Colcha de retalhos

A Constituição de 1988 virou uma colcha de retalhos

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8 de março de 2004, 15h48

A Constituição da República Federativa do Brasil vem sendo tratada de forma desrespeitosa já por alguns anos. O texto constitucional que deve ser enxuto deve tratar da organização do Estado, dos Poderes e dos direitos fundamentais dos cidadãos.

Nossa atual Constituição, que não é mais de 1988, virou uma colcha de retalhos, que é alterada ao sabor do grupo que exerce temporariamente o Poder.

Qualquer tipo de problema nacional pensa-se em alterar a “Carta Magna” afirmando para a população que tudo vai melhorar. Basta verificar que temos 42 emendas, e muitas outras virão. Não seria melhor apenas cumprir a Constituição elaborada legitimamente por um Poder Constituinte Originário, bem como elaborar a legislação infraconstitucional determinada e desejada?

A situação piora e no momento parece que a Constituição vai de fato desaparecer.

O art.16 da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, declarou enfaticamente que “a sociedade em que não esteja assegurado à garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”.

O momento histórico em que vivemos mostra que as garantias dos cidadãos estão sendo colocadas à margem e a separação dos Poderes está deixando de existir, com o enfraquecimento do Judiciário, que já não é um Poder realmente separado dos outros.

Com as recentes mudanças constitucionais o grupo que exerce o Poder demonstrou a verdadeira intenção de não respeitar direitos dos cidadãos. Direito adquirido, nem pensar?

O direito adquirido trata-se de uma aquisição da humanidade contra os desmandos do Governo, no sentido de obrigar a todos respeitar o direito daquele cidadão que foi adquirido conforme a legislação da época da aquisição; ou seja, todos os requisitos para a aquisição foram cumpridos.

Precisa o cidadão ter segurança jurídica nas suas relações. Precisa ter a tranqüilidade que aquele direito que foi legalmente incorporado em seu patrimônio não seja retirado por um ato autoritário; não do Estado, mas do Governo.

O patrimônio de uma pessoa não é só formado por bens materiais, mas também pelos bens morais, espirituais e direitos adquiridos. O patrimônio é um conjunto de bens, que todos querem ver respeitados.

Não se pode afirmar que há Constituição na sociedade quando o Governo quer diminuir salários, quer tirar mais dinheiro de quem já contribuiu por dezenas de anos e em regra se encontra na velhice. Não se pode afirmar que há Constituição quando o cidadão não tem segurança constitucional. Um grupo muda as regras da aposentadoria, o grupo seguinte muda outra vez e quem sabe o outro.

Com certeza não é o trabalhador da empresa privada e nem do serviço publico o responsável pelo déficit da previdência e do Governo.

Quanto à separação dos Poderes a situação não é diferente.

O Judiciário, na sua composição, já depende da vontade do Poder Executivo, que na verdade nomeia os integrantes das Cortes Superiores. A história tem mostrado que cargos no Judiciário, em várias casos, são presentes para amigos de partidos políticos.

Esta forma de composição já mostra que a separação é mais textual do que verdadeira.

Agora surge o já debatido Controle Externo do Judiciário, para mostrar mais uma vez que não temos Constituição.

Expressa o art.2º da Constituição Federal que são Poderes da União, independentes e harmônicos, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Conforme noticia a Imprensa Nacional o Governo quer a todo custo criar um controle externo para o Judiciário, não havendo nenhuma disposição de se ouvir posições contrárias de forma a refletir.

Se os três são Poderes não pode haver nenhum órgão acima deles, pois devem ser independentes e harmonicamente executarem suas funções típicas em prol da população.

O Judiciário tem controle diário, pois suas audiências são públicas, os Advogados das partes fiscalizam, as partes fiscalizam e o Tribunal de Contas, órgão que auxilia o Poder Legislativo, com integrantes nomeados pelo Executivo, fiscaliza as contas anuais.

Estando os Poderes no mesmo patamar Constitucional nada mais justo do que a idéia de se pensar em controle externo para o Legislativo e outro para o Executivo. Estes órgãos devem ser integrados por pessoas dos próprios Poderes, da sociedade e do Judiciário.

A idéia não é controlar as atividades especificas de cada Poder, mas sim como o dinheiro está sendo gasto, quais são as prioridades, dando aos controladores o poder de demitir membros do Legislativo e do Executivo.

Afirmar que estes Poderes são controlados nas eleições não é afirmação séria. Como querem, o controle deve ser no dia a dia.

Inaceitável a afirmação que o órgão que se pretende criar para controlar o Judiciário seja o órgão integrante do próprio Judiciário. No Judiciário existem Magistrados e não pessoas de outras carreiras. Esta afirmativa só serve para tentar convencer as pessoas da sua utilidade.

Com a vinda, parece inevitável do órgão de Controle Externo, teremos no Brasil o afastamento do Judiciário como Poder e, portanto, de fato a Constituição por via de emenda estará deixando de existir.

Ou, se pode pensar que são Poderes da União, o Legislativo, o Executivo e o órgão de controle externo do Judiciário.

Ao decorrer do tempo tudo vai se acomodar, mas a população precisa estar vigilante, no sentido de que parece que não temos ou não teremos mais Constituição, pois os direitos são só previstos no texto, mas não são respeitados, e que a separação de poderes é algo inexistente.

Uma última preocupação, pelo menos aqui, é se a população simples, que não exerce nenhum poder, que não está protegida por nenhum partido político, vai ter a segurança de que as “decisões” judiciais serão tomadas, sem antes alguém que foi indicado por um político de determinado partido, não tente pedir um pequeno favor em beneficio da outra parte no processo. Afinal, seu Partido é quem indica os membros do órgão que controla.

Enfim, fica a preocupação: Temos ou teremos uma Constituição?

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