Ação trabalhista fraudulenta ajuizada pela empresa Tecnologia Ruber Ltda., de Santa Catarina, que resultou em um “acordo” no valor de R$ 180 mil, deve ser arquivada. A decisão do Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina foi mantida pela Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, com base no voto do ministro João Oreste Dalazen. A informação é do site do TST.
O acordo simulado chegou a ser homologado pela Justiça do Trabalho. Logo depois, a juíza do Trabalho de Jaraguá do Sul (SC) suspeitou dos termos do acordo e iniciou diligências que apontaram a existência de conluio entre as partes.
O falso acordo com um advogado foi feito porque crédito trabalhista tem preferência para pagamento de dívida quando a empresa está em concordata. Assim, fornecedores seriam os maiores prejudicados com esse acordo. Ficou comprovado que o acordo era uma fraude e não seria cumprido.
Com base no artigo 129 do Código de Processo Civil, o acordo foi anulado. A ação trabalhista fraudulenta foi arquivada e as partes, condenadas a pagar custas processuais sobre o valor do suposto acordo. A decisão foi confirmada pelo TRT de Santa Catarina (12ª Região) e envolveu uma discussão a respeito da “relativização da coisa julgada”. Para o TRT-SC, em casos como este, o princípio constitucional que preserva a integridade das decisões judiciais transitadas em julgado (intangibilidade da coisa julgada) deve ser confrontado com princípios igualmente relevantes, como o da moralidade, o da legalidade e, principalmente, o da justiça.
A tese do TRT-SC foi plenamente aceita pelo ministro Dalazen. Segundo ele, trata-se de um “caso escandaloso”, em que a Justiça do Trabalho foi usada pelas partes para fraudar direitos de outros empregados e de credores da empresa concordatária. O relator ressaltou o acerto das decisões das juízas Patrícia Almeida Ramos (primeira instância) e Sandra Márcia Wambier (segunda instância). “Ambas as decisões bem souberam compreender que somente a deusa que simboliza o valor da Justiça tem os olhos vendados. A Instituição ‘Justiça’, contudo, precisa tê-los -- e os têm! -- bem abertos para não se deixar enredar por litigantes maliciosos”, afirmou.
Histórico
Pelo acordo homologado, o advogado receberia R$ 180 mil em 60 parcelas mensais. Com a alegação de que o acordo não foi honrado pela empresa, o autor da ação pediu que a juíza promovesse a execução do que lhe era devido. Depois de colher o depoimento das partes, a juíza decidiu fazer diligências para apurar a situação falimentar da empresa. Com base em provas que reuniu, ela concluiu que houve conluio fraudulento.
De acordo com os autos, o advogado foi contratado como consultor para “limpar a confusão” e negociar com os cerca de 300 credores quirografários da empresa, que tinha contra si oito pedidos de falência além de 50 reclamações trabalhistas.
No segundo depoimento que prestou à juíza, o advogado não soube informar exatamente quantas parcelas do acordo teria recebido nem o que tinha feito com o dinheiro: se o teria depositado em conta corrente ou o endossado em algum outro negócio. As informações a respeito das datas do contrato com a empresa não coincidiram com as informadas na inicial da ação trabalhista.
Apesar de ter entrado na Justiça do Trabalho por falta de pagamento de salário, o consultor disse à juíza que continuaria prestando serviços até que “os problemas envolvendo o nome da empresa fossem sanados”. A juíza determinou a extinção da ação trabalhista. “O conluio fraudulento se torna mais nítido se atentarmos para o fato de que nenhuma das partes soube informar dados básicos a respeito da forma com que o ajuste em questão vinha sendo cumprido, tais como a forma de pagamento (dinheiro ou cheque) e o local de pagamento (empresa)”, afirmou a juíza Patrícia Almeida Ramos.
O consultor recorreu ao TRT-SC. Alegou que a juíza cometeu uma “monstruosidade processual que não poderia prosperar” e ainda requereu os benefícios da assistência judiciária gratuita. O recurso foi rejeitado pelo TRT-SC. A juíza Sandra Márcia Wambier afirmou que “muitas vezes os motivos que fundamentam uma decisão e a verdade dos fatos podem estar inteiramente dissociados da realidade, e, por sua vez, a imutabilidade, se mantida, poderá levar a cabo uma injustiça irremediavelmente maior que a justiça aparente que se pretendia fazer”. O caso foi parar, então, no TST. A decisão de primeira e segunda instâncias foi mantida.
RR 108/2000-019-12-00
Comentários de leitores
1 comentário
Ademir Marin (Advogado Sócio de Escritório - Administrativa)
Em sendo verdadeiros os fundamentos da decisão noticiada, ao relativizar os efeitos da coisa julgada e afastar a colusão, certamente o Judiciário Trabalhista visou à satisfação dos demais credores e empregados que não participaram da miraculosa salvação do "patrimônio" da empresa. Agora, o que impressiona é ainda se usar de subterfúgios tão primários, em verdadeira afronta à inteligencia dos demais prejudicados. Muitos operadores de direito ainda agem como se a luz e a capacidade de raciocínio fossem privilégio de alguns poucos, e, todos os demais incapazes de compreender as estultas "estrategias", ass quais, a par de toscas, muitas das vezesse revelam ilícitas e imorais, engendradas para ludibriar credores. Decisões como a noticiada contribuem, e muito, para reduzir (eliminar jamais) a prática do "jeitinho" para solução de problemas.
Comentários encerrados em 17/03/2005.
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