, caso se tenha de aguardar o trânsito em julgado da condenação. Aqui, o procedimento executivo para exigir a multa, será o das execuções por quantia certa.

O já citado Teori Albino Zavascki, em trabalho intitulado Antecipação da Tutela e Obrigações de Fazer e de Não Fazer faz a distinção da imposição de multa em relação às obrigações positivas e negativas, tratando, neste último da seguinte forma: No caso de obrigação negativa, porém, ocorre fenômeno exatamente inverso, pois o que se visa é a não ocorrência da ação, ou seja, o meio coativo deve induzir a uma omissão. Não há sentido lógico em utilizar, para esse fim, o instrumento da multa "diária". A coerção pecuniária mais adequada, nestes casos, será a cominação também de multa, mas com outra natureza: terá que ser multa de valor fixo, que não incidirá imediatamente, mas apenas se houver violação da obrigação, ou seja, apenas se houver ação.

Com esteio na finalidade da norma aplicável, não se vislumbra qualquer impropriedade na imposição de multa pelo Juízo de origem, não cabendo a reforma da sentença.

2.6.4. Da Multa Imposta nos Embargos de Declaração.

O Juízo de origem, ao apreciar os embargos de declaração opostos pela recorrente, concluiu que a sentença enfrentou toda a matéria posta em discussão, declarando o caráter protelatório da medida adotada e fixando multa de 1% (um por cento) sobre o valor da condenação a ser revertido ao FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador.

A recorrente trata do fato de que não cabe multa quando opostos embargos de declaração para sanar omissão existente e, caso superado, pede que incida sobre o valor da causa e não da condenação, fazendo menção à fixação pelo Juízo de valor na audiência realizada em 13.09.2005.

No caso dos autos, como já definido no item 2.1. desta fundamentação, verifica-se que a sentença fez a explicitação de todas as razões que levaram à conclusão adotada, sendo rejeitada a alegação de nulidade porque não há obrigação de o julgador tratar de todos os argumentos lançados pelas partes, mas fundamentar o seu convencimento.

Assim, remanesce o fundamento da aplicação da penalidade prevista no parágrafo único, do artigo 538, do Código de Processo Civil, conforme se pode aferir do julgado a seguir, verbis:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO DE REVISTA – PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – MULTA DE 1% POR EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS – Recurso em que se pretende nulidade por negativa de prestação jurisdicional. Não caracterizada a nulidade, prevalece o fundamento da aplicação da multa por embargos de declaração protelatórios. Agravo a que se nega provimento. (TST – AIRR 809/2002-087-03-00.8 – 5ª T. – Rel. Min. Gelson de Azevedo – DJU 03.02.2006).

Em relação ao segundo aspecto, tem-se que o Juízo de origem definiu como cabível a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da condenação e não da causa, como estabelecido pela norma aplicável à espécie, o que enseja a reforma do julgado, para ser feita a necessária adequação, observado o disposto na ata de fl. 100.

3. Da Indenização Deferida.

Quanto ao tópico em apreciação, há recurso tanto da empresa requerida quando do Ministério Público do Trabalho.

Relativamente ao valor definido como indenização pelos danos morais coletivos – R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) -, a empresa repisa a alegação de que não há prova de sua ocorrência, dizendo exorbitante a quantificação ocorrida; afirma que na reclamação movida pelo empregado André Ramos da Silva foi fixada reparação em R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), acrescentando que a reparação do dano pressupõe sempre a existência de lesão de um bem jurídico protegido e que o pedido constante da inicial é aleatório, porque não foram indicados os atingidos pelo suposto dano; aponta que a quantia astronômica foi fixada somente por se tratar de empresa de grande porte.

Ainda, o parquet, em suas razões, alega que o Juízo de origem reduziu drasticamente o valor do pedido inicial no montante de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) para apenas R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), o que não se justifica, diante da dimensão empresarial da empresa e seu capital social; aponta que a busca da reparação do dano moral possui múltiplas finalidades, quais sejam, compensatória, pedagógica e sancionatória, tratando, ainda, do desestímulo que a condenação acarreta; trata dos fatos de os controladores da empresa estarem incluídos no ranking da revista Forbes, obtendo o quarto lugar entre os melhores resultados entre empresas privadas, com registro de lucro líquido de 1,5 bilhões de reais em 2005. Pede, ao final da elevação do valor para aquele pleiteado na inicial.

