Tubo de ensaio

UNB é condenada a indenizar aluna queimada em laboratório

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27 de dezembro de 2005, 9h46

A Universidade de Brasília foi condenada a pagar R$ 25 mil de indenização por danos morais para a estudante Simone Rios. A aluna se queimou com ácido durante uma experiência no laboratório da universidade. A decisão é do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, confirmada pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

Segundo os autos, Simone Rios fazia estágio na universidade porque era beneficiária de uma bolsa de estudos do CNPq — Conselho Nacional de Pesquisa. Durante um experimento no laboratório de Fisiologia Animal da UNB, um outro estagiário encostou um objeto quente em seu braço, fazendo com que ela derrubasse sobre si o recipiente com ácido sulfúrico que tinha nas mãos. O ácido a atingiu no rosto, braço, pescoço e tórax.

A estagiária procurou lavar imediatamente as partes atingidas pelo ácido, mas a única pia existente no local, usada para limpeza de material, não era adequada. Auxiliada por outra aluna, Simone foi ao banheiro feminino, mas não havia água. Somente depois de uma hora conseguiu lavar o corpo.

O fato levou a estudante a entrar com ação contra a UNB e contra o estagiário pedindo indenização por danos morais e materiais. A primeira instância reconheceu apenas a responsabilidade da universidade e a condenou a pagar R$ 4.890 por danos materiais e outro montante de igual valor por danos morais.

A UNB e a estagiária recorreram. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região reconheceu que o estagiário devia responder solidariamente pelos danos. Fixou a indenização por dano material e estético no mesmo valor determinado pela primeira instância e a indenização por dano moral em R$ 25 mil.

O valor não agradou à estudante, levando-a a recorrer ao STJ. Pediu o aumento da indenização para o valor equivalente a 400 salários mínimos. O relator do processo, ministro Teori Albino Zavascki, negou o pedido.

Leia a íntegra da decisão

RECURSO ESPECIAL Nº 772.980 – DF (2005/0132059-0)

RECORRENTE: SIMONE WAGNER RIOS LARGURA

ADVOGADO: LUCIANO DE MEDEIROS ALVES E OUTROS

RECORRIDO: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – FUB / UNB

PROCURADOR: VALÉRIA CRISTINA CÔRTES DOS SANTOS MACHADO E

OUTROS

RECORRIDO: LÚCIO BRAVIN

ADVOGADO: LUIZ CELSO LISBOA RODRIGUES

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

Trata-se de recurso especial interposto com fundamento na alínea c do permissivo constitucional em face de acórdão do TRF da 1ª Região que, em ação objetivando a condenação dos demandados ao pagamento de danos morais e materiais decorrentes de acidente em laboratório químico, deu provimento à apelação da autora e majorou a indenização por danos morais para o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), em aresto assim ementado:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE COM ÁCIDO SULFÚRICO EM LABORATÓRIO. LESÃO CORPORAL CULPOSA NA FACE, OMBRO E PESCOÇO. DANO MATERIAL E MORAL (ARTIGO 1.538, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL). DANO ESTÉTICO (ARTIGO 1.538, § 1º DO CÓDIGO CIVIL).

CUMULAÇÃO DO DANO ESTÉTICO E DANO MORAL. IMPERÍCIA E NEGLIGÊNCIA DA FUB. IMPRUDÊNCIA DO CO-RÉU.

1. Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de sua três vertentes: negligência, imperícia ou imprudência (STF, RE 179147/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 27.02.98).

2. A FUB incorreu em imperícia e imprudência ao construir o Laboratório de Fisiologia Animal sem lava olhos e chuveiro de emergência. Se houve também com negligência por não ter um orientador na sala de experimentos.

3. A prova dos autos revela a culpa da Universidade em não oferecer uma estrutura de segurança ajustada ao risco das atividades desenvolvidas no laboratório associada à falta de supervisão de profissionais competentes.

4. A prova dos autos demonstra também que o evento danoso ocorreu por culpa do co-réu que, de forma voluntária e imprudente, encostou, no braço da autora, o tubo de ensaio em reação (alta temperatura), levando-a a ter o ato involuntário de sobre si derramar ácido, o que lhe causou graves queimaduras no rosto, no colo e no braço.

5. As queimaduras sofridas pela autora foram intensificadas pela omissão da FUB que não proveu seus laboratórios de equipamentos necessários para manter segurança mínima no local do evento (água para se lavar líquidos).

6. O dano se, qualifica como injusto e, como tal, legitima a responsabilidade da FUB e do co-réu. Sua causa exclusiva se encontra nos seus procedimentos gravemente culposos (imperícia e negligência da FUB e imprudência do co-réu).

7. “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano” (artigo 159 do Código Civil).

