Em caso de condenação do advogado em ação de prestação de contas, a correção monetária e os juros moratórios sobre o saldo credor devem incidir a partir do momento que deveria ter repassado ao cliente os valores recebidos, durante o cumprimento do mandato.
O entendimento é da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso do advogado José Carlos Barbuio contra acórdão que favoreceu seu cliente, o Auto Posto Ibirarema, de São Paulo.
“A prestação de contas é inerente ao instituto do mandato, sendo obrigação do mandatário prevista no Código Civil e na Lei n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia)”, afirma a ministra em seu voto.
O posto de gasolina entrou com ação de prestação de contas contra seu advogado alegando que este atuou como seu mandatário judicial e tinha o dever de prestar contas a respeito de valores recebidos e não repassados, durante o cumprimento do mandato.
A primeira instância julgou procedente a ação condenando o advogado a prestar contas ao posto além de condená-lo ao pagamento de R$ 455 mil, devidamente corrigido desde 22 de setembro de 1999.
Em Recurso Especial ao STJ o advogado discutia se em ação de prestação de contas é cabível ou não a incidência de correção monetária sobre o saldo credor apurado na segunda fase da ação e, em caso positivo, a partir de quando é que deverá ser computada.
O advogado alegou que o acórdão recorrido teria violado o arigo 918 do Código de Processo Civil, pois em ação de prestação de contas não se “autoriza o cômputo de correção monetária”. Disse também que ainda que fosse admitida a correção esta seria a partir do ajuizamento da ação e não a partir do momento que deveria ter repassado ao posto os valores recebidos durante o cumprimento do mandato.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, deixar de corrigir monetariamente o saldo credor “implicaria se permitir um enriquecimento sem causa daquele que recebeu valores numa data, não os repassou a quem de direito”.
A ministra afirmou que, no entanto, como o advogado não cumpriu as obrigações contratuais praticou ilícitos, razão pela qual a correção monetária deve incidir a partir do momento que deveria ter repassado ao posto os valores recebidos durante o cumprimento do mandato, nos termos da Súmula 43 do STJ.
Infração disciplinar
Nancy Andrighi também concluiu que além de ter praticado ilícitos contratuais, o advogado não observou o disposto no artigo 34, XXI, do Estatuto da Advocacia, onde constitui infração disciplinar “recusar-se, injustificadamente, a prestar contas ao cliente de quantias recebidas dele ou de terceiros por conta dele”.
Dessa forma a ministra determinou a expedição de cópia dos autos ao Tribunal de Ética e Disciplina da seccional paulista da OAB para apuração de eventual infração ética pelo advogado.
Leia o voto da ministra
RECURSO ESPECIAL Nº 687.101 - SP (2004/0145679-6)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: JOSÉ CARLOS BARBUIO
ADVOGADO: ANTÔNIO JOSÉ NEAIME E OUTROS
RECORRIDO: AUTO POSTO IBIRAREMA LTDA
ADVOGADO: ARLEY LOBÃO ANTUNES E OUTROS
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. MANDATO. ADVOGADO. OBRIGATORIEDADE. SALDO CREDOR APURADO NA SEGUNDA FASE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. INCIDÊNCIA ARTS. 1.301 E 1.303, DO CÓDIGO CIVIL/1916. SÚMULA 43/STJ.
- A prestação de contas é inerente ao instituto do mandato, sendo obrigação do mandatário prevista no Código Civil e na Lei n.° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia).
- Comete ilícitos contratuais o mandatário que não presta contas ao mandante e não lhe entrega o que recebeu em nome desse. Exegese dos arts. 1.301 e 1.303, ambos do Código Civil/1916
- Se o advogado não presta contas ao cliente por quantias recebidas no processo e é condenado em ação de prestação de contas, a correção monetária e os juros moratórios sobre o saldo credor devem incidir a partir do momento que deveria ter repassado ao cliente os valores recebidos durante o cumprimento do mandato. Incidência da Súmula n.° 43 do STJ e do art. 1.303 do Código Civil/1916.
- Incide correção monetária em todos os débitos judiciais, inclusive sobre o saldo credor apurado em sentença da segunda fase de ação de prestação de contas.
Recurso especial não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Humberto Gomes de Barros e Ari Pargendler votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Comentários de leitores
1 comentário
allmirante (Advogado Autônomo)
Ocorre, todavia, um fato insólito, desconhecido das hostes jurídicas, e mesmo das faculdades de economia: Correção não quer necessariamente dizer encargo, aumento. Correção monetária significa aquilatar o valor da moeda passado algum tempo. Ela pode ficar estável em relação as outras moedas, quando não há o que corrigir; ter sofrido os efeitos da inflação, quando se precisa de mais numerário para enfrentar as congêneres; mas também pode ser afetada pelo fenômeno da deflação, pouco conhecida porque não tradicional. No caso brasileiro, nossa moeda se valorizou, de modo que a correção monetária incidente deverá REDUZIR o valor da obrigação, e não aumentá-la, ainda que se espantem os guardiães da justiça!
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