A sentença, ao dirimir a questão, assim definiu: É certo que a fixação do valor é problema de difícil solução, diante da dificuldade de se medir adequadamente a extensão do dano causado em se tratando de valores de conteúdo não patrimonial. Há de se ter moderação no montante a ser indenizado de maneira que não acarrete enriquecimento sem causa, mas que satisfaça, em tese, a dor da vítima (eis que a dor moral não há como ser reparada em dinheiro) e dissuadir a empresa de praticar novo ato atentatório a moral de seus empregados. E para tal balizamento, utilizam-se critérios de equidade. Quanto ao fato injusto, já se apurou tratar-se de assédio moral direcionado aos trabalhadores. Foram fatos causados pela atuação de superiores hierárquicos a minas as personalidades dos trabalhadores, máxime quando a situação passou a ser pública ao grupo de trabalho e a toda a sociedade. Prossegue, tratando do porte da recorrente, além da estrutura organizacional, para concluir não ser crível que os dirigentes da empresa não tivessem conhecimento do tratamento dispensado aos seus empregados.

Novamente, em relação à inexistência do fato danoso, tem-se que a fundamentação já lançada afasta a alegação, de modo que se passa à apreciação da questão atinente ao valor definido na sentença.

Em relação à quantificação da indenização por danos morais coletivos, Nehemias Domingos de Melo, no estudo já citado, assim trata: A possibilidade de condenação por danos morais coletivos, poderá vir a ser um importante e eficaz instrumento para coibir as ações dos grandes conglomerados que, diuturnamente, agridem e afrontam os interesses dos consumidores, seja com propaganda enganosa, seja com medidas que impliquem fraude ou lesão aos interesses transindividuais. Não se pode negar que diversas atitudes provindas dos fornecedores podem vir a caracterizar o dano moral coletivo, ensejador da indenização que, conforme preconizamos, deverá ficar ao prudente arbítrio do juiz que deverá, sopesando o grau de culpa do ofensor e o bem lesado, aplicar uma pena pecuniária que paute pela prudência e severidade de tal sorte a não ser nem tão grande que significa a ruína do infrator, nem tão pequena que avilte a sociedade – grifo não existente no original.

Vê-se, apesar da argumentação em contrário de ambas as partes, que a sentença atacada pautou o seu arbitramento dentro da razoabilidade, atentando-se ao gravame sofrido pelo universo de empregados da empresa, bem como à sua capacidade econômica capaz de proporcionar justa compensação, mostrando-se razoável o valor fixado, até pelo fato de o Juízo de origem ter limitado os efeitos da decisão, no que tange à abrangência, ao Estado do Rio Grande do Norte.

Ante o exposto, conheço de ambos os recursos; dou provimento parcial ao recurso da requerida para fixar que a multa de 1% (um por cento) imposta nos embargos de declaração seja calculada sobre o valor contido na ata de fl. 100; e nego provimento ao recurso do Ministério Público do Trabalho.

Acordam os Excelentíssimos Desembargadores e Juízes do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região, por unanimidade, conhecer dos recursos. Por unanimidade, rejeitar as preliminares de nulidade da sentença por negativa de prestação jurisdicional, de nulidade da sentença – violação dos artigos 128 e 131 do CPC, da insconstitucionalidade do artigo 83, inciso III da Lei Complementar nº 75/93, da legitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho e ausência de interesses coletivos, inépcia da inicial do pedido de dano moral coletivo, suscitadas pela recorrente. Mérito: por unanimidade, dar provimento ao recurso da AMBEV para fixar que a multa de 1%, imposta nos embargos de declaração, seja calculada sobre o valor contido na Ata de fl. 100. Por unanimidade, negar provimento ao recurso do Ministério Público do Trabalho.

<DECISÃO>

Natal-RN, 15 de agosto de 2006.

Joseane Dantas dos Santos

Juíza Relatora

Izabel Christina Baptista Queiróz Ramos

Procuradora do Trabalho

Publicado no DJE/RN nº 11.289, em 22/08/2006 (terça-feira). Traslado nº 431/2006.

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