8. Danos materiais, no caso, são as despesas com tratamento hospitalar e remédios. Sua reparação está prevista no artigo 1.538, caput, do Código Civil. Dano estético é aquele que atinge o aspecto físico da pessoa e sua reparação está prevista no § 1º do artigo 1.538 do Código Civil.

9. O dano estético, na espécie, se consubstancia no fato de ter a autora o rosto deformado, de ter alterada a integridade da aparência.

10. “No plano da responsabilidade civil, vem-se acentuando especial relevo aos aspectos dolorosos, à dor e ao sofrimento subjetivamente padecido pelo ofendido em razão das lesões deformadoras de sua integridade física, com abstração ou minimização dos aspectos exteriores relacionados com a aparência humilhante ou constrangedora da deformidade estética”. (Yussef Said Cahali, in Dano Moral, RT, 2ª ed., p. 225).

11. “O dano estético distingue-se do moral. O primeiro – dano estético – está voltado para fora, vulnera o corpo, desfigura a silhueta, a beleza e a plástica , corresponde ao patrimônio da aparência.

O segundo – dano moral – é intrínseco, está voltado para dentro, afeta os sentimentos, marca a alma, penetra nos domínios da emoção, incorpora-se ao psiquismo, integra a essência do ser: constitui o acesso da consciência” (RT 655/239).

12. Dano estético é o rosto deformado, o dano moral da autora é a tristeza que a seguirá ao longo de sua vida. Resta sempre algo irreparável em todo sofrimento humano injusto e a compensação pecuniária pelo dano moral é um mero conforto.

13. Para fixação do dano moral puro aplica-se a multa prevista no caput do art. 1.538 do Código Civil, ou a equidade.

14. A jurisprudência das Turmas que integram a Seção de Direito Privado do STJ orienta-se no sentido de que as indenizações pelo dano moral e estético podem ser cumulados, se inconfundíveis nas causas e passíveis de apuração em separado (Resp 228.244-SP, Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4ª Turma, DJ 17.12.1999).

15. Apelação da FUB improvida.

16. Apelação da autora provida.

17. Remessa oficial prejudicada.” (fl. 287).

No recurso especial (fls. 328-336), a recorrente colaciona julgados do STJ nos quais se afirma que, excepcionalmente, é admitida a alteração da quantificação da indenização por danos morais por esta Corte. Pleiteia a majoração do quantum devido para o valor equivalente a 400 (quatrocentos) salários mínimos. Sem contra-razões.

É o relatório.

EMENTA

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. REVISÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 07/STJ.

1. A revisão do valor arbitrado a título de indenização por danos morais somente é viável nas hipóteses em que o montante fixado pelas instâncias ordinárias for exorbitante ou irrisório.

2. Não é cabível, em recurso especial, examinar a justiça do valor fixado na indenização, uma vez que tal análise demanda incursão à seara fático-probatória dos autos, atraindo a incidência da Súmula 7/STJ. Precedentes: REsp 686050/RJ, 1ª Turma, MIn. Luiz Fux, DJ de 27.06.2005; AgRg no Ag 605927/BA, Min. Denise Arruda, DJ de

04.04.2005.

3. Recurso especial não conhecido.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):

1. No que tange aos aspectos atinentes à fixação do valor da indenização, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de somente admitir a revisão do arbitramento da reparação de danos morais nas hipóteses de determinação de montante exorbitante ou irrisório. Quando o valor prescrito estiver adequado a parâmetros de razoabilidade, torna-se inviável a alteração do quantum indenizatório, por demandar, necessariamente, o revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, incidindo a vedação estabelecida pela Súmula 7/STJ.

Foi esse o entendimento adotado nos seguintes julgados: REsp 686050/RJ, 1ª Turma, MIn. Luiz Fux, DJ de 27.06.2005; AgRg no Ag 605927/BA, Min. Denise Arruda, DJ de 04.04.2005; AgRg no Resp 743.060/RS, 3ª Turma, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 08.08.2005; Resp 685.388/RJ, 4ª Turma, Min. César Asfor Rocha, DJ 01.07.2005; RESP 453.703/MT, 4ª Turma, Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ de 01.12.2003; RESP 480.693/RS, 3ª Turma, Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 28.10.2003.

No caso concreto, o acórdão fixou o valor da indenização em R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), “tendo em vista as lesões e as deformações infligidas no rosto e em outras partes do corpo da autora e também o sofrimento pelo qual ela passou durante o tempo em que esteve em tratamento e, ao que parece, até o presente” (fl. 289). Percebe-se, portanto, que qualquer conclusão em sentido contrário demandaria o reexame de matéria fática. Ademais, no caso, não se verifica exorbitância ou risibilidade no valor fixado na indenização.

2. Pelo exposto, não conheço do recurso especial. É o voto.

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