Poço sem fundo

Sociedade deve cobrar pelo débito da União com previdência

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  • é professor titular na Faculdade de Direito da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo e livre-docente e doutor em Direito Previdenciário pela mesma universidade.

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20 de novembro de 2005, 14h27

Temos ouvido, assistido e lido, todos os dias, nos últimos 10 anos, que a Previdência Social está quebrada; que seus déficits só aumentam e que, apesar de já ter sido reformada três vezes, vai ter que ser reformada de novo.

Desse astronômico déficit decorre o colapso do sistema protetivo do Brasil que o integra. De certo modo, até, mesmo a crise moral de nossos dias pode ser considerada como produto do verdadeiro “salve-se quem puder” que toma conta da vida nacional.

Nesse contexto, a existência da dívida do governo federal (a União) para com o sistema de seguridade social prejudica a todos os setores que dela dependem: a saúde, a previdência social e a assistência social. O setor de saúde funciona mal. Até as camadas mais pobres da população se obrigam a contratar um seguro médico particular.

O setor da previdência social funciona mal, distorcendo os valores dos benefícios com correções que sempre perdem da inflação e obrigando as pessoas a buscarem amparo no Poder Judiciário. São milhões e milhões de processos nos quais todos querem a mesma coisa: o valor justo para os benefícios que lhes custaram muitos anos de contribuições.

O setor de assistência social é o mais vulnerável de todos. Não há previsão legal ou constitucional de quanto se deve gastar com as medidas assistenciais, nem que medidas devem ser tomadas. Por essa razão, a cada governo que assume o poder mudam completamente os programas sociais.

Desde 1960 a Lei Orgânica da Previdência Social reclama o pagamento da dívida da União. Do mesmo modo, a lei atual exige apuração dos valores e pagamentos desse débito.

Mas está acontecendo algo pior. Além de não pagar essa divida que só cresceu nos últimos 45 anos, o governo federal está retirando mais dinheiro da seguridade social. Quer dizer, não paga o que deve e toma ainda mais recursos que estão fazendo falta nas áreas da saúde (SUS), da previdência (INSS) e da assistência (bolsa-familia; fome zero, etc.).

No ano passado, só no ano passado, foram aprovadas 17 leis que desviaram quase R$ 10 bilhões da seguridade social para outras finalidades que não guardam relação com saúde, previdência social e assistência social. Enquanto isso, os serviços públicos relacionados com essas áreas sofrem freqüentes paralisações, por falta de condições de trabalho.

Essa prática de saques dos recursos previdenciários para outras finalidades está se repetindo nos últimos 15 anos. Em todos esses anos o governo federal botou a mão no dinheiro da seguridade social e, como se fosse um cara-de-pau, continuou dizendo que o sistema está quebrado!

O artigo 90, da Lei 8.212/91 autorizou o Conselho Nacional de Seguridade Social a apurar o montante do grande devedor da previdência social. Porém, no governo anterior, foi extinto o Conselho Nacional de Seguridade Social. Deste modo, o débito da União nunca foi apurado e, como vimos, está crescendo cada vez mais.

Entendo que a sociedade deve exigir imediata apuração do débito da União para com o sistema previdenciário. Sabemos que será difícil o pagamento dessa conta imensa de uma vez só. Mas, que pelo menos parem de mentir e parem de efetuar novos saques. Que todas as entidades de defesa de aposentados, de pensionistas, de idosos, de pessoas portadoras de deficiência; que todos os grupos em defesa da vida e da saúde comecem a gritar contra essa situação.

Exijam do Tribunal de Contas que realize uma séria auditoria para a apuração da imensa dívida do maior devedor da previdência social. Não podemos correr o risco de que a “fabricação do consenso” (Chomsky) sobre a inviabilidade da previdência social sirva de pretexto para que os benefícios e serviços não sejam prestados ou o sejam de maneira ineficiente ou deficiente.

Se faltarem recursos, que a União cubra os déficits, como ordena a legislação em vigor. Se não quiser cumprir esse dever legal, que aponte os caminhos e não apenas insista em reformas que só trouxeram como resultado a redução dos direitos sociais. Que, enfim, seja reinstalado o Conselho Nacional de Seguridade Social, foro legitimo de discussão para toda a problemática aqui enfocada.

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