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Mercado musical revela necessidade de aperfeiçoar Direito da Internet

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5 de janeiro de 2004, 10h26

O ano de 2004 começa com mais indícios de reestruturação no mercado mundial de música, que movimenta algo em torno de US$ 31 bilhões por ano e vem sendo atormentado pela pirataria e pelo oferecimento de música gratuita através da Internet. Será a terceira operação corporativa de peso ocorrida no mercado fonográfico global nas duas últimas décadas.

Em 1987, a Sony Corp., do Japão, adquiriu, por US$ 8 bilhões, a divisão de discos da CBS Corporation americana, que reteve apenas os negócios de televisão. À aquisição, que deu origem à atual Sony Music e catapultou a nova empresa para o segundo lugar do mercado mundial, seguiu-se a estrepitosa fusão da Warner Bros. Records com o conglomerado Time Warner, na década de 90 (considerado na época o mais vultoso negócio do mundo do entretenimento). Depois, o grupo foi incorporado pela AOL (America OnLine), formando a sigla Time Warner AOL.

Segundo analistas do Bank of America, em Londres, “a indústria vem passando por sérias dificuldades e a fusão (merger) é o único caminho para cortar custos”. As Big Five, como são conhecidas as cinco grandes multinacionais que controlam a indústria da música em escala planetária (Universal Music, Sony Music, Warner Music, EMI e BMG), vêm cada vez mais considerando fusões para enfrentar a maior queda de vendas de suportes musicais em mais de uma década: 20%.

Recentemente, vazou a notícia de outra possível fusão, em que o grupo inglês EMI adquiriria a divisão musical da Warner Bros., mas é certo que as autoridades anti-truste nos Estados Unidos e na Europa têm sido pouco receptivas às fusões no mercado musical, já bastante monopolizado. A impressão que resulta é que dificilmente os reguladores permitirão duas fusões em um negócio já dominado mundialmente por apenas cinco grandes empresas que controlam três quartos do mercado. A oferta da EMI pela Warner chega a US$ 2,3 bilhões em dinheiro e participação acionária, segundo o periódico econômico Financial Times, mas as ações da companhia britânica caíram após o anúncio.

Na pretendida fusão da Sony com a BMG, cada gravadora ficaria com 50% do negócio, que não inclui as unidades de edição musical (Music Publishing) e o nome de identificação da empresa seria Sony BMG. A expectativa é que, desde que não haja empecilhos de ordem legal por parte dos reguladores europeus, a fusão possa estar consolidada no primeiro trimestre de 2004.

O negócio juntaria sob o mesmo teto artistas como Britney Spears, da BMG, e Bruce Springsteen, da Sony (este último aliás foi o artista com o melhor desempenho on the road em 2003, com a maior arrecadação em shows e espetáculos ao vivo), entre outros nomes de peso do show business internacional. O negócio também guindaria a nova empresa ao posto de detentora de um quarto do mercado mundial de música, sendo 25,1% pertencentes à Sony, de acordo com números da IFPI (International Federation of the Music Industry), baseada em Londres. As duas gravadoras responderam por cerca de US$ 8 bilhões em vendas globais no ano de 2002, mas a liderança mundial continua com o grupo franco-americano Vivendi Universal.

Mais uma vez, a tecnologia pode ser colocada no banco dos réus ao lado da pirataria, pelas drásticas mudanças ocorridas na indústria da música, todas negativas. Desde o advento da Internet e da popularização do computador pessoal, passando pelo caso Napster e pelo verdadeiro surto de sites capazes de armazenar, transferir e baixar músicas através da grande rede, que os dias da indústria musical como a conhecemos se tornaram contados.

Além da pirataria, grassante em escala mundial, a troca de arquivos peer-to-peer ou P2P, feriu mortalmente as grandes multinacionais do disco, que nunca mais conseguiram recuperar a capacidade de precificação dos seus produtos (CDs e DVDs). Como efeito disso, em setembro de 2003, o prejuízo declarado formalmente pela BMG foi de US$ 189 milhões no primeiro semestre do ano, contra US$ 85 milhões no mesmo período de 2002. A BMG já tentara antes se fundir com a Warner, mas sem sucesso devido a restrições regulatórias e cortou cerca de 1.100 empregos no final de 2001, com reflexos em todos os países do mundo em que possui filiais, inclusive no Brasil.

A verdade nua e crua é que efetivamente, mesmo que invista grandes somas de dinheiro para alcançar o domínio da tecnologia de download de obras musicais, a indústria nunca mais irá recuperar sua mão-de-ferro sobre os preços do mercado. Em primeiro lugar, porque a Internet é incontrolável em sua totalidade e a cada sítio fechado pelas autoridades surgem pelo menos outros dois oferecendo free music. Em segundo lugar, porque o CD como suporte-líder de transporte de música também está atingindo o crepúsculo de sua existência, com uma antecedência de 20 anos em relação a seu antecessor, o venerável LP (Long-Play), que reinou incontestado durante quatro décadas.

São fatos que apenas sublinham a imperiosa necessidade de fomento da questão jurídica na Internet, através de uma abordagem nova, capaz de fundir os mecanismos e possibilidades de aplicação legal do mundo físico às novas e velozes situações de Direito da Grande Rede. Incontestável oportunidade para uma pletora de profissionais jurídicos embarcarem no trem desse admirável mundo novo.

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